Foram só vinte minutos de músicas de sua carreira solo e não teve uma alma presente ao Espaço Unimed que reclamou da escolha do repertório de Steve Hackett. A reação ovacionada aos clássicos do Genesis falaram por si só, principalmente após os quase trinta heróicos minutos de “Supper’s Ready”.
Deu para entender, assim, a opção de promover a atual turnê de Steve Hackett pela América do Sul ao lado de uma competente banda-tributo argentina, em vez de trazer os músicos com quem ele já está habituado a se apresentar. Diminuem-se os custos, facilita-se o acesso. O resultado foi casa cheia para ouvir um disco especial ao público brasileiro.
*Fotos de Gabriel Ramos / @gabrieluizramos.
Brasil, “Seconds Out” e Steve Hackett
Quando o Brasil era um destino improvável de turnês de artistas internacionais, quase cinquenta anos atrás, o Genesis aportou por essas terras divulgando seu disco “Wind & Wuthering”, lançado no fim de 1976.
Aquelas apresentações ocorridas em maio de 1977 em São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre não ficaram só marcadas nas mentes dos brasileiros pouco habituados a shows de bandas daquele porte. A turnê também rendeu o disco ao vivo “Seconds Out”, lançado em outubro daquele mesmo ano e último trabalho a contar com Steve Hackett, celebrado na amena noite de um quente domingo de inverno por hoje senhores de idade, muitos que provavelmente presenciaram aqueles momentos, ao lado de jovens já nascidos sob um Genesis radiofônico e um Phil Collins baladeiro.
Se o Genesis virou uma banda completamente diferente e nunca mais sequer ameaçou pisar no Brasil, o guitarrista se orgulha de ser o guardião daquela sonoridade progressiva e visita o país desde os anos 90. Tornou-se uma aparição de certa forma habitual nos últimos anos – Hackett esteve aqui também em 2015 e 2018.
Não à toa, o guitarrista se saiu razoavelmente bem arriscando algumas palavras em português ao se comunicar com o público que preencheu quase todas as mesas do Espaço Unimed na noite de domingo (20).
Ainda nostálgico, show inicia com Hackett solo
Para o giro sul-americano de 2023, em vez de sua banda solo, que também revisita momentos icônicos da história do ex-grupo, Steve Hackett esteve acompanhado dos argentinos do Genetics, uma das mais respeitadas bandas-tributo ao Genesis do mundo, com quem já tocara no passado.
Hackett até tentou minimizar o tom “banda-tributo” de sua apresentação ao iniciá-la com três faixas instrumentais de sua carreira solo quase vinte minutos depois da hora marcada. Apesar da prolífica discografia do guitarrista, todas foram tiradas de seus primeiros trabalhos setentistas, mantendo o tom nostálgico da noite.
O som da casa ainda estava baixo e abafado durante a abertura do show com “Ace of Wands”, tirada do primeiro disco solo de Hackett, “Voyage of the Acolyte”. O trabalho foi lançado em 1975, quando o músico ainda fazia parte do Genesis, que então começava a não estar tão certo de suas viagens instrumentais.
Os vinte minutos iniciais da noite ainda viram os “proto-vanhalenismos” exibidos em “Shadow of the Hierophant”, outra música do mesmo álbum de estreia, já com peso e volume mais bem estabelecidos graças às duas baterias no palco, além das melodias intimista de “Spectral Mornings”, faixa-título do álbum de 1979.
Em vez da banda solo de Steve Hackett, uma banda tributo
Não foi exatamente a opção musical mais satisfatória, mas a Genetics está longe de ser uma banda medíocre. O grupo argentino tem sucesso em recriar uma atmosfera setentista do show. As já citadas duas baterias no palco serviram para Daniel Rawsi e Jorge Araujo lembrarem Chester Thompson e Phil Collins duelando em “Los Endos”, que encerra “Seconds Out” e pôs fim à primeira parte da apresentação no Teatro Unimed.
Assim como a parafernália de teclados de Horacio Pozzo e o monstrengo de dois braços unindo baixo e guitarra de doze cordas de Cláudio Lafalce mantiveram os excessos. Enquanto isso, luzes não muito iluminadoras e nenhuma imagem pré-gravada de telão para desviar a atenção davam uma “aura raiz” à apresentação, apesar dos telões da casa ajudarem a visualizar o palco.
Musicalmente, porém, a execução das músicas ficou aquém do que pode ser conferido nos discos ao vivo lançados recentemente por Hackett, dentre eles a própria releitura de “Seconds Out” de 2022, além da revisitação de cinquenta anos de aniversário ao clássico “Foxtrot” (1972), prevista para chegar aos streamings da vida em setembro próximo, mas digna de ser considerada pelo guitarrista como soando melhor do que a original.
A reprodução de “Seconds Out”
Essa impressão de Steve Hackett não passou pela cabeça nem mesmo do mais empolgado fã que se levantou das mesas no Espaço Unimed para aplaudir a épica rendição de “Supper’s Ready”, música icônica daquela época em que bandas de rock progressivo ousavam gastar todo um lado do vinil para uma única faixa e depois eram obrigadas a tocá-la ao vivo.
A composição presente no álbum “Foxtrot” foi o momento mais esperado da execução de “Seconds Out”. Solos estendidos ao final complementaram a versão do disco que desaparecia lentamente e fizeram a música chegar a quase meia hora. Na sequência, ficou pequena “The Cinema Show”, também icônica canção de mais de dez minutos lançada originalmente em “Selling England by the Pound” (1973).
Do mesmo disco, dois outros clássicos já haviam recebido versões na noite. Se “Firth of Fifth” pode até ter tido uma execução um pouco engasgada, o público nem se importou quando acompanhou parte do instrumental com palmas, empolgado após o solo de flauta executado pelo vocalista Tomás Price.
Já “I Know What I Like (In Your Wardrobe)” teve uma resposta não tão efusiva quanto seu clássico refrão merecia, mas condizente a um público majoritariamente além da meia-idade sentado em suas mesas. Melhor reação tivera antes o hit “The Carpet Crawlers”, do álbum “The Lamb Lies Down on Broadway” (1974).
A boa resposta do público se deveu ao fato de Price ficar muito mais à vontade cantando as músicas da fase de Peter Gabriel, que assim foram executadas em versões próximas das originais, em contraponto às adaptações do disco ao vivo para o vocal de Phil Collins.
Assim, do então novo frontman de “Seconds Out” ficou parecido apenas o visual desleixado do vocalista argentino, pois a voz de Price sofreu para reproduzir faixas como “Squonk”, “Robbery, Assault and Battery” e a balada “Afterglow”, ainda na fase inicial da noite.
Não estranhou, assim, a única modificação da sequência oficial de “Seconds Out” ter se relacionado a este último trabalho de Peter Gabriel com o Genesis. A faixa-título “The Lamb Lies Down on Broadway” foi deslocada do meio do repertório para, ovacionada, abrir o bis em que a trinca inicial do disco foi executada.
Versões bem pesadas para “Fly on a Windshield” e “Broadway Melody of 1974” deram espaço para a noite se encerrar de forma até estranha ao som dos delicados dedilhados de Steve Hackett ao fim da última faixa, deixando parte do público em dúvida se de fato o show tinha mesmo acabado após um bis de meros dez minutos em pouco mais de duas horas de apresentação. Ninguém reclamaria se Hackett iniciasse mais um clássico do Genesis.
*Fotos de Gabriel Ramos / @gabrieluizramos. Mais imagens podem ser conferidas ao fim da página.
Steve Hackett – ao vivo em São Paulo
- Local: Espaço Unimed
- Data: 20 de agosto de 2023
- Turnê: Playing Genesis Classic Album “Seconds Out”
Repertório:
- Ace of Wands
- Spectral Mornings
- Shadow of the Hierophant
- Squonk (Genesis)
- The Carpet Crawlers (Genesis)
- Robbery, Assault and Battery (Genesis)
- Afterglow (Genesis)
- Firth of Fifth (Genesis)
- I Know What I Like (In Your Wardrobe) (Genesis)
- The Musical Box (Closing Section) (Genesis)
- Supper’s Ready (Genesis)
- The Cinema Show (Genesis)
- Aisle of Plenty (Genesis)
- Dance on a Volcano (Genesis)
- Los Endos (Genesis)
Bis:
- The Lamb Lies Down on Broadway (Genesis)
- Fly on a Windshield (Genesis)
- Broadway Melody of 1974 (Genesis)
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Phoda de bom. Espetacular!!!
Falha minha em não prestar atenção que ele iria tocar com uma banda cover Argentina.
Achei que seria com os componentes da sua banda.
Decepção total. Apesar da apresentação ser mediana, nem chegou aos pés daquilo que esperava.
Pena.
Foi demais, fã mesmo de Gênesis sentiu uma instrumentabilidade como nunca, muito fiel ao original. Vocalista tem um timbre tão parecido com o Peter Gabriel que tem hora que até incomoda de tão bom. Banda bem alinhada com a atmosfera do rock progressivo, para mim foi perfeito, melhor só o original.
Banda péssima, pode se comparar no Youtube com as outras apresentações no tempo e mundo. Vocalista e bateristas, principalmente, podaram as virtudes e vigor de todas as músicas. Uma pena. Achei uma falta de respeito e só quem não conhece minimamente o material pode achar melhor que ruim.