A notícia da morte de Fausto Fanti, humorista e líder criativo do Hermes e Renato que também se apresentava como guitarrista do Massacration (sob o nome Blonde Hammet), pegou a todos de surpresa. O artista cometeu suicídio em 30 de julho de 2014, aos 35 anos, após uma luta contra a depressão.
Bruno Sutter, também membro do Hermes e Renato e responsável por interpretar o vocalista Detonator no Massacration, compartilhou algumas reflexões sobre a personalidade de Fausto Fanti e o convívio com ele em entrevista de 2021 ao Flow Podcast. As falas foram transcritas por este escriba ao Whiplash.Net.
A saída de Bruno Sutter e Fausto Fanti “Ritchie Blackmore”
O assunto veio à tona após um dos entrevistadores perguntar como foi para Bruno receber a notícia da morte de Fausto. Antes de responder, o intérprete do Detonator relembrou que já não fazia parte do Hermes e Renato quando o colega morreu.
“Eu já tinha saído do Hermes e Renato, saí em 2011. Já não tinha tanto contato com eles, apesar de que nossa separação foi muito de boa. Depois de conviver tantos anos com um grupo, como vou sair tretado? Por causa desses caras, eu estou aqui.”
Sutter destacou que saiu do grupo porque estava insatisfeito com o trabalho desempenhado na Record TV. Ele recebeu uma proposta para voltar à MTV, apresentando um programa como Detonator, e todos o apoiaram – até mesmo Fanti, que ficou “meio p*to”, mas não brigou com o amigo.
Em seguida, Bruno definiu a notícia da morte de Fausto como “surreal”.
“Sempre achei o Fausto mal-humorado. Até pesquisei uma doença chamada distimia, que é a doença do mau-humor crônico. Nunca imaginei que o Fausto teria depressão crônica.”
A impressão deixada por Fanti, de acordo com Sutter, era de que seria apenas alguém “meio ranzinza”. “Era o líder do grupo, mas era meio Ritchie Blackmore (guitarrista do Deep Purple e Rainbow). Era meio desconfiadão. Eu achava que era isso.”
Conscientização
A morte de Fausto Fanti serviu para conscientizar a todos do Hermes e Renato, bem como seus fãs, de que depressão é uma doença séria – e se manifesta de diferentes formas.
“A gente nunca imaginaria que um líder intelectual de um grupo tivesse depressão. A gente pensava, erroneamente, que o cara com depressão não consegue levantar da cama, mas não é isso. É o cara que tem uma vida normal, mas tem uma tristeza profunda que não sabe o porquê.”
O intérprete do Detonator citou exemplos de como Fausto Fanti reagia de forma diferente a algumas situações. Mesmo após bons shows do Massacration, o artista sempre se cobrava muito e, segundo Bruno, “não se dava a liberdade de curtir o momento”.
“Tiveram shows absurdos do Massacration, como o Abril Pro Rock, que foi o apogeu. Depois daquele show, a Deck disse: ‘pelo amor de Deus, faz um disco’. Acabou o show, a gente comemorando e o Fausto assim (cabisbaixo e pensativo). (Eu perguntava) ‘O que foi, cara?’. (Ele dizia) ‘Cara, você está falando demais entre as músicas’. Focadão. Parecia que ele não se dava a liberdade de curtir o momento. Sempre era muito perfeccionista. Não sei se isso fazia parte. Na época, não entendi isso. Só pensei que o Fausto não gostava de mim, não ia com a minha cara.”
Na sequência, Bruno relatou mais um episódio:
“Todos sabem o quanto sou fã do Andre Matos. Era meu ídolo. Teve um show do Shaman em um festival em que eles tocaram no mesmo dia que o Massacration. Fomos juntos no avião. Eu já era conhecido do Andre e ele me chamou para cantar ‘Pride’. Fiquei maluco. Falei: ‘Fausto, vou cantar com o Shaman’. Daí ele: ‘por quê?’. Falei: ‘o Shaman, c#r#lho’. Ele ficou emburrado. ‘Não sei o que é, cara, você já tem o Massacration que é do c#r#lho’.”
Por que Fausto Fanti teve aquela reação a um simples convite feito a Bruno Sutter? “Sei lá, talvez ele pensou que eu queria seguir carreira solo”, respondeu ele, que completou:
“Era o sonho da minha vida cantar com o Andre Matos, mas acabei não cantando. Isso me trouxe sequelas profundas, mas pensei em não deixar o Fausto mal.”
Liderança de impacto
Ainda de acordo com Bruno Sutter, a liderança criativa de Fausto Fanti era tão importante para o Hermes e Renato que toda a aura do grupo dependia de seu humor.
“Quando ele ficava mal, todos ficavam. Ele era a energia do Hermes e Renato. A liderança dele era tão impactante que dependia do humor dele. Se ele não estava bem, era um dia difícil. Se ele estava bem, era um p*ta dia.”
A postura de Fanti com relação aos problemas era “jogar todas as responsabilidades para o peito dele”, conforme descrito por Sutter.
“Ao mesmo tempo, ele era muito tímido. Uma vez, fizemos um amigo secreto na MTV com todo mundo. Chamaram o Fausto para falar quem ele havia tirado. Nunca vi uma pessoa tão em pânico. E o cara era um gênio.”
A genialidade do artista era expressa em diferentes situações, de acordo com o cantor.
“Você via o Fausto de Blonde Hammet… você não o via olhando para a guitarra. Ele tocava como se fosse Dimebag Darrell (Pantera), Zakk Wylde (Ozzy Osbourne): solando pra c***lho sem olhar. Para você ver como ele era focado e determinado. Um bom guitarrista toca olhando, mas o Fausto corria, pulava, chutava sem olhar para a guitarra. Na atuação, era a mesma coisa. O Felipe (Torres) e o Fausto são gênios na atuação. O Felipe era natural, nasceu com isso. O Fausto era focado. Era tipo: ‘vou fazer assim’ – e ficava perfeito.”
Ajuda necessária
Por fim, Bruno Sutter reforçou o tom de conscientização a respeito da depressão, responsável por tirar a vida de Fausto Fanti.
“Todos do grupo ficamos com essa ideia – eu um pouco menos porque não estava mais no grupo – de que poderia ter feito alguma coisa para ajudar. É uma lição em que tentamos conscientizar muita gente. Se você vê alguém com atitudes introspectivas demais, dá um toque. Talvez essa pessoa esteja precisando de ajuda – e ajuda química. Tem remédios.”
Em seguida, completou:
“A mente é como um órgão, como coração ou pulmão. Às vezes, faltam certas vitaminas, certas coisas que você precisa tomar para colocar o cérebro em ordem. Eu passei por isso. É para regular, como se fosse, sei lá, pedra nos rins. Há situações agudas, como o caso que passei, de depressão aguda, em que eu tomei remédio por um tempo e resolveu”.
** No Brasil, o Centro de Valorização da Vida (CVV), associação civil sem fins lucrativos, oferece apoio emocional e prevenção do suicídio, gratuitamente, 24 horas por dia. Qualquer pessoa que queira e precise conversar, pode entrar em contato com o CVV, de forma sigilosa, pelo telefone 188, além de e-mail, chat e Skype, disponíveis no site www.cvv.org.br.
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