Entrevista: Neil Turbin recorda gravação de “Fistful of Metal” e alfineta ex-colegas de Anthrax

Vocalista chega ao Brasil pela primeira vez para festejos de 40 anos do álbum mais importante de sua carreira

Dave Evans, Terry Glaze, Charlie Dominici… Neil Turbin. Todos sócios do clube dos vocalistas que saíram ou foram saídos das bandas que os revelaram antes dessas alcançarem o estrelato. A bem da verdade, a troca de vocalista — nem sempre aliada a uma mudança, também, de estilo — foi fundamental para que AC/DC, Pantera e Dream Theater prosperassem, mas e para o Anthrax?

Nascido em Nova York, Turbin não foi o primeiro a ocupar o posto — antes veio John Connelly, futuro integrante do Nuclear Assault —, mas foi por influência dele que o Anthrax deixou de ser uma banda cover que tocava algumas músicas autorais para virar uma banda autoral que tocava alguns covers.

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A despeito de não ter sido das mais longas — de 1982 a 1984 —, sua estada foi produtiva: com Turbin a bordo, o Anthrax gravou duas demos homônimas; o compacto “Soldiers of Metal”, produzido por Ross the Boss, então guitarrista do Manowar; e, por último, mas definitivamente não menos importante, o LP “Fistful of Metal”, que completa quatro décadas de lançamento em janeiro do ano que vem.

Mas as celebrações, ao menos da parte de Turbin, já começaram e têm data para chegar ao Brasil. Ele desembarca por aqui ainda esta semana, para três shows: dia 21 no Correria Music Bar em Vila Velha (ES); dia 22 no CDM Metal Fest em Campo do Meio (MG); e dia 23 na Jai Club em São Paulo (SP).

Acompanhado pelos guitarristas Jaeder Menossi e Thales Statkevicius, o baixista Bill Martins e o baterista Rafael Gonçalves, e contando com abertura da banda Hammathaz, o vocalista, cuja carreira pós-Anthrax não desperta muito interesse, promete não apenas tocar “Fistful of Metal” na íntegra, mas também suas composições que aparecem em “Armed and Dangerous” e “Spreading the Disease”, gravados já com Joey Belladonna nos vocais.

Montado como se estivesse prestes a subir ao palco, Turbin, 59 anos recém-completados, falou com o site IgorMiranda.com.br de sua casa na costa oeste dos Estados Unidos. Acompanhe.

Uma entrevista com Neil Turbin

Anthrax “não fazia ideia de qual direção seguir”

Há entrevistados e entrevistados. Alguns pecam pelo excesso; outros, pela falta. Talvez por não dar muitas entrevistas, Neil Turbin é um que se excede na falta. História pra contar ele tem; critério e noções narrativas, não.

Foram 40 minutos em que este repórter mal pôde cumprir sua pauta tamanha verborragia, muitas vezes não relacionadas a “Fistful of Metal” ou à vindoura turnê pelo Brasil. Aprendi, por exemplo, que Turbin é fã de wrestling, que seu wrestler preferido é o saudoso Jimmy “Superfly” Snuka, e que ele sente falta do tempo em que desportistas competiam por amor à camisa.

Quando se juntou ao Anthrax em 1982, Turbin encontrou uma banda ainda à procura de identidade. “Eles não faziam ideia de qual direção seguir”, conta ele. “Tocavam uma porção de covers e uma ou outra músicas próprias. Quando entrei, passamos a ter mais músicas próprias, pois escrevi algumas.”

Nessas músicas próprias, segundo Turbin, ele pôde infundir um pouco de suas influências, que, diz o vocalista, iam muito além do Iron Maiden que parecia ser a única coisa que os colegas ouviam:

“Eu curtia muito Saxon, Riot, Accept. Discos como ‘Fire Down Under’ [do Riot] e ‘Restless and Wild’ [do Accept] eram meio que meus discos de cabeceira na época. Mas também ouvia muita coisa fora do rock e do metal. Gostava muito de R&B, Motown, soul music. Tenha em vista que Nova York, onde fui criado, era um polo multicultural nos anos 1970, então era impossível passar ileso a tanta coisa diferente.”

“Polo multicultural”, mas também um lugar pouco amigável a quem ostentava um visual rocker. Turbin se recorda de confrontos à “West Side Story” entre skinheads e outras tribos. “Aquelas ruas eram perigosas”, conta. “Nada comparado à Cidade de Deus [bairro da Zona Oeste do município do Rio de Janeiro que inspirou premiado filme homônimo em 2002], porém”.

O primeiro show de Turbin no Anthrax ocorreu duas semanas após a sua entrada. A partir daí, tudo aconteceu muito rápido com a banda, que logo estaria abrindo shows para o Metallica e assinando um contrato de gravação com a Megaforce Records.

“Fistful of Metal”, uma “missão pessoal”

“Um desafio em vários níveis”. É assim que Turbin resume o processo de gravação de “Fistful of Metal”. Para ele, não foi apenas uma questão de entender como funcionavam os equipamentos, mas também as demais pessoas envolvidas no processo — além dos colegas Dan Spitz (guitarra solo), Scott Ian (guitarra base), Danny Lilker (baixo) e Charlie Benante (bateria), o produtor Carl Canedy e o produtor executivo e dono da Megaforce Records, Jon Zazula. “Nem sempre todos compartilham da mesma visão artística”, diz.

“Fistful of Metal” foi gravado no decorrer de 30 dias no Pyramid Sound, em Ithaca, Nova York. Segundo Turbin, o ambiente em si não era lá muito inspirador:

“Você tinha de descer uma escada para chegar até a sala de gravação, e todos os equipamentos, a mesa de som etc., ficavam no andar de cima. Parecia que o estúdio estava passando por uma reforma, então o timing foi péssimo para nós.”

Não obstante o clima pouco convidativo no Pyramid, Turbin foi o único integrante do Anthrax a estar presente em todos os dias de trabalho; desde a gravação das bases até o fim da etapa de mixagem. Ele explica:

“Porque eu queria me assegurar de que tudo fosse feito da maneira certa. Quando visto a camisa, visto pra valer. [Gravar o álbum] era mais do que um objetivo, era uma missão pessoal.”

Tanta dedicação à causa não deixou de cobrar um preço: Turbin teve apenas três dias para registrar seus vocais, o que o impediu de fazê-lo adequadamente nas dez faixas que compõem o repertório do disco. Além disso, ele faz uma crítica aos então colegas:

“Costumávamos ensaiar cinco vezes por semana, religiosamente de segunda a sexta, sempre de noite. Mas chegando no estúdio, os caras só queriam saber de tocar o mais alto que pudessem. Não havia dinâmica [nas músicas]. É muito difícil obter bons resultados com tantos egos sobre a mesa. Faltou maior atenção aos detalhes, às nuances.”

Apesar dos egos, Turbin também relaciona esse “tocar o mais alto que pudessem” à pouca idade e à falta de experiência de todos, misturadas, obviamente, com a empolgação por estarem gravando um disco para uma gravadora. “Estávamos todos na casa dos vinte e poucos anos”, comenta ele, que tinha exatos 20 anos quando a banda entrou em estúdio.

Mas e quando teve o álbum em mãos pela primeira vez? “Foi demais”, responde ele, antes de acrescentar que…

“Era para o nosso logotipo ter saído na cor vermelha, mas quando o álbum chegou da fábrica, lá estava o logotipo na cor rosa. Fiquei de cara. ‘P#ta m#rda!’ [Risos.] Não era para ser assim. Tipo, nosso primeiro álbum, nosso passaporte para as grandes ligas, com um logotipo cor-de-rosa?”

“A vibe que aquela capa transmite faz jus à música”

Embora icônica, a capa de “Fistful of Metal” é frequentemente apontada entre as mais feias do rock e do metal pela mídia especializada. Pergunto se ele acha isso engraçado. Seu semblante endurece no ato, e ele inicia verdadeira apresentação de TCC a respeito do tema:

“Isso é muito subjetivo, né? Às vezes você tem uma ótima ideia, a coloca em prática, e somente depois tem outra ideia mil vezes melhor. Acho que [a capa de ‘Fistful of Metal’] é o velho caso de ‘ame ou odeie’. Por outro lado, seu impacto foi inegável. Você bate os olhos naquela capa e sabe exatamente o tipo de som que vai ouvir. A vibe que aquela capa transmite faz jus à música; potente, violenta, como um trem desgovernado. O Metallica tentou traduzir seu som com uma marreta [na capa de ‘Kill ‘em All’]. Hoje, todos acham-na parecida com… você sabe…”

Ele prossegue salientando outra questão:

“Teríamos podido fazer algo melhor se dispuséssemos de verba para tal, né? Lembre-se de que éramos uma banda iniciante; não era como se tivéssemos 10 mil dólares à disposição para custear uma capa de primeira.”

O arremate do assunto vem com novas comparações:

“Veja, por exemplo, a capa do ‘Houses of the Holy’, do Led Zeppelin. O que significa aquele bando de crianças sem roupa? É bizarro. Acho que as capas no heavy metal em geral traduzem melhor o som. ‘Wheels of Steel’ e ‘Denim and Leather’, do Saxon; ‘Restless and Wild’, do Accept; ‘Killers’, do Iron Maiden. Você vê essas capas e sabe se tratar do mais puro heavy metal. Talvez se tivéssemos pensado muito mais a respeito de capa de ‘Fistful of Metal’, ela não entregasse a mensagem tão bem, no fim das contas.”

“Palco não é lugar de usar pijama”

Neil Turbin foi mandado embora do Anthrax em 1984 e, desde então, sua carreira nunca mais foi a mesma; ao menos no que diz respeito à projeção e interesse despertado. Não ajudou o fato de ele ter produzido relativamente pouco. O contrário de sua antiga banda, por assim dizer, que apesar de mudanças na formação, segue, sob o comando de Ian e Benante, como uma das mais prolíficas do thrash metal.

O vocalista revela que parou de acompanhar os lançamentos do Anthrax após deixar a banda, mas que chegou a assistir a um show com Matt Fallon, seu substituto imediato:

“Cerca de seis meses depois da minha saída, assisti a um show deles no L’amour [casa de shows em Nova York]. O cantor da vez era o Matt Fallon, que depois cantou no Skid Row. Não gostei muito do que vi. Tipo, eram as minhas músicas sendo tocadas, mas de um jeito completamente diferente.”

As diferenças às quais Turbin se refere vão além do espectro musical. E tome uma bela alfinetada, sobretudo em Ian, de quem virou desafeto:

“Com o tempo eles foram adquirindo um caráter mais cômico, skatista, sabe? Esse lance de usar bermuda no palco. Sei lá, isso não é para mim. Palco não é lugar de usar pijama.”

Então, o que os fãs brasileiros podem esperar do show de Neil Turbin — além de um veto a bermudas?

“Meu show é mais incendiário. Não me considero um cantor de thrash metal, nem considero aquilo que faço thrash metal. É um heavy metal de alto calibre técnico, muito mais direto ao ponto. Portanto, preparem-se para ter seus ouvidos esmagados!”

Ele encerra gritando:

“Metal thrashing maaaaaaad!!!!”

Estou surdo até agora.

*Neil Turbin se apresenta dia 21 no Correria Music Bar em Vila Velha (ES); dia 22 no CDM Metal Fest em Campo do Meio (MG); e dia 23 na Jai Club em São Paulo (SP). Clique no nome de cada cidade para mais informações.

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Marcelo Vieira
Marcelo Vieirahttp://www.marcelovieiramusic.com.br
Marcelo Vieira é jornalista graduado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA), com especialização em Produção Editorial pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Há mais de dez anos atua no mercado editorial como editor de livros e tradutor freelancer. Escreve sobre música desde 2006, com passagens por veículos como Collector's Room, Metal Na Lata e Rock Brigade Magazine, para os quais realizou entrevistas com artistas nacionais e internacionais, cobriu shows e festivais, e resenhou centenas de álbuns, tanto clássicos como lançamentos, do rock e do metal.

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