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Quando o Daft Punk virou anime em “Discovery” e “Interstella 5555”

Segundo álbum da dupla foi desenvolvido também com um filme em mente – e fez os músicos trabalharem com um herói de infância

Até mesmo quem não é fã de música eletrônicajá escutou alguma música do duo francês Daft Punk. Ao longo de 28 anos de trabalho – estiveram ativos entre 1993 e 2021 –, Thomas Bangalter e Guy-Manuel de Homem-Christo alcançaram enorme sucesso em todo o planeta e se tornaram uma das grandes referências no gênero.

O Daft Punk também ficou marcado por várias inovações. Uma das mais famosas veio em “Discovery”. Lançado em 2001, o segundo álbum de estúdio da dupla serviu de base para um filme em anime, em que Bangalter e Homem-Christo tiveram a oportunidade de trabalhar com um herói de infância.

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Por que o Daft Punk teve essa ideia pra lá de inovadora? Quem era esse herói de infância da dupla? E como esse anime saiu do papel? É o que vamos abordar abaixo.

“Discovery” e o filme live-action

Toda esta história que transformou o Daft Punk em anime começou em 1998. Foi no ano em questão que o duo francês começou a trabalhar em “Discovery”. Durante a concepção do álbum, surgiram como inspiração as memórias de infância da dupla, com destaque para o amor que os dois amigos tinham por personagens fictícios e cinema.

Foi a partir daí que o duo teve a ideia de também lançar “Discovery” acompanhado de um filme – inicialmente em live-action –, com cada uma das canções do álbum sendo parte da produção. Ao portal francês RFI, os músicos revelaram alguns detalhes da concepção do disco:

“Quando começamos a trabalhar em ‘Discovery’, queríamos ter uma nova perspectiva das coisas, vocês sabem, um tipo diferente de narrativa que ligasse as coisas. O que aconteceu é que (o diretor) Spike Jonze dirigiu nosso vídeo do single ‘Da Funk’ e nós mesmos filmamos a continuação dele. Foi basicamente a partir daí que tivemos a ideia de fazer uma espécie de ‘álbum narrado’, em que os vídeos de várias canções se seguiriam como se fosse um filme. Tentamos planejá-lo como uma ‘ópera rock’, em que escrevíamos as músicas e cenas ao mesmo tempo.”

Para a Fluo Magazine, Homem-Christo revelou que por conta da decisão, o álbum se tornou um projeto composto de duas etapas.

“Ficámos satisfeitos com o primeiro passo, que foi a gravação de ‘Discovery’. Quando o álbum saiu, já estávamos trabalhando na segunda fase criativa, que era a concepção do desenho animado. Na verdade, era um projeto em duas fases.”

Como o Daft Punk virou anime

“Discovery” foi lançado em 12 de março de 2001 e foi bem recebido pela crítica e o público. Mas ainda faltava desenvolver o filme que o Daft Punk tanto desejava para o projeto. Não demorou muito para que a ideia de um live-action fosse descartada em prol de uma animação. Após pesquisarem vários estilos, a dupla francesa optou pelo anime e procurou o animador japonês Leiji Matsumoto, herói de infância dos músicos.

Para a revista The Face, Guy-Manuel de Homem-Christo revelou que ele e Thomas Bangalter eram grandes fãs dos trabalhos de Matsumoto, especialmente “Pirata Espacial Capitão Harlock”.

“O show do Captão Harlock costumava passar na TV todo dia – pouco antes do jornal às oito da noite. Então, quando éramos crianças, estávamos sempre à frente da TV.”

Antes, Bangalter e Homem-Christo procuraram o colaborador Cédric Hervet, que topou ajudá-los a desenvolver o roteiro da animação. Com o trabalho concluído, foram se encontrar com Leiji Matsumoto no Japão.

A dupla já relatou como todo o processo aconteceu durante a estreia do filme, que aconteceu no famoso festival de cinema de Cannes (via Omelete):

“Como nós três crescemos com os poéticos e enigmáticos mundos criados por Leiji Matsumoto, sonhamos com a possibilidade de trabalhar ao lado dele. Assim, no verão de 2000, voamos até Tóquio para que ele pudesse ouvir o álbum e ler nossa sinopse. Ele nos recebeu muito bem. Ficou entusiasmado com a música e aceitou entrar pra equipe sem pensar duas vezes. Finalmente estávamos prontos para arrancar com o nosso projeto.

Felizmente, assim que os primeiros rascunhos começaram a ficar prontos, já estava claro que o encontro dos nossos mundos funcionaria. Seguiu-se então uma reunião com Shinji Shimizu, produtor amigo de Matsumoto, que completou a equipe e coordenou o trabalho do diretor Kazuhisa Takenouchi.

Em outubro de 2000 começou o trabalho de animação, que durou 28 meses de trabalho árduo, inúmeras viagens de Paris até Toquio e milhares de e-mails trocados com nosso amigo Spike Sugiyama, a única pessoa da equipe que fala inglês e japonês e tornou-se nosso intérprete oficial, algo vital nessa inusitada colaboração artística entre duas culturas tão distintas.”

A dupla também supervisionou a edição e mixagem da animação, que recebeu o nome de “Interstella 5555: The 5tory of the 5ecret 5tar 5ystem”. Por conta disso, o duo viajava praticamente uma vez por mês ao Japão para acompanhar todo o processo junto à Toei Animation, o estúdio que ficou responsável pela concepção do longa.

Além disso, o Daft Punk também ficou responsável por bancar o orçamento do filme, que ficou na casa de US$ 4 milhões e foi custeado com a ajuda da venda dos discos.

Uma curiosidade que vale ser citada é que foi a partir de “Discovery” que o Daft Punk adotou seus trajes robóticos, que permaneceram com a dupla até o encerramento de suas atividades.

O enredo de “Interstella 5555”

Com relação ao enredo, “Interstella 5555: The 5tory of the 5ecret 5tar 5ystem” conta a história de uma banda intergaláctica que é abduzida e levada para Terra por um empresário ganancioso. Os quatro integrantes – chamados Stella, Arpegius, Baryl e Octave – passam por um processo de lavagem cerebral e mudança visual para ficarem sob o controle deste manager.

No entanto, Shep, um astronauta da mesma espécie do grupo e que tem um “crush” em Stella, recebe um chamado do sequestro e decide resgatá-los.

Para a Fluo Magazine, Thomas Bangalter afirmou que apesar da pegada fictícia e futurista de “Interstella 5555”, o enredo da animação não está tão distante da realidade.

“Ser manipulado e transformado num produto tornou-se uma norma. Mas acima de tudo, queríamos que as imagens transmitissem emoções, porque isso é mais importante para nós do que qualquer mensagem oculta.”

“Interstella 5555” não tem qualquer tipo de diálogo – apesar de os personagens aparentarem cantar algumas das músicas do filme – e seus efeitos sonoros são mínimos: ao longo de seus 67 minutos de duração, a animação é acompanhada pelas 14 músicas presentes em “Discovery”. Além disso, o projeto fez o próprio Daft Punk se transformar em anime, já que a dupla fez uma rápida participação especial na animação com as personas robóticas que se tornaram marca registrada.

Estreia e legado

Após fazer sua estreia em Cannes, “Interstella 5555: The 5tory of the 5ecret 5tar 5ystem” foi lançado mundialmente em 28 de maio de 2003. Na plataforma Rotten Tomatoes, a animação tem 86% de aprovação.

O Daft Punk pode ter encerrado suas atividades em 2021, mas deixou um enorme legado na música eletrônica – e, por que não, também na animação japonesa, visto que muitas pessoas tiveram contato com animes pela primeira vez por intermédio dos videoclipes.

Com certeza, Thomas Bangalter e Guy-Manuel de Homem Christo devem ser eternamente gratos por terem tido a oportunidade de trabalhar em parceria com Leiji Matsumoto, que faleceu em fevereiro de 2023, aos 85 anos de idade.

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Augusto Ikeda
Augusto Ikedahttp://www.igormiranda.com.br
Formado em jornalismo pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Atua no mercado desde 2013 e já realizou trabalhos como assessor de imprensa, redator, repórter web e analista de marketing. É fã de esportes, tecnologia, música e cultura pop, mas sempre aberto a adquirir qualquer tipo de conhecimento.

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