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Geoff Tate canta “Rage for Order” e “Empire” na íntegra em SP; veja como foi

Público participativo empolga o ex-vocalista do Queensrÿche em longa e correta apresentação com dois clássicos da banda

“What? You say…” O primeiro verso – ou grito – do clássico do Queensrÿche, “Walk in the Shadows”, beirou o mesmo tom altíssimo da versão de estúdio de quase 30 anos atrás. Geoff Tate, aos 64 anos recém-completados, mostrou que toda a sua variação de tons e interpretações continua intacta logo na primeira música das mais de duas horas de sua apresentação, ocorrida na amena noite de verão de uma cinzenta e chuvosa sexta-feira na capital paulista.

*Fotos de Gustavo Diakov / @xchicanox

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Casa vazia na abertura do Marenna

Talvez a chuva mais forte caída no fim da tarde tenha retardado a chegada do público ao Tokio Marine Hall. Pode ter deixado um gosto amargo para o Marenna, banda de abertura que empresta o sobrenome do vocalista gaúcho Rodrigo, cuja apresentação se iniciou por volta das 20h40 para nem 100 pessoas, somados todos os setores.

Não pareceu ser um problema para a empolgada exibição do grupo, marcada pela potência vocal de seu cantor e líder, que alternou canções mais rápidas típicas do hard rock oitentista e outras de cadência e apelo radiofônico calcados no AOR. Nada exatamente original, mas com refrãos pegajosos, como se exige do estilo.

No entanto, ainda que a casa aos poucos se enchesse, o correto hard melódico do grupo não era capaz de tirar uma reação mais efusiva dos presentes – por mais esforço que tenham feito o vocalista e os seus colegas de banda Mauro Caldart (guitarra), Bife (baixo), Arthur Schavinski (bateria) e Luks Diesel (teclados).

https://www.instagram.com/p/CnqEBWDBls3/

Marenna – ao vivo em São Paulo

  • Local: Tokio Marine Hall
  • Data: 20 de janeiro de 2023

Repertório:

  1. Voyager
  2. Never Surrender
  3. Pieces of Tomorrow
  4. Breaking the Chains
  5. You Need to Believe
  6. Wait
  7. Out of Line
  8. Too Young to Die
  9. Had Enough

Casa meio cheia para Geoff Tate

Se muito, a quantidade de pessoas que acompanhou a apresentação de Geoff Tate preencheu metade do Tokio Marine Hall, cuja capacidade é em torno de 4 mil presentes. Um público longe de ser ruim, considerando que o show no Rio de Janeiro foi cancelado às vésperas da data por alegadas “questões logísticas” e substituído por uma improvisada exibição acústica num pub da cidade maravilhosa. No dia seguinte ao concerto paulistano, Tate se apresenta no acanhado Mirage Eventos, em Limeira, a 135 km da capital do estado.

Um cenário que o cantor já se acostumou em suas turnês internacionais, mas dificilmente foi imaginado por ele 30 anos atrás, quando “Empire”, um dos álbuns celebrados e executados na íntegra na noite, terminou 1991 em 9º lugar entre os mais vendidos dos Estados Unidos segundo o Top 200 da Billboard e cuja turnê trouxe a banda pela primeira vez no Brasil, na noite metálica da segunda edição do Rock in Rio, em um Maracanã.

Toda essa exposição rendeu triplo disco de platina ao grupo nos Estados Unidos, porém não foi cultivada no Brasil, ao qual só retornou seis anos depois – duas apresentações em festivais no final de 1997 – para um novo hiato que durou mais de uma década, quando em 2008 a banda finalmente fez uma turnê própria pelo país, já numa fase de baixa em sua carreira. Por ironia, a baixaria com suposto atentado a faca e cusparadas que culminou no fim da passagem de Tate pelo Queensrÿche ocorreu na última vez que o grupo se apresentou em São Paulo, em 2012.

Nessa fase pós-Queensrÿche, Geoff Tate já havia tocado no Brasil antes: pela primeira vez, com sua própria versão da antiga banda, na edição de 2013 no festival Monsters of Rock, enquanto ainda acontecia uma disputa judicial pelos direitos de uso do nome do grupo; posteriormente, o vocalista executou na íntegra seu mais celebrado álbum, “Operation: Mindcrime”, abrindo apresentações do Mr. Big no país.

Pouca fúria, alguma ordem

A prática de executar álbuns na íntegra nos traz de volta à noite desta sexta-feira. Antes do álbum de maior sucesso do Queensrÿche, Geoff Tate apresentou, também em sua totalidade, “Rage for Order”, talvez o mais cultuado da discografia de sua antiga banda. Se não vendeu tanto quanto “Empire” ou não é universalmente celebrado quanto “Operation: Mindcrime”, o trabalho de 1986 marcou a carreira do grupo ao mostrar temas políticos e futuristas aliados a uma sonoridade obscura, sombria e soturna, que à época despertou críticas, como lembrado pelo vocalista durante a noite, mas também o separou dos seus pares de heavy metal tradicional – então, o rótulo de prog metal ainda não existia e comparações com o Rush na mídia especializada passaram a ser mais constantes.

A execução das canções seguiu a ordem disposta no disco e tentou manter a linha perfeccionista do Queensrÿche. Porém, a qualidade de som no Tokio Marine Hall deixou a desejar, sendo muitas vezes difícil ouvir os solos das músicas, enquanto o volume da bateria parecia exagerado.

Tate, com um visual que muitas vezes remetia a um distinto profissional do jogo do bicho, cercou-se de músicos de alto gabarito para a tarefa, todos dando aquela força nos backing vocals: a seção rítmica – formada pelo discreto Danny Laverde e o caminhante e portentor de estilosos óculos escuros Jack Ross, respectivamente bateria e baixo, apoiados pelo empolgadíssimo brasileiro Bruno Sá, que mal cabia nos teclados – demonstrou precisão para manter os tempos e atmosferas originais.

Já os guitarristas Alex Hart, mais compenetrado, e Kieran Robertson, bastante expansivo e com um certo carisma, se esforçaram para reproduzir riffs e solos o mais próximo possível da versão de estúdio. Isso se deu mesmo em arranjos que algumas vezes apareceram em tons mais baixos, adaptados para dar algum respiro à voz do chefe – que passou ilesa por uma cirurgia de coração há pouco mais de seis meses, mas não pelo tempo.

E que voz. Se os agudos extremos capturados em estúdio quase 30 anos atrás apareceram apenas aqui e acolá, como nas soturnas “I Dream in Infrared”, “The Whisper” e “Neue Regel”, Geoff Tate compensou utilizando mais de sua versatilidade vocal adquirida em todo esse período. Desse modo, tornou mais únicas as interpretações da intrincada “London” e da insinuante “Gonna Get Close to You” (cover de Lisa Dal Bello, acompanhada de dancinhas e encenações), sem prejudicar momentos mais pesados como as rápidas “Surgical Strike” e “Chemical Youth”, nem diminuir a tensão da futurista “Screaming in Digital”.

Destacaram-se as baladas “The Killing Words” e “I Will Remember”, com bela interpretação de Tate, dignas das mais efusivas reações do público, mais contemplativo do que participativo ao longo da execução de “Rage for Order”, ao qual se seguiu um longo intervalo de quase meia hora.

Reconstruindo o império

Apesar de demora para o início da segunda parte do show, como esperado, foi no disco de maior sucesso do Queensrÿche que as pessoas presentes ao Tokio Marine Hall de fato se soltaram. Logo ficou claro em “Best I Can”, faixa de abertura e um dos seis singles lançados de “Empire”, com sua letra aliando uma leve crítica à cultura armamentista americana a um tema sobre a superação de adversidades por pessoas com deficiência.

A pequena melhoria da qualidade de som na execução da íntegra de “Empire” já foi suficiente para comprovar os méritos inegáveis dos músicos de apoio de Tate. Reproduziram com fidelidade os arranjos e permitindo visualizar o fácil apelo conquistado por faixas intrincadas com seus tempos não usuais de “The Thin Line”, em que o vocalista ainda despejou seus dotes de saxofonista, e “Della Brown”, com uma interação do guitarrista Kieran Robertson com o público em seu solo final antes do encerramento apoteótico.

Como não poderia deixar de ser, “Another Rainy Night” e “Jet City Woman”, singles de maior apelo comercial, despertaram efusiva reação do público, que também cantou em uníssono com Geoff Tate os versos sobre o fim violento do sublime sonho americano contidos na faixa-título de “Empire”. Por óbvio, foi na bela “Silent Lucidity”, maior hit do Queensrÿche e uma das principais baladas da história do heavy metal, que o show teve seu auge de comunhão entre público e vocalista, que agradecia com um misto de surpresa e emoção pela calorosa recepção que obtinha.

https://www.instagram.com/p/CnqW9AkBzxn/

Em canções menos celebradas do disco, como o grito ecológico de “Resistance” e principalmente “One and Only” e “Hand on Heart” – já próximas do final do álbum e posteriores ao auge de “Silent Lucidity” –, o público e Geoff Tate já lutavam contra o cansaço. Por outro lado, algum resto de energia sobrou ao vocalista para encerrar a execução de “Empire” com a épica “Anybody Listening?” e sua mensagem direta chamando à reflexão sobre como lidamos com as informações que recebemos.

Why am I here and for how long?

Já passava da meia-noite e, após uma rápida pausa, Tate voltou para o bis, inicialmente programado para conter duas músicas. Porém, “Last Time in Paris”, single obscuro do Queensrÿche saído na trilha sonora do filme “As Aventuras de Ford Fairlane” (1990), foi deixada de lado – até corretamente pelo cansaço de todos – para um final apoteótico com “Eyes of a Stranger”, clássico que encerra “Operation: Mindcrime” e, claro, despertou a comoção do público, utilizando suas últimas forças para sobrepor sua voz à de Geoff Tate.

Diante da improbabilidade de um retorno da formação clássica do Queensrÿche e a falta de repercussão de trabalhos novos tanto do renovado grupo, liderado pelo ótimo Todd La Torre, quanto de seu substituído cantor em sua carreira solo ou projetos paralelos, Geoff Tate dá a entender que seguirá explorando o sentimento nostálgico de seus fãs enquanto tiver saúde. A ótima resposta do público à longa apresentação do vocalista demonstra o acerto da aposta. Agora, a bola está quicando no campo de seus antigos companheiros, que ainda carecem de vir ao Brasil para provar no palco se tem algo além do passado a mostrar.

*Fotos de Gustavo Diakov / @xchicanox

Geoff Tate – ao vivo em São Paulo

  • Local: Tokio Marine Hall
  • Data: 20 de janeiro de 2023
  • Turnê: Empire 30th Anniversary Tour with Rage for Order

Repertório:

Parte 1 – “Rage for Order”

  1. Walk in the Shadows
  2. I Dream in Infrared
  3. The Whisper
  4. Gonna Get Close to You (Dalbello cover)
  5. The Killing Words
  6. Surgical Strike
  7. Neue Regel
  8. Chemical Youth (We Are Rebellion)
  9. London
  10. Screaming in Digital
  11. I Will Remember

Parte 2 – “Empire”

  1. Best I Can
  2. The Thin Line
  3. Jet City Woman
  4. Della Brown
  5. Another Rainy Night (Without You)
  6. Empire
  7. Resistance
  8. Silent Lucidity
  9. Hand on Heart
  10. One and Only
  11. Anybody Listening?

Bis

  1. Eyes of a Stranger

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Thiago Zuma
Thiago Zuma
Formado em Direito na PUC-SP e Jornalismo na Faculdade Cásper Líbero, Thiago Zuma, 43, abandonou a vida de profissional liberal e a faculdade de História na USP para entrar no serviço público, mas nunca largou o heavy metal desde 1991, viajando o mundo para ver suas bandas favoritas, novas ou velhas, e ocasionalmente colaborando com sites de música.

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