Em 2020, por conta de um câncer de cólon, o mundo perdeu Chadwick Boseman aos 43 anos. O ator, que vivia enfim a sua grande oportunidade na carreira como o rei T’Challa / Pantera Negra, enfrentou uma realidade sombria em silêncio – como um elegante rei. Infelizmente, a batalha contou com um triste final para ele.
Com isso, a Marvel Studios perdeu um de seus pilares mais importantes para seu universo cinematográfico. Além do luto, havia um problema a ser resolvido: o segundo longa solo do personagem, que foi mantido mesmo após seu falecimento.
A casa do Homem de Ferro teve em “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” 161 minutos para solucionar tal situação. Também infelizmente, não conseguiu.
O longa oferece uma justa homenagem a Boseman, mas nada além. O filme peca em falta de personalidade e liderança. Havia boas ideias, mas que ficaram apenas no rascunho.
Atenção: há pequenos spoilers de “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” que não afetam a experiência.
Vida longa ao rei
A base de “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” é o luto que cada um se permite sentir ao se deparar com a morte. Chadwick Boseman é homenageado até mesmo nos créditos de abertura. A emoção pulsa fortemente durante a experiência. E, no fim das contas, é como se ele estivesse ali o tempo todo.
A retratação de luto da rainha Ramonda (Angela Bassett) também é correta. De longe, ao lado do vilão, a personagem é a melhor coisa do filme. Após perder tudo e lhe restar apenas a filha, ela precisa reagir ao mundo tentando se apropriar do vibranium na ausência de seu protetor.
Para isso, entidades de governo usam uma máquina construída por Riri Williams (Dominique Thorne) e conseguem localizar vibranium no oceano. Como consequência, mexeram com um reino até então adormecido: o de Namor (Tenoch Huerta).
Wakanda vs. Talokan
Para se dissociar de “Aquaman”, Namor foi construído com base na cultura asteca. Pegue o México e inclua os maias, incas e astecas: assim foi criada Talokan, uma escondida civilização marítima que se mostra bem interessante, do design ao conceito.
Há de se destacar ainda o trabalho do ator mexicano Tenoch Huerta como um dos melhores vilões do Universo Cinematográfico Marvel (UCM). Este filme é dele. Ainda que sofra de uma das maiores mudanças de origem de um personagem saído da literatura, o antagonista tem uma presença que enche a tela. É sério, forte, líder, imprevisível e carregado de dores trazidas de um mundo escravocrata. Dá para sentir o medo de quem terá de lidar com ele.
O problema é que o personagem surge com uma forte crítica ao colonialismo que não se aprofunda. Assim como o vilão antecessor Killmonger (Michael B. Jordan), Namor tem uma motivação excepcional, mas que não é explorada porque parece haver maior preocupação em fazer o público chorar.
Em meio à falta de clareza de intenções, o longa falha ao impor um embate tosco entre wakandanos e talokans. Neste caso, a simplicidade do roteiro jogou contra: ficou na base do “ou está comigo ou está contra mim”.
A falta de noção de poderes também incomoda. O exército marítimo é quase que indestrutível e isso causa um disparate muito grande. Ainda assim, o fim da luta é resolvido de forma ridícula, já que o roteiro mostrava não saber como solucionar aquilo.
Faltou dosar a emoção
O diretor Ryan Coogler é hoje, talvez, a melhor coisa associada à Marvel. Em “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre”, ele e sua equipe entregaram cenas de ação belíssimas (apesar de algumas estarem bem escuras), além de uma trama com fortes bases políticas e um tom mais sério onde piadas surgem nos momentos certos – e até que são boas piadas, enfim. Fora a trilha sonora, que trouxe Rihanna de volta após um hiato relativamente longo na música.
Infelizmente, abriu-se mão de tudo isso em prol da emoção em homenagear Chadwick Boseman. A principal lacuna é notada em Shuri (Letitita Wright). A jornada da personagem, que converte ódio em vingança enquanto a mãe carrega o luto com a dor, parece sem sentido. Em determinado momento, a personagem chega a dizer que deseja “queimar o mundo”, sendo que foi uma doença, e não o mundo, que matou T’Challa. Isso nos leva a um final já conhecido e que não funciona.
Ainda que contrarie os acontecimentos dos quadrinhos – e é importante lembrar que nem todos os acertos das HQs se darão novamente em tela –, Okoye (Danai Gurira) parecia a melhor solução para todos os problemas envolvendo o manto de Pantera Negra. Shuri é querida e forte dentro da realidade de cientista genial que nos apresentaram. Por sua vez, Okoye apresenta carisma, força e presença que a credenciariam para levar o legado adiante.
Em meio a tudo isso, a adição de Riri Williams pareceu desnecessária. A “Coração de Ferro” foi praticamente retratada como superior a Tony Stark (Robert Downey Jr), com criações extraordinárias que nem mesmo seu mentor conseguiu em um curto espaço de tempo. Pareceu ter entrado ali mais com a intenção de fazê-la merecer sua já confirmada série.
“Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” encerra a péssima fase 4 da Marvel sem mudar o cenário colocado por muitas das obras antecessoras. Faltou entendimento de que a melhor homenagem a ser feita para Boseman seria a execução de um grande filme, cuja preocupação principal não fosse arrancar lágrimas.
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ótima crítica!
Branco