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Yngwie Malmsteen e seu ego voltam a SP em show com alegado veto às aberturas

Apresentação do guitarrista no Carioca Club foi marcada por situações estranhas, mas performance musical irrepreensível

“Você não trabalha com Yngwie Malmsteen. Você trabalha PARA Yngwie Malmsteen”. Este escriba jamais se esqueceu desta estranha declaração de Jeff Scott Soto numa entrevista concedida a algum veículo nacional nos anos 2000, em clara alusão ao ego excessivamente inflado do guitarrista. Na apuração para este texto, encontramos a mesma resposta dada ao podcast “That Metal Interview”, a partir do 11º minuto. Ao cobrir um show do músico pela primeira vez, não é que a compreensão da mensagem transmitida pelo hoje vocalista do Sons of Apollo ficou bem clara num enredo esquisito?

Seja sincero: um show de segunda-feira parece já começar meio torto, né? Você emenda o final de semana, tem que trabalhar cedo no dia seguinte, certamente beberá menos e pode ter maior dificuldade em arranjar companhia para o evento.

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Entendemos, por outro lado, que fatores como aluguel mais barato das casas, necessidade dos artistas excursionarem mais no pós-pandemia e a concorrência na agenda para encontrar uma locação viável talvez justifiquem o fato de o Molchat Doma ter tocado na Audio numa segunda-feira de abril, bem como tanto o sueco quanto o Animals as Leaders em dezembro (para ficarmos em nomes do metal), ambos no Carioca Club.

*Fotos de Gustavo Diakov / @xchicanox

Algo de errado não está certo

O primeiro indício do desandar da maionese surgiu em breve troca de áudios por WhatsApp com amigos, às 17h30, a caminho de onde o músico estivera na última visita à cidade, em agosto de 2016. “Sem pressa. Estamos todos aqui aguardando: as duas bandas de abertura (Skalyface e Opus V), equipes de imprensa, fãs”. Algo não caía bem, especialmente levando-se em conta que a abertura das portas deveria ocorrer dentro de meia hora e a primeira atração teoricamente tocaria às 18h40.

Chegando às 18h10, o cenário era amplamente pior. Funcionários da casa, incluindo seguranças e técnicos de som, estavam do lado de fora. Relatos davam conta que a ordem partira do próprio Yngwie Malmsteen, que ajustava o som desde às 14h30.

Pensa que acabou? Pairava um olhar de desânimo entre membros da Skalyface e Opus V. O sueco incrivelmente vetara suas participações, anunciadas há meses, e exigiu o palco livre uma hora antes de sua entrada, às 21h.

Tendo acesso à pista às 18h35, a questão passava a ser se de fato aconteceriam os shows. Pedindo sigilo de identidade, um prestador de serviço nos confidenciou ter testemunhado até uma reclamação sem sentido do gringo quanto à morna temperatura de seu sanduíche recebido de uma das mais tradicionais empresas de entrega de comida. Sentiu o nível do drama?

O que dizem bandas e produtora

Para não ficarmos nos boatos, contatamos no dia seguinte o vocalista da Skalyface, Marlon Bueno. Ele explica o porquê de não terem tocado:

“O combinado era as bandas estarem na casa às 16h30 para se ambientarem e já irem adiantando o que fosse possível em relação ao equipamento próprio da banda, pois já é de praxe. Só que, ao chegar, fomos surpreendidos por não poder acessar o local e, mais ainda, ao ver que inclusive funcionários do bar, segurança, limpeza, caixa, portaria e inclusive o contratante foram proibidos de permanecer em qualquer ambiente do interior do Carioca enquanto o Malmsteen estivesse passando o som.”

A conclusão do frontman bateu forte:

“Já imaginávamos que não seria tranquilo, mas a surpresa foi o passar do horário até o momento em que simplesmente não era mais possível subir e montar nossos equipamentos. Dava pra ouvir da rua que ele ainda estava fazendo sua passagem de som, que durou mais de três horas. Para nós, foi simplesmente decepcionante ver que um cara que revolucionou o mundo da guitarra é uma pessoa tão egoísta e m#rda.”

Também pelo aplicativo, colhemos uma declaração oficial de Dio Lima, tecladista da Opus V, complementando a nota postada pela assessoria de imprensa do grupo:

“Chegamos no horário, nossa equipe estava com todo o equipamento montado do lado do palco esperando o Malmsteen terminar a passagem para subirmos. Então ele colocou uma cláusula para iniciar o show: teria que ter o intervalo de uma hora entre as bandas de abertura e o show dele. Obviamente não havia mais tempo para as duas bandas tocarem e aí decidimos: se não tocam as duas, não toca nenhuma. E fomos embora.”

Por meio de suas redes sociais, a produtora Dark Dimensions, responsável pela realização do show, declarou que não irá mais trabalhar com o guitarrista. A nota diz:

“Yngwie Malmsteen no Brasil, quem foi ao show não se decepcionou, uma aula para quem gosta de guitarra!
Segunda vez que trabalhamos com o artista. A primeira foi em 2016, na ocasião foi tudo tranquilo, diferente de ontem (24/10)

Trabalho exaustivo, dobramos a nossa equipe, chegamos cedo (9h) para não ter nenhum tipo de imprevisto!
Mas infelizmente o artista não colaborou, fez de tudo para atrasar porque ele não queria a apresentação das bandas nacionais, quem estava no local viu tudo o que aconteceu, só resta o nosso pedido de desculpas para as bandas Skalyface e Opus V, infelizmente algumas situações fogem das nossas mãos.

Também garantimos que esse foi nosso último trabalho com o artista, muito estresse, descaso e não precisamos disso.

Pelo menos o show valeu a pena.”

https://www.instagram.com/p/CkJbwfaJc2i/

O que diz o próprio Yngwie Malmsteen

Em resposta a uma publicação feita no Facebook pelo fotógrafo Gabriel Gonçalves, o próprio Yngwie Malmsteen se manifestou. O guitarrista disse que o atraso na passagem de som não foi proposital e alegou que os responsáveis pelo evento não ofereceram estrutura em condições ideais para seu show.

“Que monte de mentiras! Atrasando de propósito? Acho que não! A casa de shows deveria ter deixado tudo pronto, assim como não mentir para as bandas de abertura sobre a verdade de não ter se organizado. Faço isso há mais de 40 anos – não preciso atrasar nada, a menos que o equipamento prometido não seja fornecido em condições de funcionamento. Claro e simples.”

Yngwie Malmsteen no palco

Alheios à confusão toda e loucos para ver Yngwie Malmsteen, os fãs foram liberados para entrar às 19h05. Sem ter o que fazer por duas horas, restou bater papo, se trancar no celular ou prestar atenção à discotecagem, cuidadosamente criada para quem curte guitarras, com pérolas de Steve Vai, Van Halen, Judas Priest, Buckethead, Joe Satriani, Symphony X, Firewind, Porcupine Tree e Kiko Loureiro – tanto em “Escaping” quanto em duas faixas de “Dystopia”, álbum de sua fase no Megadeth. O “campeão”? John Petrucci: foram tocadas duas músicas solo, uma no Liquid Tension Experiment e sete (!) do Dream Theater.

Às 21h03, o sempre polêmico Yngwie Malmsteen deu as caras mandando bronca e imediatamente enfeitiçando a plateia ao som de “Rising Force”. Aqui, o vocal originalmente gravado por Joe Lynn Turner no álbum “Odyssey” (1988) é interpretado pelo tecladista Nick Marino (NZM, ex-Generation Axe) – que, como os colegas Emi Martinez (baixo; Arcsin, ex-Paralysys) e Brian Wilson (bateria; ex-Enforcer, Midnight Spell e Hellwitch), dispõe de pouquíssima iluminação de palco, justificando os raros registros deles na cobertura fotográfica de Gustavo Diakov.

Um simples “Boa noite, São Paulo!”, ao final de sua execução, foi a primeira de poucas interações do guitarrista. Sem exagero: nesse pontapé inicial, ao menos três palhetas voaram para a galera! A partir daí, tornou-se tarefa hercúlea tentar contar os arremessos ao longo dos noventa e três minutos de espetáculo – e perdemos a conta de quantas vezes elas foram repostas no pedestal de seu microfone.

Como decoração única, o telão de fundo estava ligado. Mas de que adiantou se, à frente, havia quinze caixas e vinte e quatro cabeçotes Marshall de enfeite? No mais, logo de início percebia-se um padrão: ou trechos de músicas eram combinados, como “Top Down, Foot Down / No Rest For The Wicked”, segunda do set, e “Into Valhalla / Baroque & Roll”; ou reduzidas a versões menores em relação aos originais, mantendo-se suas principais características – apenas um cover e a última superariam as durações de estúdio.

Do álbum mais recente, “Parabellum” (2021), tocaram “Relentless Fury”, “Wolves At The Door”, “(Si Vis Pacem) Parabellum” e “Toccata”. Evidentemente, porém, causaram maior apelo composições como a citada “Rising Force”, “Evil Eye”, “You Don’t Remember, I’ll Never Forget” (cantarolada pelo público) e a saideira “Black Star”, fora o cover “Smoke On the Water” (original do Deep Purple).

Do público quieto aos esporros no baixista

Considerando-se o dia da semana, houve boa lotação. Os presentes estavam confortavelmente espalhados por mais da metade da pista e dos camarotes. Contudo, faltou um pouco de energia à massa: na prática, a pista mal se mexia e, no máximo, o que se via era um ou outro evil horn ou um dedilhar no ar.

O fato foi notado por Yngwie a ponto de soltar um comentário provocativo antes do clássico do Deep Purple:

“Deixem-me checar, não tenho certeza: estou em São Paulo, Brasil? Não me lembrava de vocês serem tão quietos. Eu me lembrava de vocês serem malucos!”

Ao lado deste escriba, um espirituoso fã saiu-se com um hilário “Minha mãe tá solteira, Malmsteen!” após a mencionada “(Si Vis Pacem) Parabellum”. Porém, a julgar pelos dois esporros que o guitarrista deu no baixista Emi Martinez, vociferando e apontando para o retorno depois de “Soldier” e “Wolves at The Door”, há limites ao que se pode desejar à própria genitora.

Falando sério, já pensou tê-lo como padrasto? As broncas eram tamanhas que outro fã se incomodou e disparou a um amigo: “o bicho tá atacado hoje”, possivelmente sem sequer saber o que já havia acontecido. O bizarro é que manuais básicos do mundo corporativo pregam elogios em público e broncas no privado (qualquer um sabe disso!) e o povo gritando “Malms-teen! Malms-teen” não o incentivava a baixar a bola em seu comportamento.

Vale destacar também algumas curiosidades. Ao terminar “Trilogy (Vengeance)”, mesmo com a enxurrada de notas despejadas passando de uma hora de exibição, Yngwie ficou sozinho no palco, como se tudo que fizera, pedrada após pedrada, não bastasse e ainda precisasse de um… solo de guitarra de quatro minutos! E mais: o excelente Brian Wilson também teve direito a seu solo de bateria, mas, curto, não chegou a sessenta suficientes segundos para o dono da festa dar uma rápida saída do palco. E já pensou que legal teria sido se “Seventh Sign”, sétima faixa de seu sétimo full length, fosse a sétima no repertório?

No fim das contas…

No frigir dos ovos, quem saiu do conforto do lar somente para ver o senhor marrento sem saber de suas presepadas certamente adorou o que assistiu e escutou. Já quem se informou passou a desconstruir a admiração e imagem do ídolo, afetando a percepção – caso deste repórter. Significa que a performance foi ruim? De forma alguma, mas o encanto quebrado cortou o barato a ponto de termos optado por não redigir esta resenha no calor do momento – e até constatamos que as mini-gravações feitas ali na hora estavam bem legaizinhas!

Por se tratar de um show de guitarrista para guitarristas, identificamos Kiko Shred (Viper) e Vinicius Castellari (Project46) na pista. Convidada a dividir os vocais num cover da Skalyface para “I Want Out”( Helloween), Karina Menasce (Allen Key, Mercy Shot) também era facilmente localizada no fundão, mas o hino do Helloween ficou para uma nova oportunidade.

Por fim, nossa solidariedade aos citados Marlon Bueno e Dio Lima, além de: Renan Paradella e Diogo Novelo (guitarras), William Cupim (baixo) e Rafael de Abreu Raimundo (baterista), todos da Skalyface; e a Paulo Lima (vocal), Lucas Araújo (guitarra), Tiago Moreira (baixo) e Miguel Muniz (bateria), integrantes da Opus V, bem como às duas equipes técnicas.

Afinal de contas, as ações de Yngwie Malmsteen não se justificam e aí não adianta posar de religioso ao se despedir: “Obrigado! Deus os abençoem! Boa noite! Muito obrigado”. Tampouco serve para algo tocar com um crucifixo pendurado no pulso esquerdo e exibir outro um tanto maior no peito se seus atos não condizem com a fé. Que Deus o ajude, pois o próprio dito-cujo não faz sua parte.

*Fotos de Gustavo Diakov / @xchicanox

Yngwie Malmsteen – ao vivo em São Paulo

  • Local: Carioca Club
  • Data: 24 de outubro de 2022
  • Turnê: Parabellum

Repertório:

  1. Rising Force
  2. Top Down, Foot Down / No Rest for The Wicked
  3. Soldier
  4. Into Valhalla / Baroque & Roll
  5. Like An Angel
  6. Relentless Fury
  7. Wolves At The Door
  8. (Si Vis Pacem) Parabellum
  9. Badinerie [Johann Sebastian Bach]
  10. Adagio [Niccolò Paganini]
  11. Far Beyond The Sun [com trecho de “Bohemian Rhapsody”, do Queen]
  12. Seventh Sign
  13. Toccata
  14. Evil Eye
  15. Smoke On The Water [Deep Purple]
  16. Trilogy (Vengeance)
  17. Solo de guitarra
  18. Brothers
  19. Fugue
  20. Solo de bateria
  21. You Don’t Remember, I’ll Never Forget

Bis:

  1. Black Star

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