É normal para qualquer pessoa pública procurar ter controle não só sobre sua privacidade, mas também moldar a narrativa em torno de sua vida.
Entretanto, no caso da Rainha Elizabeth II, essa habilidade se foi com o sucesso de “The Crown”. Criada por Peter Morgan, responsável por outras obras – cinema, TV e teatro – tratando da Família Real britânica, a série da Netflix escancarou os bastidores da coroa britânica e as relações estremecidas entre a nobreza.
Ou ao menos é o que a percepção pública virou por causa da série. Vários membros da Família Real e funcionários da Coroa contestaram os eventos privados apresentados em “The Crown”, com o próprio criador falando que se tratava de uma dramatização.
A série tem sido alvo tanto de elogios quanto críticas devido à combinação tortuosa de atenção cirúrgica a detalhes visuais e reprodução histórica, enquanto quase todos os diálogos e personagens não são sujeitos ao mesmo esmero.
Então a questão vira: Quais eventos da vida de Elizabeth II mostrados em “The Crown” foram reais e quais foram dramatizados?
FATO: A Rainha soube da morte do pai enquanto estava no Quênia
Apesar de apresentar o estado de saúde do Rei George VI como desconhecido pelo resto da Família Real – o que não era verdade – Elizabeth estava no meio de uma viagem pelo Quênia quando soube da morte de seu pai.
A maneira da descoberta, com o Príncipe Phillip sendo informado por um jornalista e contando a ela, também foi apresentada corretamente, assim como a necessidade de levar um vestido preto para o avião real em Londres, pois Elizabeth não havia levado roupas dessa cor na mala de viagem.
FATO: A Rainha e sua primeira briga pública com Phillip
Todo casal briga, é uma inevitabilidade. No caso de Elizabeth e o príncipe consorte, o problema era manter esses confrontos sigilosos.
“The Crown” mostrou um desses momentos, com a Rainha e Phillip tendo uma briga capturada por câmeras durante uma turnê real da Austrália. O príncipe consorte foi filmado sendo perseguido pela monarca, que atirou uma raquete de tênis nele. Ao notarem a equipe de filmagem, ambos voltaram para dentro.
A única diferença da série para a realidade foi quem pediu pelos rolos de filme. Em “The Crown”, a Rainha pede aos jornalistas por discrição, quando na realidade o pedido foi feito por um secretário da Coroa.
FICÇÃO: A Rainha não impediu o casamento entre a Princesa Margaret e Peter Townsend
A Princesa Margaret historicamente é uma das integrantes mais escandalosas da Família Real, e “The Crown” a apresenta dessa maneira. Uma das maiores controvérsias envolvendo a irmã da Rainha foi sua relação com o capitão Peter Townsend, 15 anos mais velho que ela e divorciado.
Margaret foi pedida em casamento por Townsend em 1952, e assim como durante a crise que resultou na abdicação de seu tio Edward VIII, a princesa se viu indo contra as instituições com seu desejo de casar alguém já divorciado.
Em “The Crown”, Margaret recebe um ultimato de Elizabeth, dizendo que um casamento com Townsend significaria sua saída da Família Real. Contudo, de acordo com documentos descobertos pela BBC, a Rainha planejou com o auxílio do primeiro ministro Anthony Eden para permitir o casamento da irmã e sua permanência na realeza. A princesa precisaria abdicar somente de seu lugar na linha de sucessão.
O plano não precisou ser posto em prática porque a esse ponto, o desgaste da situação apressou o fim do noivado entre Margaret e Townsend.
MAIS FICÇÃO QUE FATO: A rivalidade entre a Rainha e Jacqueline Kennedy
Durante a segunda temporada de “The Crown”, a Rainha lidou com a visita iminente do novo presidente americano, John Kennedy, e sua esposa Jackie. Apesar de se darem bem ao início, a relação entre as duas teria azedado quando alguém informou a monarca de comentários maldosos feitos por Jacqueline sobre a decoração do Palácio de Buckingham e o estilo de Elizabeth II.
Embora não existam provas concretas de comentários maldosos feitos pela primeira dama, o fotógrafo Cecil Beaton teria dito que Jackie Kennedy teria expressado não ter ficado impressionada com o palácio e a monarca inglesa.
Além disso, o efeito mostrado na série de Elizabeth tomando um papel mais ativo em política externa e dançando com o presidente de Gana é exagerado, uma vez que a Rainha não fez viagens à África nos meses após a visita dos americanos.
FATO: A reação da Rainha à tragédia de Aberfan em 1966
Em 1966, um deslizamento de detrito decorrente da exploração de carvão na cidade galesa de Aberfan soterrou uma escola e várias casas, matando 116 crianças e 28 adultos. Na série, são mostradas as críticas feitas à Rainha por demorar oito dias para ir à cidade e sua razão para esperar.
Elizabeth não queria que sua presença e os protocolos associados a ela tirassem foco dos esforços de resgate. Contudo, quando a rainha finalmente foi a Aberfan, a série cometeu um pequeno ato de ficção, com a monarca não demonstrando emoções publicamente, escolhendo chorar em privado.
Na realidade, Elizabeth derramou lágrimas publicamente enquanto visitava o local do desastre, algo observado por locais e sobreviventes.
FICÇÃO: O encontro com Michael Fagan
Nunca houve uma conversa entre a Rainha e Michael Fagan sobre o estado do país quando esse invadiu o Palácio de Buckingham pela segunda vez em 1982. Completamente ficcional.
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