Quase dois anos após o lançamento de “Discharge”, os paranaenses do Electric Mob puderam finalmente levar o disco, um dos melhores de 2020, para a estrada.
A quarta das sete paradas previstas para a turnê homônima ao álbum se deu no último sábado (14), no Rio de Janeiro. A casa, Rock Experience, distingue-se como uma das poucas de pequeno porte a ter sobrevivido à pandemia na capital fluminense.
Com o relógio prestes a dar nove da noite — horário previsto para a banda de abertura, Sixty Nine Crash, subir ao palco —, o público presente ainda era tímido em número e modos, como se hesitante quanto a permitir-se alguma diversão. Quem não teve o traquejo social afetado nos tempos do Covid-19 que atire a primeira pedra.
Sob o comando do vocalista Jay Roxx — que muitos conhecem em razão do canal Resenhando do YouTube —, o Sixty Nine Crash vive um momento especial. Em 2022, a banda carioca completa dez anos de estrada, e o show em casa basicamente inaugurou as comemorações.
Por mais que o histórico de incessantes mudanças na formação nos permita desconfiar do contrário, o line-up atual — com Tande Novaes (guitarra), Renato Larsen (bateria) e o estreante Edu Cardozo (baixo) —, nos pouco mais de 40 minutos que teve para mostrar serviço, deu todos os sinais de que chegou para ficar.
O repertório contemplou ambos os álbuns do grupo. De “Louder!” (2014), as escolhidas foram “Wasted in Dreamland”, “Dead Inside” e a faixa-título. Já de “Postcards from the Black Sun” (2018) foram tocadas sete músicas, com destaque para “All Lies Are True”, que encerrou a apresentação no melhor estilo “festa da firma”, com pessoas selecionadas do público subindo ao palco e engrossando o coro no refrão.
Outro momento marcante foi quando Jay e sua turma tocaram sua já conhecida versão de “Purple Rain”, clássico do saudoso cantor Prince, para alguns isqueiros e lanternas de celulares, no que seria o único cover da noite.
Não, você não leu errado. A “piazada de Curitiba”, como Renan Zonta (vocais), Ben Hur Auwarter (guitarra), Yuri Elero (baixo) e André Leister (bateria) se referem a si mesmos, não caiu em tentação e, com a cara e a coragem e assumindo todos os riscos cravou um setlist cem por cento autoral. E o resultado foi história sendo escrita.
Em 9 de maio de 1974, um jovem e ainda pouco badalado Bruce Springsteen se apresentou no Harvard Square Theater em Cambridge, Massachusetts. O influente crítico musical Jon Landau estava na plateia. Impressionado com o que viu, ele escreveu: “Vi o futuro do rock ‘n’ roll e seu nome é Bruce Springsteen”.
Foi mais ou menos essa a sensação que o Electric Mob proporcionou a quem optou por receber de braços abertos as bases estilísticas e comportamentais do hard rock que vem por aí. Entre as principais características do som, a ousadia que lhe permite admitir influências de (muitos) outros gêneros e a personalidade que lhe impede de tomar para si realidades e temáticas gastas de outrora.
Tal como Jagger e Richards, Zonta e Auwarter comportam-se como os mestres de cerimônia; dândis alegres, para lá e para cá, cujas expressões, sobretudo do guitarrista, denotam um misto de autossatisfação com pés fora do chão. Felicidade os define. São rockstars natos, vestidos de atitude — que o diga a jaqueta de Renan, na qual lia-se “ANTI-FASCIST SOCIAL CLUB”. Vale ressaltar que poucas vezes testemunhei vocalista com desempenho tão fiel às gravações em estúdio. Haja fôlego!
Mais discretos, mas nem por isso menos competentes, Elero e Leister são uma cozinha dos sonhos. É como se o primeiro tocasse seu baixo com uma picareta e o segundo tivesse marretas no lugar das mãos. A entrega foi tamanha que André praticamente desmaiou após encerrado o show.
Nem só de músicas de “Discharge” foi composto o repertório: “Black Tide”, “Until the Sun” e “Need to Rush”, lançadas no EP “Leave a Scar” (2017) pegaram de surpresa quem achou que veria o álbum lançado pela Frontiers Records na íntegra. Mas a surpresa maior ficou por conta de “4 Letters” (originalmente grafada apenas em minúsculas), do aguardado próximo álbum, ainda sem título, que sai no segundo semestre.
Não foi na íntegra, mas foi quase: apenas “123 Burn” (originalmente grafada em maiúsculas) ficou de fora, mas nem deu para sentir falta tamanha a emoção empregada em “Your Ghost” (originalmente grafada apenas em minúsculas), o aceno à “Rag Doll” (Aerosmith) que corre nas veias de “Higher Than Your Heels” (“puta som daora, mêo!”) e a majestade de “Devil You Know”, que é a síntese perfeita de tudo de melhor que a rapaziada tem a oferecer.
Ecoando o que escrevi em postagem no meu Instagram, só não acha o Electric Mob a melhor banda do Brasil quem nunca ouviu seu álbum ou assistiu a um de seus shows. Que bom que um dia poderei contar ao meu filho que eu estava presente desde o começo dessa trajetória que, posso apostar, será das mais vitoriosas.
A Discharge Tour continua com shows em Cascavel – PR (20/05), Foz do Iguaçu – PR (21/05) e Curitiba – PR (28/05).
Electric Mob e Sixty Nine Crash – ao vivo no Rio de Janeiro
- Local: Rock Experience
- Data: 14 de maio de 2022
- Turnê: Discharge Tour
Repertório do Sixty Nine Crash:
- We Don’t Need Heroes
- Burning Bridges
- Give Me A Sign
- Dead Inside
- Wasted in Dreamland
- Louder
- Purple Rain (cover de Prince)
- Not Afraid to Die
- Bleeding Heart
- Warfield
- All Lies Are True
Repertório do Electric Mob:
- Black Tide
- Gypsy Touch
- King’s Ale
- Higher Than Your Heels
- Until the Sun
- Brand New Hope
- We Are Wrong
- Your Ghost
- 4 Letters
- Got Me Runnin’
- Need to Rush
- Far Off
- Devil You Know
- Upside Down
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