Exibido pela primeira vez em 2 de dezembro de 1983, o videoclipe de “Thriller”, faixa-título do álbum lançado por Michael Jackson no ano anterior, continua sendo uma referência no segmento audiovisual.
O projeto ambicioso não só fez o disco se tornar um enorme sucesso de vendas, como também revolucionou a forma como os videoclipes passaram a ser tratados por artistas e gravadoras de todos os estilos.
Até aquela época, vídeos eram produções mais modestas. A jovem emissora MTV, que ainda não tinha a influência conquistada nos anos seguintes, era o principal mercado dessas produções.
O próprio Michael Jackson já havia lançado alguns clipes mais arrojados, como os feitos para as músicas “Beat It” e “Billie Jean”, do mesmo álbum. Mas com “Thriller”, a ideia de um vídeo feito para divulgar uma música seria levada a outro nível, com a criação de um curta-metragem em torno da canção.
A produção do clipe de Thriller
Para tocar o projeto, Michael Jackson teve a ideia de contatar o cineasta John Landis, que havia feito “Um Lobisomem Americano em Londres” em 1981. O filme inspirou o cantor, que já tinha em mente o cenário de terror ao contatar o diretor. Ironicamente, o artista assustou o diretor logo em seu primeiro contato, pois ligou para a casa dele às 2 horas da manhã.
Ambos tiveram chegaram à ideia de fazer um curta-metragem, que contaria uma história em torno da música. A esposa de John, Deborah Nadoolman, foi a figurinista responsável pela icônica jaqueta vermelha usada por Michael, além do visual dos zumbis e da namorada do cantor no vídeo, a playmate Ola Ray, tanto no segmento dos anos 50 quanto no “contemporâneo”.
O coreógrafo responsável pelos famosos passos de dança foi o premiado Michael Peters, que já havia assinado o vídeo de “Beat It” e aparecido como o líder da gangue, de roupa branca e bigode. Junto com Jackson, ele criou os movimentos com base em filmes de zumbis. A ideia era tornar tudo o mais simples possível – e sem parecer cômico, o que era uma preocupação real.
Com quase 14 minutos de duração, o videoclipe de “Thriller” foi o mais caro produzido até então. O valor da produção foi estimado na época em US$ 500 mil.
Além de todos os atores e custos comuns de uma produção do tipo, o clipe contou ainda com uma participação especial: Vincent Price, lendário ator dos filmes de terror, que faz a parte falada na música e no vídeo. Ele já havia feito um trabalho parecido anos antes, em um monólogo na canção “The Black Widow”, lançada por Alice Cooper no álbum “Welcome to My Nightmare” (1975).
Recepção e fé de Michael Jackson
Com tudo pronto, era o momento de divulgar o clipe de “Thriller”. O disco que recebe o mesmo título da canção estava registrando boas vendas, porém abaixo do esperado. Embora os vídeos anteriores tenham ajudado na divulgação, foi só quando os primeiros teasers do curta-metragem começaram a ser exibidos que a coisa engrenou de vez.
Cerca de um mês antes de ser exibido diretamente na MTV, foi organizado um evento de estreia com celebridades do porte de Prince, Eddie Murphy e Diana Ross, entre vários outros. A reação foi das melhores: ao fim, o público aplaudiu e pediu até por uma reexibição.
No entanto, quase tudo foi perdido antes da première. Michael Jackson, cuja família era Testemunha de Jeová, foi criticado por líderes de sua fé pelo fato de utilizar figuras demoníacas.
Arrependido, o cantor prometeu proibir a circulação do curta e queimar as fitas. Ele chegou a delegar essa ordem para seus funcionários.
Felizmente, John Branca entrou em cena. O assistente pessoal do cantor e uma das pessoas mais próximas a Jackson entrou em um longo processo de convencê-lo de que não haveria problema lançar o vídeo. Ele citou atores de filmes de terror que tinham origens cristãs e o convenceu a apenas colocar um pequeno texto na introdução, reafirmando que o conteúdo do clipe não correspondia a sua fé.
Para ajudar a cobrir os enormes custos da produção, foi lançado também um documentário sobre as filmagens, intitulado “The Making of Thriller”. A MTV foi uma das emissoras que o adquiriu, o que fez bastante diferença: como a emissora na época tinha uma política de jamais pagar pelos clipes exibidos, essa foi a forma encontrada de “burlar” essa regra.
O legado do videoclipe
O vídeo de “Thriller” fez com que a venda do álbum simplesmente dobrasse em questão de dias. Michael Jackson ganhou todos os prêmios possíveis pelo disco (que se tornou o mais vendido da história da música) e pelo clipe, o que o colocou de vez no primeiro escalão da música.
O impacto causado pelo clipe transcende gêneros musicais, pois foi quando os artistas passaram a dar mais atenção às suas produções audiovisuais. Fora que tudo aquilo entrou na cultura popular: não é raro ver referências e paródias do figurino, da coreografia e da música em si até os dias atuais. Até icônica jaqueta vermelha – arrematada por US$ 1,8 milhão durante um leilão em 2011 – se tornou uma das imagens mais famosas de Michael e um símbolo dos anos 80.
Curiosamente, nem tudo foram flores. Em 2009, poucos meses após a morte do cantor, John Landis processou a propriedade de Jackson e sua produtora artística. Ele afirma não ter recebido os royalties pelo vídeo de “Thriller” por muitos anos, numa longa briga jurídica que se arrasta até os dias de hoje. Ele trabalharia com Michael Jackson uma segunda vez no vídeo de “Black or White”, de 1991.
* Texto por André Luiz Fernandes, com pauta e edição por Igor Miranda.