Os fãs menos atentos podem não perceber, mas os Rolling Stones, claro, têm um baixista. Bill Wyman aposentou-se da banda em 1993 e sua vaga foi ocupada por Darryl Jones, que não aparece nas fotos de divulgação e ocupa um lugar mais discreto no palco, mas é o titular da função desde então.
Americano de Chicago, Darryl Jones é multi-instrumentista: além de baixo, toca bateria e xilofone. Antes de se juntar aos Rolling Stones, ele já era um respeitado músico de turnês e de estúdio, tendo gravado e/ou excursionado com Miles Davis, Sting, Madonna, Eric Clapton, Peter Gabriel e Pati LaBelle, entre outros.
Sua reputação, claro, aumentou bastante quando passou a tocar com os Stones. Ainda assim, ocasionalmente, ele continuou trabalhando com outros artistas, do porte de B.B. King, Joe Cocker, Ziggy Marley, Rod Stewart e Neil Young.
Jones não é um músico “oficial” dos Rolling Stones – sabe-se lá o motivo, já que toca em todas as turnês e participa de todos os álbuns desde que entrou. Talvez tenha a ver com o fato de que os demais integrantes considerem Bill Wyman “insubstituível”. Ou pode ter relação com a parte de negócios: o baixista é contratado, não um parceiro da empresa que é a banda.
Fato é que, por ser um funcionário, não há muitas entrevistas de Darryl Jones sobre o trabalho nos Rolling Stones. Porém, ele quebrou a “escrita” recentemente, ao conversar com a revista ‘Bass Player’ sobre vários assuntos – incluindo, claro, a banda que integra desde 1993.
Durante o bate-papo, ele contou, por exemplo, que nunca tentou tocar igual a Bill Wyman. “Antes do meu teste, comprei algumas coletâneas dos Stones e comecei a tentar aprender algumas linhas de baixo. Isso me mostrou, antes mesmo do teste, que não havia como eu aprender todas essas linhas de forma literal”, afirmou.
O músico contou que busca reproduzir os trechos mais icônicos e revelou que os guitarristas Keith Richards e Ronnie Wood gravaram muitas linhas de baixo nos álbuns do passado. “Há algumas linhas que realmente marcam a música. Tento fazer essas, mas não consigo pensar em nenhuma música que eu realmente toque igual a Bill”, disse.
Há, inclusive, certa liberdade por parte dos “chefes” para tocar diferente. “Em um ensaio, eu tirei a linha exata de Bill em ‘Respectable’ e comecei a tocá-la. Mick (Jagger, vocalista) perguntou o que eu estava fazendo e eu respondi que aquela era a linha exata da música. Ele disse: ‘não, não, não toque isso, toque o que você ouviu”, afirmou.
A memória de Keith Richards, que gravou várias linhas de baixo nos discos, também não ajuda muito nesses casos. “No meu primeiro ensaio com eles, perguntei a Keith se ele havia tocado baixo em uma música que estávamos tocando e ele disse que sim. Eu perguntei qual era a linha e ele respondeu: ‘não sei, cara… você é o baixista, você me diga qual é a linha de baixo’ (risos). Então, eles me deixam fazer o que quero. Toco a essência da canção e eles confiam que eu vou reproduzir isso. O resto, eles deixam comigo”, comentou.
E como é o trabalho na estrada? De acordo com Darryl Jones, não há uma grande demanda em termos físicos. “As turnês são bem confortáveis. Eles não fazem muitos shows, nem fazem apresentações consecutivas. As viagens e hotéis são bem organizados, então, não é difícil. Há certas coisas que são complicadas, como ficar longe de casa e tentar comer corretamente e coisas assim, mas dou meu jeito. Compro alimentos saudáveis sempre que chego a uma nova cidade e sempre estou aprendendo sobre isso”, revelou.
A história de Darryl Jones será contada em um documentário, intitulado ‘Like a Rolling Stone’, que já está em produção, mas ainda não tem data para sair.
Darryl Jones e Miles Davis
Com apenas 21 anos, Darryl Jones já estava tocando com Miles Davis, uma das grandes lendas do jazz. Ele gravou dois álbuns com o músico: ‘Decoy’ (1984) e ‘You’re Under Arrest’ (1985).
Durante o bate-papo, esse período também foi abordado e Darryl disse que Miles direcionava bem o que ele queria que os músicos tocassem. Porém, ao mesmo tempo, havia liberdade para trabalhar em ideias.
“Miles confiava nos músicos mais do que sua reputação levaria as pessoas a acreditar. Ele deixava você experimentar coisas novas, selecionava as partes que mais gostava e dizia: ‘ok, quero ouvir mais disso’. De vez em quando, ele falava para tocar alguma coisa de um jeito específico, mas ele nunca tocava igual duas vezes, o que sempre levava a uma certa variação”, contou.
Um método curioso adotado por Miles Davis era dizer para Darryl Jones mudar alguma linha de baixo que já era tocada há meses de um certo jeito. Isso mantinha o baixista em alerta, bem como proporcionava um ambiente de criação de novas ideias.
“Uma das primeiras músicas que gravei com Miles foi ‘Decoy’ e, no começo, eu tocava a linha de baixo com os dedos. Ensaiamos assim, mas logo depois que gravamos, ele disse para descartar. Perguntei qual parte e ele respondeu: ‘tudo’. Foi uma situação em que ele me pediu algo que eu não sabia se conseguiria, mas eu fiz. Ouvindo o disco, fico pensando: ‘por que eu faria algo diferente do que ele sugeriu?’. É uma das linhas de baixo que mais me dão orgulho”, comentou.