Um grande clássico entre os filmes sobre rock, ‘Quase Famosos’ (‘Almost Famous’) conta a história de um jovem aspirante a jornalista que acompanha a turnê de uma banda chamada Stillwater pelos Estados Unidos. O grupo é fictício, mas tocavam músicas realmente inéditas, gravadas por nomes de peso do segmento.
O resultado, seja musical ou de enredo e atuações, apresentado em ‘Quase Famosos’ é tão bom que o filme foi indicado a quatro categorias do Oscar em 2000, vencendo uma delas, de Melhor Roteiro Original, pelo trabalho do diretor Cameron Crowe também nesse quesito. Além disso, o longa conquistou dois Globos de Ouro, por Melhor Filme de Comédia ou Musical e por Atriz Coadjuvante (destinado a Kate Hudson, na foto abaixo, que deu vida a Penny Lane), e um Grammy já em 2001 por Melhor Trilha Sonora.
– Leia também: Como era gravar John Bonham em estúdio, do peso nos pés à afinação da bateria
O longa se passa no início da década de 1970, então, reproduz a cena rock daquele período. O protagonista, William Miller (Patrick Fugit), chega a ser barrado ao tentar cobrir um show do Black Sabbath no início do filme.
Há referências a outras bandas da época e a história do personagem principal é quase biográfica, pois Cameron Crowe também foi um redator adolescente da revista ‘Rolling Stone’, acompanhando grupos como Led Zeppelin, Eagles, Allman Brothers Band e Lynyrd Skynyrd. O próprio nome do Stillwater faz menção, ainda que possa ser de forma involuntária, a uma banda de rock que existiu naquele período, mas nunca ficou famosa.
Os músicos por trás do Stillwater
Por ter experiência nesse ponto, Cameron Crowe sabia bem como direcionar não só o filme, como a trilha sonora, de suma importância para a produção. Ele, então, contou com a ajuda de Nancy Wilson, guitarrista do Heart e esposa dele na época, para compor três músicas que seriam do Stillwater. As outras duas foram feitas pelo músico Peter Frampton, que também trabalhou como consultor técnico do longa.
Já com relação às gravações, as guitarras ficaram a cargo de Nancy Wilson, que fez as bases, e Mike McCready, do Pearl Jam, responsável pelos solos. Sim, McCready é o cara por trás de Russell Hammond (Billy Crudup), o guitarrista do Stillwater.
– Leia também: 10 cinebiografias de rock pouco lembradas e que, talvez, você não conheça
Os vocais foram feitos por Marti Frederiksen, que é conhecido por seu trabalho como produtor e, especialmente, compositor para várias bandas. Além da parceria de longa data com o Aerosmith, desde os anos 1990, Frederiksen já criou músicas para Mötley Crüe, Def Leppard, Mick Jagger, Ozzy Osbourne, Jonny Lang, Scorpions, Richie Sambora, Ace Frehley e Foreigner, além de nomes de outros estilos, como Sheryl Crow, Miley Cyrus (nos tempos de Hannah Montana), entre outros. Currículo de peso, ainda que não como cantor.
Os responsáveis por baixo e bateria foram músicos de estúdio, que não chegam a ser creditados de forma clara. Há, ainda, menções a colaborações do cantor e guitarrista country Gordon Kennedy.
Primeiro ‘sim’ do Led Zeppelin
Em entrevista à Entertainment Weekly, na época do lançamento de ‘Quase Famosos’, Nancy Wilson revelou que também foi a responsável pela seleção de músicas para complementar a trilha sonora, que traz sons de Rod Stewart, The Who, Elton John, Simon & Garfunkel, The Beach Boys, David Bowie, Cat Stevens e por aí vai, além de Led Zeppelin, que, pela primeira vez, autorizava um filme a usar uma música deles, que, no caso, era ‘That’s The Way’.
Por que ‘Quase Famosos’ foi o primeiro filme que o Led Zeppelin autorizou o uso de uma música deles? Segundo Nancy Wilson, o vocalista Robert Plant e o guitarrista Jimmy Page gostaram do longa e se identificaram com a história. “Robert Plant ficava andando de um lado para o outro dizendo: ‘eu conheço aquele guitarrista’. Cameron disse: ‘bem, esse é Billy Crudup, ele é um ator’. Plant falou: ‘não, não, eu quero dizer que conheço aquele cara daquele período, o conheço a vida toda”, relembrou Nancy.
– Leia também: Led Zeppelin quase fez turnê pelo Brasil em 1975
O conceito
A guitarrista do Heart também disse que convidou Mike McCready e Peter Frampton para o trabalho nas músicas autorais porque a ideia era ter um guitarrista “contemporâneo”, como McCready, e outro “com raízes do rock clássico”, a exemplo de Frampton. Ela queria criar uma sonoridade que refletisse os velhos tempos – tanto que usou equipamento 100% analógico para as gravações, como amplificadores valvulados e mesas de som antigas -, mas sem esquecer que o longa seria lançado no ano 2000.
E o mais curioso: a ideia não era que o Stillwater fosse excelente, apesar de existir capacidade para chegar a esse patamar. “Queríamos que fosse uma banda muito boa, mas que não estivesse totalmente formada. Uma banda com a sonoridade tipo ‘abertura do Black Sabbath'”, afirmou, em referência à posição que o próprio grupo fictício ocupava no filme.
Pitada de realidade vem no humor
Em referência ao mocumentário ‘Spinal Tap’, Nancy contou que, sim, o Stillwater deveria ter um pouco de sátira, com deboche aos egos e excessos do rock and roll, mas não exagerar no humor. “Precisávamos andar no meio da linha entre a paródia e algo que soasse legítimo. As letras e as músicas precisavam ser apreciáveis, mas com um pouco de humor escondido ali também. Só não dava para ficar totalmente ‘Spinal Tap'”, disse ela.
– Leia também: 8 fatos curiosos que não constam em The Dirt, filme do Mötley Crüe
Cameron Crowe tinha a ideia de ‘Quase Famosos’ bem desenhada em mente, por sua experiência prévia na ‘Rolling Stone’, mas Nancy Wilson revelou que ajudou bastante, já que, como musicista, ela lida com o “outro lado”. “Uma vez, fiz uma turnê que durou 20 anos (risos). Sinto falta de estar nos palcos, mas não de todo o restante de estar em turnê. O Heart fazia turnês da forma mais desumana possível, por anos, sem pausa. Uma das razões pelas quais os músicos de rock ficam tão problemáticos emocionalmente é pelo estilo de vida. Não dá tempo de amadurecer”, afirmou.