O fim de David Bowie foi cercado por coincidências no que diz respeito a datas. Ele faleceu em 10 de janeiro de 2016, dois dias depois de seu 69° aniversário e de ter lançado seu último álbum, “Blackstar”.
Graças a esta infeliz coincidência de datas, a obra de David Bowie tem sido celebrada, nos últimos dias, com diferentes tipos de tributos. Seja pelo primeiro aniversário de morte ou pelos 70 anos que o Camaleão comemoraria.
Um desses tributos, feito pela gravadora Columbia Records, é o EP “No Plan”, que apresenta três músicas inéditas de David Bowie, gravadas durante as sessões de “Blackstar”. Elas estão presentes na trilha sonora do musical “Lazarus”, dirigido por Ivo van Hove. Trata-se de uma amostra do que o Camaleão poderia ter feito se o destino tivesse lhe permitido viver um pouco mais.
O produtor Tony Visconti havia revelado, em entrevista concedida dias após o falecimento, que David Bowie sabia, desde novembro de 2015, que seu câncer era terminal. A notícia veio, inclusive, no fim de semana em que Bowie gravava as cenas para o clipe da música “Lazarus”. Contudo, mesmo em suas últimas semanas, o cantor falava em fazer uma sequência para “Blackstar”.
David Bowie e problemas prévios
O tempo e o destino foram implacáveis para David Bowie – muito devido a seus abusos ao longo dos anos. Ele sentiu dores no peito em 25 de junho de 2004, enquanto se apresentava em um festival na Alemanha. Foi diagnosticada uma obstrução em uma artéria e ele precisou fazer uma angioplastia. Tudo isso enquanto ele tinha apenas 57 anos.
Desde então, David Bowie não se apresentou mais ao vivo. Já não havia mais vontade, nem ritmo para tal. Foram somente algumas participações, em shows de Arcade Fire, David Gilmour e Alicia Keys, entre 2005 e 2006. Depois disso, deu adeus, em definitivo, aos palcos – e, de certa forma, tentou se despedir da música, apesar de não ter conseguido. Optou por aproveitar um pouco do que havia conquistado em seus anos anteriores, bem como curtir a família.
Bowie só voltou a trabalhar em algo na década seguinte, ao lançar “The Next Day”, em 2013. E, segundo relatos, seus últimos 18 meses de vida, entre 2014 e 2015, foram muito produtivos.
Doente, mas produtivo
Sabia-se do câncer de fígado desde meados de julho de 2014. Foi aí que David Bowie decidiu que retomaria o nível de suas produções. “Blackstar” foi gravado entre janeiro e abril de 2015, com o melhor material produzido por Bowie no período anterior, entre os últimos meses de 2014.
As primeiras demos foram entregues ao saxofonista de jazz Donny McCaslin, ao invés de qualquer outro músico de rock. O material evoluiu e as sessões de gravação ocorriam entre 11h e 16h, três vezes por semana. A saúde de David Bowie ainda não havia sido deteriorada, mas o ritmo de trabalho era um pouco menos intenso.
Após o fim da produção de “Blackstar”, David Bowie começou a trabalhar no musical “Lazarus”. As três faixas inéditas de “No Plan”, inclusive, aparecem na trilha sonora da peça, que também reúne uma série de clássicos gravados pelo músico em sua carreira.
Durante os ensaios para “Lazarus”, David Bowie manteve a sua classe. Esteve presente em boa parte dos compromissos relacionados e não reclamou de sua doença em nenhum momento, segundo relatos. Além disso, optou por não fazer nenhuma intervenção ao trabalho de direção de Ivo van Hove. Assim como o disco, tudo era feito em segredo.
Ivo sabia da doença de Bowie desde novembro de 2014, quando o próprio cantor o contou, dizendo, ainda, que não sabia se sobreviveria até a conclusão do projeto. Acabou por viver até a estreia, em dezembro de 2015.
Quando David Bowie não estava bem, tanto durante a produção do disco quanto do musical, ele simplesmente se afastava. Não se forçava a trabalhar demais. Somente os envolvidos sabiam do problema. Ainda assim, especialmente no período em que a peça era ensaiada – Bowie já estava mais debilitado na época -, o cantor fez o possível para participar de todos os eventos relacionados.
Os últimos passos de David Bowie
A noite de abertura de “Lazarus” ocorreu em 7 de dezembro de 2015, em Nova York. Foi a última aparição pública de David Bowie. A saúde do cantor já definhava, mas a aparência seguia impecável.
Entre os ensaios e a estreia do musical, David Bowie gravou dois videoclipes para promover “Blackstar”. O primeiro foi feito para a faixa que dá nome ao disco: um vídeo surrealista, dirigido por Johan Renck – o diretor de “The Last Panthers”, série para a qual a canção foi feita. Com seu senso multiartístico apurado, Bowie deu diversas sugestões para Renck durante o processo.
Em novembro, o segundo clipe foi gravado. “Lazarus”, também com direção de Johan Renck, é encarado como uma espécie de despedida por parte de David Bowie. Como dito anteriormente, na semana das filmagens, ele soube que seu câncer era terminal. Mesmo que nas entrelinhas, as cenas e a estética do vídeo transmitem a ideia de “adeus”.
John Renck nega tal hipótese. Ele disse, em recente entrevista para um documentário feito pela BBC, que o clipe de “Lazarus” não foi pensado como uma despedida. “Para mim, tem relação com o aspecto bíblico, com o homem que voltaria a renascer. Não tem nada a ver com a doença”, afirmou. Apesar disso, ganhou tais ares – com justiça. Basta assistir para entender o porquê.
Cada clipe tomou apenas cinco horas de um dia para ser gravado. Era o que a saúde de David Bowie suportava.
Em janeiro de 2016, vieram à tona o clipe de “Lazarus” (o outro vídeo havia sido lançado em novembro) de 2015, o álbum “Blackstar” e a morte de David Bowie. Mesmo com toda a tristeza que cerca este período, há de se destacar que seu adeus foi um dos mais elegantes da história da música.
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