“Sempre fomos uma banda de show, mas estamos sempre tendo que nos provar”, desabafou Sonny Sandoval, vocalista do P.O.D., em entrevista concedida a este que vos escreve, no início do ano, publicada na Rolling Stone Brasil. “Quando você vai ver o P.O.D. e olha para o lado do palco, você vê todas as outras bandas nos assistindo. Temos algum tipo de estigma. […] Aí esquecem da gente. […] Somos pioneiros nesse gênero, mas sempre somos um pouco esquecidos”.
A declaração é forte, mas irrefutável. Poucas bandas de nu metal tiveram carreira tão regular e constante como o grupo de Sandoval, Marcos Curiel (guitarra), Traa Daniels (baixo) e Wuv Bernardo (bateria), este último em hiato e substituído desde 2021 por Zachary Christopher. Em atividade há três décadas, eles construíram uma discografia de 11 álbuns — muitos nem sabem que o multiplatinado “Satellite” (2001) é o quarto, não o primeiro do catálogo — e cumprem uma agenda incansável de turnê, tendo chegado a quase 200 apresentações entre 2018 e 2019.

No entanto, diferentemente de outras atrações de nu metal que voltaram a ocupar grandes arenas e até estádios com o recente revival nostálgico, o P.O.D. segue como uma atração underground. Durante a turnê brasileira precedendo a atual, tocaram super cedo no segundo dia de Knotfest Brasil 2024, enquanto o Mudvayne, grupo do mesmo segmento que nunca teve a mesma popularidade, se apresentou logo antes do headliner Slipknot na data anterior.
Talvez seja pelo fato de Sandoval e seus parceiros não se glamourizarem tanto em comparação a outras bandas do segmento. Ou até pela resistência de parte do público às letras de caráter religioso — não é incomum que sejam rotulados como “metal cristão” ou “white metal”, embora seus versos sejam mais discretos nas referências espirituais. Mas não cabe qualquer tipo de especulação quando eles sobem no palco. Quem os assistiu na última sexta-feira (5) no Carioca Club, em São Paulo, iniciando uma turnê de sete datas pelo Brasil — a ser concluída na mesma casa de eventos na capital paulista no próximo dia 13 de dezembro —, pôde confirmar tudo o que foi dito por Sonny no primeiro parágrafo deste texto. O show é realmente ótimo.

A performance de sexta (5), diga-se, foi um compromisso extra agendado porque a data original está com ingressos praticamente esgotados. Em função disso, contou com adesão menor do público, que encheu a pista premium — sim, colocaram premium no modesto Carioca, que tem capacidade para 1,2 mil fãs —, mas ocupou apenas metade da área comum. Sonny tirou um momento da apresentação para agradecer à demanda acima do esperado, proporcionando um show extra. “Nós seguimos voltando para cá porque vocês nos querem aqui”, celebrou o enérgico frontman, em raro momento sem sua movimentação no palco. Em outra passagem, pediu barulho para as atrações de abertura Living Sacrifice e Demon Hunter, ambas com letras de orientação religiosa, mas de consistência bem abaixo na comparação com o headliner.
Pontualmente às 21h15, o quarteto subiu no palco e deu início a “Southtown”, canção raramente utilizada nos últimos tempos para abrir seus shows. Mesmo com seu andamento mais calmo e melodia à frente, arrancou reações enérgicas de um público que se soltou de vez com a tipicamente nu-metaller “Rock the Party (Off the Hook)” e “Boom”, esta responsável por incitar as primeiras rodas da noite.

O próximo bloco de repertório foi praticamente todo dedicado ao álbum mais recente (e com mais representantes na noite), “Veritas” (2024), e a “Murdered Love” (2012). São dois dos três melhores discos do P.O.D. na opinião de Sonny, com “Satellite” completando o top 3. A pula-pula “Drop” e a cadenciada “I Got That” antecederam uma curiosamente boa versão de “Don’t Let Me Down”, dos Beatles, disponibilizada como single neste ano e com direito a um raríssimo solo de guitarra do comunicativo Marcos Curiel. “Breaking”, faixa do novo disco presente a seguir, teve sua estreia ao vivo naquela ocasião.

Já na faixa-título do citado álbum de 2012, algo chamou atenção: sumiu o som da guitarra de Curiel. Um roadie surgiu rapidamente no palco para solucionar, mas o problema seguiu por quase toda a segunda metade da canção. Por incrível que pareça, não fez falta, seja pelos synths pré-gravados ou pela presença forte da cozinha nessa música. Ao fim, o problema se resolveu e o grupo repetiu o refrão final. Completando a referência ao disco “Murdered Love”, surgiu “Lost in Forever”, mais sincopada e com raras vozes agudas; já o trabalho de 2024 voltou a contribuir com “I Won’t Bow Down”, talvez a faixa que mais precisamente resuma a mescla entre rap, peso, melodia e letras motivacionais que define o P.O.D.

Como esperado, a porção final do set foi destinada aos sucessos. Trilha do filme “Matrix Reloaded”, “Sleeping Awake” tem caminhos harmônicos ousados, especialmente no refrão, devido à transição dramática entre acordes. De letra ainda atual, “Youth of the Nation” é a prova de que Sandoval e companhia não são apenas pregadores: há mensagem real sendo transmitida. A forte “Afraid to Die” (na versão original, com participação de Tatiana Shmayluk, do Jinjer) e a agitada “Soundboy Killa” se enfiam no meio deste bloco antes do encerramento com a emotiva “Will You” e a clássica “Alive” — cuja execução foi dedicada a Sam Rivers, baixista do Limp Bizkit falecido em outubro último.
Três ausências em relação ao setlist impresso no palco foram notadas no repertório de fato executado, duas delas de clássicos: as sempre tocadas “Set It Off” e “Satellite”, além de “Lay Me Down”. Sandoval chegou a dizer, nos momentos finais, que sua banda já estava sendo “tirada” do palco — em provável menção à previsão de encerramento para às 22h30, horário estourado em três minutos. Não rolou bis e muitos fãs demoraram a se dar conta de que realmente a performance havia se encerrado, com “apenas” 1h15 de duração.
Talvez essas três faixas sejam executadas no próximo sábado (13), já que a banda prometeu tocar canções diferentes em relação à última sexta (5). Que a qualidade da performance seja a mesma, ou até maior, com a casa, enfim, devidamente lotada para acompanhar um dos nomes mais subestimados do nu metal.

*P.O.D. e Demon Hunter se apresentam ainda no Rio de Janeiro (06/12 – Sacadura 154 – com Living Sacrifice), Recife (07/12 – Armazém 14), Curitiba (09/12 – Tork N’ Roll), Belo Horizonte (10/12 – Mister Rock); Brasília (12/12 – Toinha Brasil Show) e São Paulo (13/12 – Carioca Club). Ainda há ingressos à venda no site Clube do Ingresso.

P.O.D. — ao vivo em São Paulo
- Local: Carioca Club
- Data: 5 de dezembro de 2025
- Turnê: Veritas
- Produção: Estética Torta
Repertório:
- Southtown
- Rock The Party (Off the Hook)
- Boom
- Drop
- I Got That
- Don’t Let Me Down (cover dos Beatles)
- Breaking
- Murdered Love
- Lost in Forever
- I Won’t Bow Down
- Sleeping Awake
- Youth of the Nation
- Afraid to Die
- Soundboy Killa
- Will You
- Alive

Repertório – Demon Hunter:
- Sorrow Light the Way
- Heaven Don’t Cry
- Collapsing
- Heart of a Graveyard
- I Will Fail You
- Infected
- Cut to Fit
- Peace
- Dead Flowers
- Cold Winter Sun
- I’m Done
- The Last One Alive
- Storm the Gates of Hell

Repertório – Living Sacrifice:
- Flatline
- Symbiotic
- Hand of the Dead
- Local Vengeance
- Bloodwork
- The Reaping
- Reborn
- Reject
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