Pareceu que seria difícil a missão do Scorpions. Quando o rolo compressor Judas Priest terminou seu show, sobraram corpos no chão da pista do Allianz Parque, extenuados da maratona do Monsters of Rock 2025.
Quem não foi embora ou evitou encarar filas enormes para comprar qualquer comida e acessar banheiros do estádio, ficou sentado esperando pelos alemães. O grupo retornou ao mesmo estádio depois de dois anos, agora na posição de headliners do festival, mas o cenário não era animador.
Nos cinquenta intermináveis minutos de intervalo entre o fim do Judas Priest e o início da última apresentação da edição de 2025 do Monsters of Rock, a garoa apertou e o pessoal ou se levantou para colocar as capas de chuva, ou foi buscar abrigo. No palco, era nítido o desespero da equipe técnica para deixar o chão o mais seco possível. Afinal, para uma banda que celebrava seus 60 anos de carreira e tem seus dois membros principais com 76 anos de idade, todo cuidado é pouco.
E o show do Scorpions não começou de forma animadora. O longo vídeo de introdução da turnê de 60 anos do Scorpions, quase cinco minutos de duração, transformou a ansiedade de quando as luzes do estádio se apagaram em uma certa impaciência.
O início lento e pré-gravado de “Coming Home”, faixa do icônico disco “Love at First Sting” (1984), não gerou lá muita expectativa — até a voz de Klaus Meine dizendo que a banda estava chegando em casa em São Paulo parecia murcha.
Quando os músicos entraram no palco durante a parte rápida e mais empolgante da canção, a reação do público não foi das maiores, e nem melhorou na sequência com “Gas in the Tank”, única faixa da noite tirada do álbum mais recente, “Rock Believer” (2022).
A chuva não ajudava. Se Meine naturalmente se poupa nas movimentações devido aos seus recentes problemas de saúde, o hiperativo fundador Rudolf Schenker não corria o palco todo com sua guitarra como de costume. Por motivos opostos, o risco de um tombo que estragasse a noite ali era grande.
Da mesma forma como a chuva diminuiu, o show foi engrenando. Afinal, Scorpions tem hits e, se a pista deu uma visível esvaziada depois do Judas Priest, as cadeiras superiores, cobertas, seguiam lotadas em todo o anel do estádio. A maioria silenciosa do público que comprou ingressos do Monsters of Rock acreditava no potencial dos alemães e foi recompensada.
A apresentação dos alemães começou a entrar nos trilhos com “Make it Real” apelando para a bandeira do Brasil no telão, seguida por “The Zoo”, com Matthias Jabs quase despercebido ao exagerar nos seus solos em talkbox enquanto Klaus Meine jogava baquetas para o público. A icônica pose da trinca principal empunhando guitarras, incluindo o vocalista, em “Coast to Coast” ao lado do baixista Paweł Mąciwoda, já veio como aquele suspiro de normalidade à deliciosa cadência da faixa instrumental.
A garoa até cessou, mas não foi nem próxima da merecida a reação fria do público ao medley setentista formado por “Top of the Bill”, “Steamrock Fever”, “Speedy’s Coming” e “Catch Your Train”, parte essencial do conceito de celebração aos 60 anos de carreira do grupo. Não é como se o Scorpions esperasse uma plateia de fanáticos da fase que contava com o icônico Uli Jon Roth nas guitarras. Até por isso, o grupo já deixou engatilhado para a sequência o megahit “Bad Boys Running Wild”, outra do disco de 1984, base do repertório desta noite com seis músicas.
Dali em dia, foi o divertido show dos Scorpions de sempre. Aquela maioria deixou em definitivo de ser silenciosa e acompanhou a plenos pulmões e lanternas do celular as baladas “Send Me an Angel” e “Wind of Change”. Depois, duas faixas não tão comuns nos repertórios da banda, as irresistíveis “Loving You Sunday Morning” e “I’m Leaving You”, mantiveram o público aceso quando as guitarras elétricas voltaram a ditar o ritmo. Klaus Meine, apesar de demonstrar esforço hercúleo, soltava a voz um pouco combalida, é verdade, mas ainda boa o suficiente para fazer jus à sua jaqueta com os escritos “Rock’n’Roll Forever”.
O jogo estava tão ganho que nem a volta da garoa nem um enfadonho solo de baixo e bateria tiraram a animação do público. O peso desproporcional que Mikkey Dee, devidamente recuperado de problemas de saúde, tem dado às músicas do Scorpions foi um espetáculo à parte celebrado aos urros quando ficou sozinho no palco. Daí para hits do porte de “Tease Me Please Me” e “Big City Nights”, a goleada estava estabelecida no Allianz Parque.
Dessa vez, diferente de Brasília três dias antes, não faltou o hino “Still Loving You”, que encerrou a primeira parte do show com os músicos se despedindo na passarela em frente ao palco, mesmo sob uma insistente garoa fina. O retorno ao bis só demorou um pouquinho além do normal porque o vídeo que introduz o escorpião gigante inflável no palco durou quase três minutos.
Quando “Blackout” entrou quebrando tudo sob a benção das patas do bicho enorme no meio do palco se mexendo como bonecão de posto de gasolina, foi apenas um final digno de festa de uma celebração especial. Que não poderia terminar de outro jeito senão com “Rock You Like a Hurricane” para o público cantar junto.
Aquela missão que parecia difícil uma hora e quarenta minutos antes se transformou em mais uma conquista tranquila dos Scorpions. Afinal, não é à toa que uma banda chega aos 60 anos de carreira ainda como headliner de apresentações enormes. Talvez não chegue a celebrar o septuagésimo aniversário, mas, depois dessa noite no Allianz Parque encerrando o Monsters of Rock de 2025, duvidar disso é coisa de maluco.
Scorpions — ao vivo no Monsters of Rock 2025
- Local: Allianz Parque
- Data: 19 de abril de 2025
- Turnê: Latin America 2025
- Produção: Mercury Concerts
Repertório:
- Coming Home (com introdução lenta pré-gravada)
- Gas in the Tank
- Make It Real
- The Zoo
- Coast to Coast
- Medley setentista: Top of the Bill / Steamrock Fever / Speedy’s Coming / Catch Your Train
- Bad Boys Running Wild
- Send Me an Angel
- Wind of Change
- Loving You Sunday Morning
- I’m Leaving You
- Jam de baixo e bateria
- Solo de bateria
- Tease Me Please Me
- Big City Nights
- Still Loving You
Bis:
- Blackout
- Rock You Like a Hurricane
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