Durante sua última passagem pelo Rio de Janeiro, em maio de 2019, o Graveyard tocou num festival de uma cerveja carioca, num local aberto, perto da Rodoviária Novo Rio, na mesma noite em que se transmitia o último episódio de “Game of Thrones”. Ao final da performance, muitos saíram rapidamente para tentar pegar o início do desfecho da trama televisiva.
Ambiente e situação inusitados. Naqueles longínquos tempos de pré-pandemia, ainda havia séries que só estreavam na televisão.
Seis anos depois, o grupo sueco de hard/blues rock retorna ao Rio, agora acompanhados do Danko Jones. Um pouco menos, mas ainda inusitado, pois há contraste interessante entre a abordagem festeira dos colegas canadenses com a melancolia do quarteto formado por Joakim Nilsson (voz e guitarra), Jonatan Larocca-Ramm (guitarra e voz), Truls Mörck (voz e baixo) e Oskar Bergenheim (bateria).
Desta vez, o local escolhido foi o Agyto (antigo Teatro Odisseia), o que deixou um clima mais intimista. O público compareceu em bom número, praticamente lotando o espaço.
Inicialmente, os shows estavam marcados para terem início às 19h30, com abertura do Elder Effe. No entanto, houve antecipação na grade em cima da hora, o que pegou muitos de surpresa — inclusive este que vos escreve. Assim, adentrando o local por volta de 19h40, os canadenses já estavam em sua segunda canção.
Danko Jones: rock ‘n’ roll direto ao ponto
Danko Jones (voz e guitarra), J.C. (baixo) e Rich Knox (bateria) subiram ao palco do Agyto dispostos a causar uma boa impressão em sua estreia em terras fluminenses. O grupo veio ao país em 2009, mas não tocou no Rio naquela ocasião.
Logo de cara, a banda despejou uma sequência de músicas sem dar tempo para respiro, trazendo “Guess Who’s Back”, “Get High?” e “I’m in a Band” neste início. Boas amostras de um repertório direto e enérgica, com composições baseadas em riffs simples, refrães fáceis de se cantar junto e melodias cativantes e poderosas que remetem ao hard rock clássico de nomes como AC/DC e Kiss. O som limpo e potente favoreceu o clima rock ‘n’ roll direto e festeiro oferecido pelo trio.
Jones, um frontman clássico com presença de palco magnética, não economizou nas poses e nos tradicionais discursos entre as músicas, sempre com bom humor e sacadas inteligentes. Em dado momento, disse estar muito feliz por andar pelas ruas do Rio e ver pessoas iguais a ele. Também pediu vaias ao fato de eles nunca terem se apresentado na cidade, mas brincou ter ficado “chateado” quando a intensidade foi alta demais.
A dupla de apoio não fica atrás. Também chamam atenção, exalam energia e desfilam entrosamento de deixar o queixo caído.
No miolo do set, destacaram momentos como “I Gotta Rock” e “First Date”, com todos cantando juntos seu ótimo refrão, além de um trecho de “You Are My Woman” antes de engatarem “Flaunt It” e a pesada “Full of Regret”. Em alta rotação, o fim da performance reservou ao público canções do porte da cadenciada “Had Enough”, a groovada “Lovercall”, “Invisible” e a pesada e festiva “My Little RnR”. Um ótimo aquecimento de menos de uma hora.
Repertório — Danko Jones:
- Guess Who’s Back
- Get High?
- I’m in a Band
- I Gotta Rock
- Lipstick City
- First Date
- Good Time
- You Are My Woman (Snippet)
- Flaunt It
- Full of Regret
- Had Enough
- Lovercall
- Invisible
- My Little RnR
Graveyard: melancolia e peso na medida certa
Após a apresentação explosiva do Danko Jones, era a vez do Graveyard mostrar sua força. Os supracitados Joakim Nilsson (voz e guitarra), Jonatan Larocca-Ramm (guitarra e voz), Truls Mörck (voz e baixo) e Oskar Bergenheim (bateria) deram contornos distintos à noite com sua sonoridade melancólica, densa, pesada e envolvente, exposta em 14 músicas distribuídas em pouco mais de uma hora de set. A intensidade não se reduziu: mesmo diante de contratempos na parte técnica, não decepcionaram.
Logo na abertura com “Twice”, já se percebia um som embolado e efeitos excessivos na voz de Nilsson. Em “Cold Love”, quarta do set, a situação melhorou a ponto de evidenciar a versatilidade da banda, que consegue transitar com maestria entre blues, rock, psicodelia e o lado mais sujo do hard rock.
Nilsson conduz as músicas com uma interpretação repleta de emoção, que alterna entre momentos suaves e explosões viscerais. Larocca-Ramm, por sua vez, complementa com solos precisos, que trazem sempre exatamente aquilo que a música pede, nunca além.
Em “An Industry of Murder”, porém, os problemas técnicos se tornaram ainda maiores. A guitarra de Nilsson chegou a parar de funcionar e uma pausa se fez necessária para ajuste.
Um dos pontos altos da apresentação foi “Hisingen Blues”, uma das canções mais conhecidas do grupo. Está presente no álbum de mesmo nome, lançado em 2011 e responsável por garantir exposição à banda neste cenário. Cantada do início ao fim, embalou até mesmo uma espécie de moshpit (!).
Na segunda metade do set, o som estava mais bem equalizado. Momento propício para enfileirar outras músicas mais populares do quarteto. Logo antes do bis, “Uncomfortably Numb” chamou atenção com sua dinâmica que vai crescendo aos poucos e com seu final apoteótico.
A breve saída do palco é seguida por mais três canções: “Walk On”, com final estendido numa jam, “Ain’t Fit to Live Here” e “The Siren”. Uma demonstração definitiva da força e consistência do quarteto, que preservou sua relevância neste cenário revivalista do rock mesmo após quase 20 anos de carreira e um rompimento entre 2016 e 2017 que não durou nem seis meses. Só ficou esquisito executar a trinca final com as luzes da casa acesas, mas não surpreende: já fizeram isso nas outras passagens por aqui.
Ao fim, púbico satisfeito e uma mudança na percepção: na verdade, o contraste entre as bandas se transformou em complementariedade. Numa só noite, diversão e melancolia evidenciaram o aspecto multifacetado do rock ‘n’ roll.
*Graveyard e Danko Jones ainda se apresentam em São Paulo (Vip Station, 15/03) e Belo Horizonte (Mister Rock, 16/03).
Repertório — Graveyard:
- Twice
- Breathe in Breathe out
- Sad Song
- Cold Love
- I Follow You
- An Industry of Murder (problema na guitarra)
- Hisingen Blues
- Goliath
- Rampant Fields
- Please Don’t
- Uncomfortbaly Numb
Encore:
- Walk On (com jam estendida)
- Ain’t Fit to Live Here
- The Siren
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