O projeto Finally Home é fruto de uma amizade retomada entre Thiago Bianchi (voz), Fernando Quesada (violão e voz) e Leo Mancini (violão e voz). O trio, com o auxílio do pianista Fabrizio Di Sarno, gravou versões acústicas de músicas dos discos “Immortal” (2007) e “Origins” (2010), período em que foram integrantes do Shaman — no linguajar popular, a “segunda fase” da banda.
A solidez da reconciliação pareceu duvidosa quando, sem que tenha ficado claro por que, Bianchi tratou Quesada de forma pouco cortês durante uma entrevista dada ao vivo por ambos para o Ibagenscast. O canal atendeu ao pedido do grupo e tirou do ar as mais de três horas de conversa, destinada principalmente a divulgar a estreia ao vivo do Finally Home que ocorreria pouco mais de uma semana depois, na casa de shows Blue Note São Paulo. A filmagem está disponível apenas para membros da página.
E foi na noite de um chuvoso Dia das Bruxas que a banda subiu ao palco. Passados 30 minutos do horário marcado, começou “Renovatti”, longa introdução instrumental composta por Di Sarno para o DVD “One Live – Shaman & Orchestra” em um volume desproporcional para o tamanho da casa; provavelmente não muito distante do que deve ter sido no dia a gravação do show no festival tcheco “Masters of Rock” em 2013.
A música que dá nome ao projeto, presente no disco “Origins”, abriu o show com o grupo mostrando como seria a noite. Thiago Bianchi estava inspirado, mas é um artista que equilibra talento e exagero em proporções que variam. Se por diversos momentos foi aplaudido durante as músicas pela performance impecável, em outros chegou a ser caricato, como quando fez gutural ou explorou todos os aspectos da voz versátil e potente que de fato tem. A confusão entre fazer o que se pode e o que se deve em detrimento do que a melodia pede foi aumentando ao longo da apresentação, chegando ao máximo em “Inferno Veil”, última do setlist.
Fernando Quesada por diversas vezes atacou com força o violão, como se quisesse extrair do instrumento uma distorção que jamais seria entregue. Pode ser devido ao fato da alta carga emotiva presente. Foi o que mais se comunicou com o público. Destacou a importância de ele e Thiago terem se reaproximado (“no amor e na guerra”, nas palavras de Fernando), falou da fatídica entrevista e assumiu a autoria da banda como a responsável pela remoção do vídeo do canal Ibagenscast.
As palavras, contudo, lhe faltaram quando assumiu o vocal principal em “The Show Must Go On” (Queen). Esqueceu a letra, cantou na hora errada e pediu auxílio a Leo Mancini para terminá-la. Nessa música, houve a participação do primeiro convidado: Alê Costa, dono da marca de chocolates Cacau Show, no terceiro violão.
Já Leo Mancini permaneceu inabalável na posição de um dos maiores guitarristas e cantores do país — embora não aparente fazer questão de brigar por uma posição ou outra. Além de solos e backing vocals, assumiu o microfone em “Silent Lucidity”, cover do Queensrÿche que trouxe ainda a participação de Alex Batista no cajon. O teclado e o piano apareceram de forma oscilante no começo do show, mas Fabrizio Di Sarno conseguiu fazer um belo contraponto aos violões. O momento em que sozinho acompanhou Thiago Bianchi, ao relembrarem “I’m Yours” do Karma, banda da qual foram integrantes, foi um dos melhores momentos da noite.
A participação de Luis Mariutti foi outro momento especial. O baixista da primeira formação do Shaman subiu ao palco para tocar baixo em “In the Dark”, música gravada quando ele já não fazia mais parte do grupo. Ao final, discursou celebrando a união e fez Thiago Bianchi segurar o choro quando afirmou que “só existe um Shaman”.
A participação da cantora Ciça Moreira em “S.S.D. (Signed, Sealed and Delivered)” deixou a balada ainda mais bonita. Sua interpretação combinou perfeitamente com a melodia da música. Ela agradeceu a oportunidade de poder se apresentar ao lado de pessoas tão importantes mesmo tendo apenas dezessete anos. Um feito impressionante, mas Ciça estava à altura do desafio e aquele lugar lhe pertencia.
Foi pouco mais de uma hora de belo espetáculo, apesar de atípico. “Immortal” e “Origins” ao vivo são muito melhores do que em disco. A banda foi bem-sucedida em fazer com que arranjos memoráveis da bateria de Ricardo Confessori não fizessem falta. Certamente os problemas aqui listados não devem ser repetir em uma eventual nova data — e tomara que ela aconteça.
É louvável a iniciativa do projeto de resgatar discos que alguns insistem apagar da discografia de um dos principais nomes do heavy metal brasileiro. História é para ser contada, melhor ainda quando é por quem participou ativamente dela.
*Fotos de Gabriel Gonçalves. Mais imagens ao fim da página.
Finally Home – ao vivo em São Paulo
- Local: Blue Note
- Data: 31 de outubro de 2023
Repertório:
- Finally Home
- Immortal
- The Yellow Brick Road
- Ego
- Silent Lucidity (Queensrÿche)
- The Show Must Go On (Queen)
- I’m Yours (Karma)
- In The Dark
- SSD
- One Life
- Inferno Veil
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