John Lennon nos deixou tragicamente no dia 8 de dezembro de 1980, com apenas 40 anos de idade. O músico foi morto na entrada do apartamento em que morava em Nova York por Mark David Chapman, um “fã” obcecado dos Beatles que não concordava com algumas de suas atitudes.
Na época, Lennon havia acabado de retomar a carreira após uma pausa de alguns anos por um motivo nobre. Não à toa, estava com agenda bem cheia em seus dias finais e em seu último ato em vida, fez o que sabia fazer de melhor: criar música.
John Lennon retomou a carreira em seus dias finais
Em 17 de novembro de 1980, John Lennon lançou o álbum “Double Fantasy”, feito em parceria com sua esposa, Yoko Ono, e gravado entre os meses de agosto e outubro. O disco marcou o retorno do ex-Beatle ao mercado fonográfico após um hiato de cinco anos para cuidar do filho, Sean, o único do seu casamento com a artista japonesa.
Por conta do lançamento e algumas gravações, Lennon estava com agenda bem cheia e realizando diversas entrevistas em seus últimos dias. Uma delas ocorreu no dia 6 de dezembro para a BBC. Na conversa, o músico afirmou que durante o período em que deixou de trabalhar para cuidar de Sean, também pôde aproveitar seus dias em Nova York, onde passou a morar, como qualquer pessoa comum.
“Estou andando pelas ruas (de Nova York) nos últimos sete anos. Eu posso sair por essa porta agora e ir para um restaurante. Você sabe o quão incrível é isso? Ou poder ir para o cinema? As pessoas até aparecem e pedem autógrafos ou me dizem ‘oi’, mas não vão ficar me incomodando.”
Neste mesmo dia, quem chegou a Nova York foi Mark David Chapman. Ele, que tinha 25 anos na época, trabalhava como segurança no Havaí e era um “fã” obcecado dos Beatles. Além disso, vinha moldando sua personalidade segundo a de Houlden Caulfield, protagonista do livro “O Apanhador no Campo de Centeio”, do escritor J.D. Salinger. O personagem ficou conhecido por ser um adolescente rebelde que detestava hipocrisia, pessoas falsas e a superficialidade da sociedade.
Por conta da grande influência do livro em sua vida, Chapman logo passou a enxergar John Lennon justamente como um hipócrita (mesmo sendo um “fã” ardente da banda), por acreditar que o ex-Beatle dizia certas coisas em suas músicas, mas não as seguia em sua vida particular. Além disso, nunca gostou da famosa fala de Lennon, ainda nos tempos dos Beatles, de que ele e seus colegas eram mais “populares que Jesus”.
Por conta disso, Chapman tomou a decisão de matar John Lennon, o que planejou fazer a partir de outubro de 1980.
As últimas horas de John Lennon
Chegamos a 8 de dezembro de 1980, data em que Mark David Chapman tirou a vida de John Lennon. O ex-Beatle teve um dia bem cheio: participou de uma sessão de fotos com Yoko Ono, concedeu uma entrevista para uma rádio e retornou ao estúdio para finalizar a música “Walking on Thin Ice”, em que vinha trabalhando junto da esposa há alguns dias.
Lennon começou seu último dia saindo para tomar café com Yoko Ono e depois, deu um pulo no barbeiro para cortar o cabelo. Em seguida, retornou para o Dakota, o conjunto de apartamentos em que residia, onde ainda parou para conversar com alguns fãs que o aguardavam, algo que tinha o costume de fazer.
Quem também estava no local era o próprio Mark David Chapman, já disposto a executar seu plano nefasto. No entanto, acabou se distraindo e não viu o momento em que John Lennon parou para conversar com o público.
O músico retornou para seu apartamento, onde a fotógrafa Annie Leibovitz já o aguardava. Ele e Yoko Ono terminariam uma sessão de fotos iniciada na semana anterior. A ideia era que uma das imagens se tornasse capa da revista Rolling Stone, algo desejado por David Geffen, dono da Geffen Records, gravadora que lançou o álbum “Double Fantasy”.
Leibovitz sabia que precisava de uma foto especial para fazer de John e Yoko capa da publicação. Foi aí que a retratista e o ex-Beatle tiveram a ideia de colocá-lo nu, beijando a esposa – que estava vestida, pois não queria tirar a roupa – em posição fetal. Por conta do que aconteceria horas depois, a imagem acabou se tornando marcante.
A fotógrafa afirmou que se inspirou na própria capa do disco recém-lançado pelo casal para fazer a fotografia, por ver o amor refletido nela.
“Em 1980, eu sentia que o romance estava morto. Me lembro do quão simples e bonito aquele beijo foi na capa do disco e me inspirei bastante nele.”
O próprio John Lennon também adorou o resultado final da imagem, ao dizer que ela resumia perfeitamente o relacionamento do casal.
Leibovitz ainda tirou mais algumas fotos de Lennon, nas quais ele posou dentro de vários cômodos do apartamento. Assim que a sessão foi concluída, o ex-Beatle já estava indo conversar com uma equipe da rádio RKO, da cidade de São Francisco. A entrevista foi conduzida pelo radialista Dave Sholin e a repórter e produtora Laurie Kaye.
Segundo Sholin, a primeira coisa que Lennon fez foi deixar todos mais calmos para entrevista. Ele logo detalhou sua rotina diária para a rádio.
“Me levanto às seis (da manhã). Vou pra cozinha e pego um copo de café. Tusso um pouco e fumo um cigarro.”
Lennon afirmou que também tirava um tempo para assistir ao famoso desenho “Vila Sésamo” com Sean. O ex-Beatle disse que só deixava o filho assistir ao canal educativo PBS, que não tinha comerciais, algo que o músico dizia não gostar.
Não demorou muito para Lennon falar algo que deixou muita gente com frio na espinha por conta do que aconteceria mais tarde: reiterou seu desejo de morrer antes da esposa, pois ficaria sem rumo se o oposto acontecesse.
“Eu espero morrer antes de Yoko. Porque se a Yoko morrer (antes de mim), não saberia como sobreviver. Não conseguiria seguir em frente.”
O músico ainda reafirmou seu desejo de continuar trabalhando até morrer – sem imaginar que sua jornada acabaria horas mais tarde.
“Considero que meu trabalho não estará completo até eu morrer e ser enterrado, e espero que ainda leve muito, muito tempo.”
Laurie Kaye afirmou que Lennon estava muito feliz por ter passado os últimos anos de sua vida cuidando de Sean e ao lado de Yoko Ono e que já pensava em voltar a fazer turnês pelo planeta.
“John ainda queria continuar trabalhando e conversou sobre voltar a se apresentar. Ele estava disposto a ter uma vida cheia de felicidade e criatividade com o amor de sua vida.”
John Lennon e Yoko Ono deixaram o Dakota junto da equipe da rádio por volta das 17h, com destino ao famoso estúdio Record Plant, onde terminariam a mixagem de “Walking on Thin Ice”. Enquanto aguardavam a limusine, Mark David Chapman se aproximou do músico com uma cópia de “Double Fantasy” e pediu um autógrafo, e o ex-Beatle não hesitou em cumprir o desejo daquele que seria seu assassino.
O momento em que Lennon autografou o álbum de seu algoz foi registrado pelo fotógrafo amador David Goresh – que também tirou uma foto ao lado do ex-Beatle, naquele que seria o registro final do músico com vida.
John Lennon é assassinado
Já passava das 22h quando John Lennon e Yoko Ono concluíram a mixagem de “Walking on Thin Ice”. Segundo David Geffen, que acompanhou o trabalho naquela noite, a versão final da canção já era “melhor do que qualquer coisa que fizemos para ‘Double Fantasy’”. Sua empolgação foi tanta que já queria lançá-la pouco depois do Natal.
O casal até pensou em sair para jantar, mas enquanto deixavam o local, optaram por retornar ao Dakota com o intuito de dar boa noite para Sean, que estava apenas com a babá.
Lennon e Ono chegaram ao apartamento por volta de 22h45 e deixaram a limousine ainda do lado de fora do conjunto de apartamentos. Mark David Chapman continuava no local e assim que avistou o ex-Beatle, sacou um revólver calibre 38 e atirou seis vezes. Cinco disparos acertaram as costas do músico.
John Lennon ainda conseguiu dar alguns passos e avisar que havia levado tiros antes de cair no chão, derrubando várias fitas cassete que carregava – incluindo uma com a versão final de “Walking on Thin Ice”. Jose Perdomo, um dos porteiros do Dakota, correu e logo tirou o revólver das mãos de Chapman.
Em seguida, Perdomo gritou para Chapman se tinha ideia do que havia feito. O assassino respondeu calmamente:
“Eu acabei de atirar no John Lennon.”
Já o concierge Jay Hastings até tentou fazer um torniquete para ajudar Lennon, mas ao notar a gravidade dos ferimentos, apenas pegou sua jaqueta, cobriu o músico com ela e chamou a polícia.
A primeira dupla de policiais a chegar ao local foi Peter Cullen e Steven Spiro, apenas dois minutos após o chamado. Eles foram responsáveis por deter Chapman, que se sentou na calçada para ler “O Apanhador no Campo de Centeio” e não resistiu à prisão.
Herb Frauenberger e Tony Palma foram os policiais que chegaram logo em seguida. Ao notarem que as lesões de John Lennon eram sérias demais para aguardar a chegada de uma ambulância, decidiram levá-lo ao hospital e contaram com a ajuda dos colegas James Moran e Bill Gamble.
Gamble afirmou que perguntou ao músico se ele era John Lennon ou se sabia quem ele era. O ex-Beatle conseguiu apenas murmurrar e em seguida, perdeu a consciência.
Atendimento
John Lennon chegou ao Hospital Roosevelt pouco antes das 23h. Já estava sem pulso e não respirava.
As informações sobre como o ex-Beatle foi atendido são conflitantes, mas de qualquer forma, diversas artérias ao redor de seu coração foram virtualmente destruídas por conta dos tiros. Seria impossível salvá-lo.
Stephan Lynn, que era o diretor do Hospital Roosevelt na época, afirmou que se Lennon tivesse levado os tiros mesmo dentro de um hospital, não seria possível salvá-lo.
“Se ele tivesse levado os tiros no meio de uma sala de operação, com uma equipe de cirurgiões pronta para atendê-lo, ele não teria sobrevivido mesmo assim.”
As homenagens para o ex-Beatle
Em seu primeiro comunicado após a morte do marido, divulgado no dia seguinte, Yoko Ono afirmou que não faria um funeral para John Lennon. No entanto, pediu que na semana seguinte, os fãs fizessem uma vigília silenciosa em sua homenagem.
Também no dia 9 de dezembro, o músico foi cremado e suas cinzas foram jogadas no Central Park, em um local próximo ao conjunto de apartamentos onde morava.
Já a homenagem solicitada por Yoko Ono ocorreu no dia 14 de dezembro e diversos fãs do ex-Beatle ao redor do mundo fizeram 10 minutos de silêncio em sua homenagem. Em Nova York, onde morava, todas as rádios da cidade saíram do ar durante o momento.
A foto tirada por Annie Leibovitz, claro, se tornou capa da edição de janeiro de 1981 da Rolling Stone, que foi praticamente dedicada à vida e carreira de John Lennon. Além disso, as vendas de “Double Fantasy”, que não foram muito expressivas em seus primeiros dias, dispararam após a morte do músico.
A tragédia também fez com que muitos colegas de John Lennon lançassem canções em sua homenagem com o passar do tempo, como Bob Dylan, Elton John, David Gilmour, Paul Simon e seu ex-colega de Beatles George Harrison.
Por falar em canção, “Walking on Thin Ice” foi lançada em fevereiro de 1981 e por conta de todo o contexto, acabou se tornando um sucesso. Meses depois, Yoko Ono lançou o álbum “Season of Glass”, seu primeiro trabalho sem a presença do marido, que chamou a atenção pelo fato de sua capa conter os óculos de John Lennon manchados com seu sangue.
Muitos monumentos e memoriais em homenagem ao músico também surgiram, como foi o caso do Strawberry Fields (em menção à famosa canção dos Beatles escrita por Lennon), que fica no Central Park em Nova York.
O que aconteceu com Mark David Chapman
Mark David Chapman foi acusado de homicídio pela Justiça americano. O assassino, na contramão da orientação de seus advogados que pediram para ele alegar insanidade, assumiu sua culpa pela morte de John Lennon como forma de ser um “testamento de Deus”, segundo suas palavras.
Chapman acabou sentenciado a prisão perpétua, mas após 20 anos de cumprimento da pena, poderia pedir liberdade condicional bienalmente. No entanto, já teve o pedido negado 12 vezes pela Justiça americana desde então e continua detido na prisão Green Haven, em Nova York.
Durante os primeiros anos de sua prisão, Chapman negou inúmeros pedidos de entrevista, pois afirmou que não queria passar a impressão de que cometeu o assassinato para ter fama e notoriedade. No entanto, após uma década preso, mudou de ideia e aceitou conversar com a imprensa.
Uma de suas entrevistas mais famosas foi concedida para o famoso apresentador Larry King, da CNN. Na conversa, Chapman admitiu que estava muito confuso por conta da grande influência do livro em sua vida naquela época, demonstrou seu arrependimento pelo crime e admitiu que John Lennon não era a pessoa que ele imaginava ser.
“Eu me arrependo. Peço desculpas pelo que fiz. Agora percebo que acabei com a vida de um homem. Até então, ele era apenas a capa de um álbum para mim. Ele não existia, mesmo após me encontrar com ele mais cedo naquele dia quando autografou o disco para mim, o que fez graciosamente. E ele não era um hipócrita. Ele foi bem paciente, foi bem cordial e me perguntou se queria algo mais. Também me encontrei com o filho dele naquele dia. Se aquilo não foi suficiente para ver que ele era um ser humano, então não estava o enxergando como um. Apenas o via como uma celebridade de duas dimensões sem qualquer sentimento.”
Ao conversar com a comissão que negou seu pedido mais recente de liberdade condicional, ocorrida no final de 2022, o assassino de John Lennon mudou seu discurso e admitiu que matou o músico para ter fama a qualquer custo, mesmo sabendo que faria algo terrível.
“Sabia o que estava fazendo e sabia que era algo ruim. Eu sabia que era errado, mas eu queria tanto a fama que estava disposto a abrir mão de tudo para tirar uma vida humana. Tinha maldade em meu coração. Eu queria ser alguém e nada iria me impedir.”
Por fim, Chapman admitiu ter remorso de ter assassinado John Lennon e que entende o ódio que muitos fãs do músico sentem dele.
“Eu machuquei muitas pessoas em todos os lugares e se alguém me odeia por isso, está OK, eu entendo.”
*Texto construído com informações da Wikipédia, Smithsonian, Mental Floss, CNN e Sky News.
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