Nenhuma arte pode ser julgada meramente por suas vendas. É verdade que seria estupidez não levar os aspectos comerciais em consideração o tempo todo. Da mesma forma, também não dá para considerar métricas de popularidade como verdade absoluta e incontestável. Há casos em que o tempo faz justiça a algo que não foi devidamente apreciado quando saiu. Vide o caso do álbum de estreia do New York Dolls, lançado em 27 de julho de 1973.
À época, o quinteto reinava no underground roqueiro da Baixa Manhattan, na Nova York da qual emprestariam o nome. No entanto, a produtores musicais e gravadoras relutavam em promovê-los por causa de sua vulgaridade e extravagância no palco. A homofobia vigente também os colocava em uma posição desconfortável.
Mesmo assim, David Johansen (vocal), Johnny Thunders (guitarra solo), Sylvain Sylvain (guitarra rítmica), Arthur “Killer” Kane (baixo) e Jerry Nolan (bateria) decidiram que a melhor defesa era o ataque. Para a capa do seu primeiro disco, o grupo resolveu se maquiar de forma ainda mais exagerada do que costumava fazer normalmente. Era um “vocês vão ter que nos engolir” 24 anos antes de Zagallo na final da Copa América.
Coube à Mercury Records apostar suas fichas na banda, os colocando para gravar no Record Plant Studios, icônico espaço local. A produção ficou a cargo de Todd Rundgren, o que pode soar como uma combinação estranha. Afinal de contas, um músico conhecido por seu pop sofisticado trabalharia com músicos rudimentares, o punk antes de o punk existir.
Como não é de se estranhar, vários atritos aconteceram durante as sessões de gravação. Mesmo assim, os integrantes da banda sempre fizeram questão de reconhecer que o pai adotivo de Liv Tyler soube capturar o que eles eram ao vivo e traduzir para o disco. Aliás, falando em Aerosmith, não dá para deixar de citar que o engenheiro de som foi Jack Douglas, que depois produziria vários dos melhores discos de Steven Tyler, Joe Perry e companhia.
Ataque sônico
O resultado presente nas 11 faixas – 10 autorais e um cover para “Pills” de Bo Diddley – pode não impressionar atualmente. Porém, para os padrões do início dos anos 1970, foi um verdadeiro ataque sônico. O rock energético, berrado e distorcido se apresentava sem cerimônias, metendo o pé na porta e entrando sem pedir licença. Uma invasão de privacidade em tempos mais discretos e comportados, exatamente como os envolvidos almejavam.
Até por isso, “New York Dolls” foi um sucesso de crítica, mas não de público. O trabalho amargou um mero 116º lugar na Billboard 200, principal parada dos Estados Unidos. Porém, influenciou os grupos que vieram na sequência e fizeram o hard, punk e glam rock que ganharam alta popularidade e aceitação.
Reza a lenda que dificilmente os pioneiros serão os reconhecidos em qualquer área da vida. Afinal de contas, alguém precisa fazer o molde para que outros o sigam e alcancem o êxito. Aqui temos um dos casos mais exemplares no mundo do rock. Não à toa, bandas como Kiss, Ramones e o já citado Aerosmith reconhecem a influência da gangue novaiorquina.
No ano seguinte, o Dolls lançaria “Too Much, Too Soon”, que novamente naufragaria nas paradas. Um novo disco sairia apenas em 2006, quando já eram heróis devidamente reconhecidos por seus esforços. Atualmente, apenas David Johansen ainda está vivo dos integrantes da formação clássica.
New York Dolls – “New York Dolls”
- Lançado em 27 de julho de 1973 pela Mercury
- Produzido por Todd Rundgren
Faixas:
- Personality Crisis
- Looking for a Kiss
- Vietnamese Baby
- Lonely Planet Boy
- Frankenstein (Orig.)
- Trash
- Bad Girl
- Subway Train
- Pills (original de Bo Diddley)
- Private World
- Jet Boy
Músicos:
- David Johansen (voz, gaita, gongo)
- Johnny Thunders (guitarra solo, voz)
- Sylvain Sylvain (guitarra rítmica, piano, voz)
- Arthur “Killer” Kane (baixo)
- Jerry Nolan (bateria)
Músicos adicionais:
- Buddy Bowser (saxofone)
- Todd Rundgren (piano adicional, sintetizador Moog)
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