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Como “You Can’t Stop Rock ‘N’ Roll” mudou o destino do Twisted Sister

Primeiro disco da banda lançado por uma grande gravadora a levou do status de promessa a ícone — ao menos na Inglaterra

Quando o Twisted Sister finalmente teve a chance de gravar um disco, Dee Snider (vocais), Jay Jay French (guitarra), Eddie “Fingers” Ojeda (guitarra), Mark “The Animal” Mendoza (baixo) e o saudoso A.J. Pero (bateria) já estavam há dez anos lutando arduamente. Uma década de apresentações em casas noturnas de Nova York e todas as humilhações envolvidas foram incorporadas em suas letras e, em última instância, em seu modo de encarar as coisas.

O som do Twisted Sister era impregnado de raiva, frustração e agressividade — “um dedo do meio aos pais, professores e figuras de autoridade em geral”, como tão cirurgicamente coloca Garry Bushell, autor da primeira biografia do grupo, lançada em 1985. Não à toa, as plateias inglesas, empolgadas com a New Wave of British Heavy Metal (NWOBHM), abraçaram a banda com fervor.

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Foi também por isso que Pete Way (UFO) produziu seu álbum de estreia pela Secret Records, pequeno selo britânico lar de grupos punk como o The Exploited. Contando com a participação de “Fast” Eddie Clarke (então guitarrista do Motörhead) na música “Tear It Loose”, “Under the Blade” foi gravado em um caminhão estacionado em um celeiro no sul da Inglaterra, com amplificadores empilhados em fardos de feno.

A Secret Records lançou o disco em setembro de 1982, mas faliu logo em seguida, deixando a banda a ver navios.

No entanto, uma grande gravadora se interessou por ela.

A apresentação televisiva que começou tudo

Em uma última tentativa de conseguir um contrato de gravação, o Twisted Sister topou se apresentar no “The Tube”, um popular programa de rock da TV inglesa. Vitrine para muitas bandas emergentes dos anos 1980, o “The Tube” durou cinco temporadas (1982-1987) e teve entre seus apresentadores o pianista e band leader Jools Holland.

Vista por 14 milhões de pessoas, a performance televisionada em 17 de dezembro de 1982 seria um divisor de águas para a banda, conforme Dee Snider relata na autobiografia “Shut Up and Give Me the Mic” (Gallery Books, 2013):

“Nós estávamos tocando ‘It’s Only Rock ‘n’ Roll’ [dos Rolling Stones], e quando chegamos na parte em que o público participava no meio da música, revelei nossas armas secretas. A espera no bar, como se estivessem lá por acaso, Lemmy Kilmister e Brian Robertson [do Motörhead] invadiram o palco sob uma enorme ovação.”

Muita gente adorou, mas ainda não era o suficiente para Dee, que conta que um terço inteiro dos presentes não estava dando muita bola. Sem aviso prévio para a banda, a direção do programa ou a equipe técnica, ele decidiu fazer seu movimento surpresa:

“Observei que nem todos no estúdio estavam se empolgando, e se não estavam, como eu poderia esperar que as pessoas sentadas em suas casas assistindo pela TV estivessem? Ciente do desprezo que havia pelas bandas que usavam maquiagem naquela época, perguntei se eles não estavam se empolgando por causa da minha maquiagem. Parti para o ataque. Disse a eles que lhes daria um presente de Natal antecipado se eles nos dessem a empolgação deles em troca. Sinalizei para meu roadie trazer removedor de maquiagem e uma toalha. Disse à plateia que, se a maquiagem era o problema, era hora de tirá-la.”

Pegando um punhado generoso do produto, para surpresa de todos, o vocalista espalhou tudo em seu rosto. Em seguida, pegou uma toalha e removeu sua maquiagem o máximo que pôde. Olhando para a plateia, com o rosto suado, coberto de removedor, perguntou: “Agora, o que está impedindo vocês de se empolgarem?”.

“Com isso, a banda, Lemmy e Robbo iniciaram a parte final da música com participação total do público… e todos estavam pulando e curtindo! Encerramos sob uma ovação estrondosa. Foi incrível. Não apenas a plateia presente nos adorou, mas também o público que assistia em casa.”

Logo após o programa, o Twisted Sister recebeu três propostas de contrato de gravação. Entre elas, uma vinda de um cara que outrora havia lhe dito “não”.

Ver para crer, só para ter certeza

Ao longo de sua carreira, Phil Carson desempenhou um papel fundamental na descoberta e no sucesso de várias bandas e artistas. Irlandês de Belfast, o renomado executivo começou sua carreira na indústria musical na década de 1960, trabalhando inicialmente como promoter de shows e empresário.

Em 1972, Carson foi contratado pela Atlantic Records, onde se tornou uma figura-chave por várias décadas e trabalhou de perto com luminares, como Led Zeppelin e AC/DC, ajudando a impulsionar suas carreiras e alcançar sucesso internacional.

Ele já tinha ouvido falar do Twisted Sister, sabia que a banda era um fenômeno local na região conhecida como Tristate — a cidade de Nova York, seus arredores em Nova Jersey e áreas no norte de Connecticut — e que tinha na figura do olheiro Jason Flom um tremendo entusiasta. Contudo, precisou ver para crer que ali havia potencial.

Após a apresentação no “The Tube”, Carson deu especial atenção a uma demo que Flom lhe havia entregado. Ligou para Mark Puma, então empresário da banda, e asseverou seu interesse em levá-la para a Atlantic, desde que pudesse assistir a um show completo dela antes, só para ter certeza.

Três dias após a virada de jogo no “The Tube”, e assim que deixou o palco do Marquee Club, de Londres, o Twisted Sister recebeu o “sim” da Atlantic Records e voltou para os Estados Unidos afiliado a uma grande gravadora.

Encontrando o Santo Graal… em um banheiro

Uma das condições contratuais era de que a estreia em disco do Twisted Sister pela Atlantic Records deveria ser gravada na Inglaterra. Sendo assim, a banda cruzou o oceano de volta para a terra da Rainha.

Produzido por Stuart Epps (Vandenberg, Wishbone Ash), “You Can’t Stop Rock ‘N’ Roll” foi gravado no Sol Studios, de Jimmy Page. Mas não havia nada lá que entregasse que pertencia ao guitarrista do Led Zeppelin.

Outrora produtor de Elton John, Gus Dudgeon havia gastado 16 milhões de dólares construindo seu estúdio dos sonhos às margens de um rio. A baixa demanda pelo local no final dos anos 1970 o levou à falência. Page acabou comprando o imóvel por “míseros” três milhões.

Ao autor Martin Popoff, em depoimento presente no compêndio “The Top 500 Heavy Metal Albums of All Time” (ECW Press, 2004), Dee Snider se referiu ao lugar como “o melhor ambiente para se gravar”:

“Dava para ver quedas d’água da janela do alojamento. Lembro-me de dormir num quarto que tinha janelas que iam do chão ao teto, com um riacho correndo debaixo da minha cama. A sala de controle e as demais instalações davam vista para um campo aberto. Lembro-me de ver a neve caindo e cavalos correndo por lá.”

Snider e os demais nunca se encontraram com Page, que costumava aparecer somente no meio da noite quando todos já estavam dormindo. “Não havia evidências [da presença] dele, exceto algumas coisas que mudavam de lugar”, recorda-se o vocalista.

Embora fosse decorado ao melhor estilo inglês, a coisa mais legal de que Snider se lembra não tem nada a ver com o ambiente:

“Mendoza veio até mim um dia, dizendo: ‘Venha aqui. Olha só isso’. E abriu um lavabo, e lá estavam todas as fitas máster de todos os álbuns do Led Zeppelin, empilhadas de qualquer maneira. É o tipo de coisa que deveria estar trancada em um cofre ou algo assim. Mas aqui estavam elas, dentro de um lavabo; out-takes de ‘Heartbreaker’, ‘Stairway to Heaven’, ‘Whole Lotta Love’… cada maldita gravação já feita por eles jogada lá.”

“Sinto cheiro de sucesso!”

Enquanto “Under the Blade” tinha por característica uma abordagem agressiva e raivosa, o mais refinado “You Can’t Stop Rock ‘N’ Roll” teve como objetivo a criação de hits. Dee Snider estava se tornando um letrista melhor e a influência bandas como AC/DC e Judas Priest estava em plena ebulição no som.

Síntese dessa nova abordagem, “I Am (I’m Me)” foi escolhida como primeiro single. Ao ouvi-la, Phil Carson soube imediatamente se tratar de um hit: “Sinto cheiro de sucesso!”, disse ele ao grupo.

A fim de assegurar uma posição alta nas paradas, a Atlantic Records lançou “I Am (I’m Me)” em três versões diferentes: compacto simples, compacto duplo e picture disc, cada uma com lados B diferentes.

A ideia era simples: fazer com que os fãs quisessem ter acesso a todas as músicas e, assim, comprassem as três versões do single, triplicando as vendas e impulsionando-o nas paradas. Deu certo, segundo Snider:

“Como prevíamos, ‘I Am (I’m Me)’ pulou diretamente para o Top 20 [na 18ª posição], colocando-nos no radar do megaprograma musical semanal Top of the Pops e o lendário DJ de heavy metal Tommy Vance estreou o single em seu programa nacional de rádio semanal da BBC.”

Depois de “I Am (I’m Me)”, foi a vez de “The Kids Are Back” ficar entre as 40 mais (no número 32) e da faixa título, a qual ganhou um videoclipe dirigido por Arthur Ellis — o mesmo diretor de “Rainbow in the Dark”, do Dio — conquistar um posto no top 50 (43ª posição).

Disco de ouro? Aguarde mais 12 anos

Estando “You Can’t Stop Rock ‘N’ Roll” entre os álbuns mais vendidos da Inglaterra, o Twisted Sister virou mania nacional, estampando pôsteres e capas de revistas especializadas em música no país.

A banda aproveitou a maré favorável no Velho Continente se apresentando em alguns dos principais festivais de verão do hemisfério norte, como o Monsters of Rock, que além da edição inglesa em agosto de 1983, teve três datas na Alemanha em setembro.

Pena que a realidade nos Estados Unidos se revelou totalmente oposta: não obstante a quantidade de shows realizados em casa, o mais alto que “You Can’t Stop Rock ‘N’ Roll” chegou na Billboard 200 foi o número 130. A título de curiosidade, o disco de ouro (500 mil cópias vendidas) só viria em 1995.

Mas o estouro na terra natal viria uma década antes, com “Stay Hungry” (1984), um dos álbuns definitivos do hard rock dos anos 80.

Twisted Sister — “You Can’t Stop Rock ‘N’ Roll”

  • Lançado em abril de 1983 no Reino Unido e 27 de junho de 1983 nos Estados Unidos pela Atlantic
  • Produzido por Stuart Epps

Faixas:

  1. The Kids Are Back
  2. Like a Knife in the Back
  3. Ride to Live, Live to Ride
  4. I Am (I’m Me)
  5. The Power and the Glory
  6. We’re Gonna Make It
  7. I’ve Had Enough
  8. I’ll Take You Alive
  9. You’re Not Alone (Suzette’s Song)
  10. You Can’t Stop Rock ‘n’ Roll

Músicos:

  • Dee Snider (voz)
  • Jay Jay French (guitarra, backing vocals)
  • Eddie “Fingers” Ojeda (guitarra, backing vocals)
  • Mark “The Animal” Mendoza (baixo, backing vocals)
  • A.J. Pero (bateria)

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Marcelo Vieira
Marcelo Vieirahttp://www.marcelovieiramusic.com.br
Marcelo Vieira é jornalista graduado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA), com especialização em Produção Editorial pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Há mais de dez anos atua no mercado editorial como editor de livros e tradutor freelancer. Escreve sobre música desde 2006, com passagens por veículos como Collector's Room, Metal Na Lata e Rock Brigade Magazine, para os quais realizou entrevistas com artistas nacionais e internacionais, cobriu shows e festivais, e resenhou centenas de álbuns, tanto clássicos como lançamentos, do rock e do metal.

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