Um lucrativo acordo para reunir a formação MkII do Deep Purple outra vez — que resultou no altamente bem-sucedido álbum “Perfect Strangers” (1984) — tirou Ian Gillan do Black Sabbath. O plano seguinte era que um completo desconhecido ocupasse o papel de vocalista.
Sabendo disso, Spencer Proffer, que tinha acabado de ajudar o Quiet Riot a estourar ao produzir “Metal Health” (1983), compartilhou o que vislumbrava para o veterano grupo: sucessos nas rádios e clipes na MTV. Daí, assinou contrato para produzir o próximo álbum da banda.
A ideia de Proffer era ele mesmo escolher o novo vocalista e presentear Tony Iommi, Geezer Butler e o baterista da vez, Bev Bevan, com uma série de canções radiofônicas compostas pelos canadenses do Kick Axe.
Por algum motivo, o produtor achou que a voz estridente do estadunidense Ron Keel poderia ser uma boa opção.
Proclamado vocalista do Black Sabbath
Ron Keel dormia num colchonete quando Spencer Proffer telefonou para explicar-lhe a situação e oferecer-lhe a oportunidade de fazer um teste para o Black Sabbath. Com produção do futuro baixista de Slaughter e Vinnie Vincent Invasion, Dana Strum, o vocalista gravou algumas das músicas pré-selecionadas para o novo álbum do Sabbath.
Spencer adorou a gravação, mostrou-a para a banda e instruiu Ron a se encontrar com Tony e Geezer em seu hotel em Los Angeles.
No decorrer de alguns dias, foram vários os encontros entre os três. De acordo com o vocalista em sua autobiografia “Even Keel: Life On The Streets Of Rock & Roll” (Wild West Media, 2014), ainda inédita no Brasil, “deu liga”:
“Tony me disse com todas as letras que eu era o novo vocalista do Black Sabbath e me deu uma lista de músicas para aprender. Don Arden, o empresário deles, deu ordens expressas para que eu não dissesse nada a ninguém; a notícia era estritamente confidencial e o anúncio seria feito juntamente com o lançamento de uma nova foto da banda comigo.”
Furo de reportagem
Embora o cantor estivesse com sua própria banda — o Steeler, que já havia feito alguns shows usando o nome Keel —, a oportunidade de entrar naquela que inventou o heavy metal era algo que ninguém em sua posição poderia recusar.
Ele sentou-se com os guitarristas David Michael Phillips e Marc Ferrari, o baixista Kenny Chaisson e o baterista Bobby Marks e lhes disse que estava ingressando no Sabbath. Aproveitou para instruí-los a não dizerem nada para ninguém.
Nem dois minutos depois, a novidade estava no rádio e na MTV.
“Ninguém nunca me acusou de vazar a notícia, e o Black Sabbath e seu empresário não pareceram se importar.”
Pego no fogo cruzado… ou não
Perkins Palace, Pasadena, 7 de abril de 1984. O show de despedida do Steeler. Entre as mais de 1,7 mil pessoas presentes, Tony Iommi, sua então namorada Lita Ford e Geezer Butler.
Os três vão aos bastidores antes do show, confraternizam com a banda e desejam boa sorte a Ron, que sobe ao palco a toda, comandando um espetáculo triunfante.
Para nunca mais ouvir uma só palavra de ninguém do Black Sabbath.
Reza a lenda que a banda teria rompido com Spencer Proffer. Ron suspeita ter sido pego no fogo cruzado, mas não tira de si parte da culpa:
“Até hoje não sei se foi um lance contratual ou meu desempenho no palco, ou uma combinação de ambos, que me custou a vaga. Sabbath e Keel eram duas bandas muito diferentes entre si. Definitivamente havia um elemento de “festa” [no Keel] que não tinha nada a ver com o Black Sabbath, e talvez eles tenham pensado que esse era o único papel que eu poderia desempenhar. Se tivéssemos a chance de dividir o palco uma vez que fosse, não tenho dúvidas de que pelo menos teria gravado um disco e feito uma turnê com eles.”
Um pequeno grande equívoco
A versão de Tony Iommi para os acontecimentos, como relata em sua autobiografia “Iron Man: Minha Jornada com o Black Sabbath” (Planeta, 2013), é completamente diferente da de Ron Keel.
Iommi conta que, em Los Angeles, ele e Geezer ouviram caixas e mais caixas de fitas enviadas por inúmeros jovens que sonhavam em entrar para o Black Sabbath — entre eles, Ron Keel. Os dois acharam o rapaz muito bom e saíram para jantar e beber com ele.
Lá pelas tantas, Iommi e Butler descobriram que a voz de que tinham gostado não era a de Ron. O vocalista, supostamente, teria enviado uma fita com a voz dele de um lado e a de um cantor diferente do outro — coisa que Keel nega:
“Posso garantir que não foi o caso. Em primeiro lugar, se qualquer outro cantor tivesse gravado essas músicas, eu teria ficado sabendo. Em segundo lugar, o ego de Spencer era muito grande para dar à banda o direito de escolher – seria totalmente nada a ver oferecer a eles duas opções de vocalistas diferentes.”
Tudo certo em seu lugar
Depois de mais algumas semanas buscando, o Black Sabbath anunciaria David Donato como seu novo vocalista. Sua estada, contudo, não seria das mais longas.
O supracitado show de despedida do Steeler acabou somente aposentando o nome. Como Keel, o grupo lançaria seu primeiro álbum, “Lay Down the Law”, em novembro de 1984.
Hoje sabe-se que uma das músicas compostas pelo Kick Axe para o Sabbath, “Running Wild in the Streets”, acabou entregue por Proffer ao W.A.S.P. e incluída no álbum “The Last Command”, de 1985.
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