Como foi criada a persona Alice Cooper, bem diferente de Vincent Furnier

O homem por trás do personagem é Vincent Damon Furnier, sujeito bem tranquilo que abandonou vícios na década de 1980

Alice Cooper é um dos maiores astros do hard rock e o grande nome do chamado shock rock. Foi o responsável por elevar a teatralidade na música a níveis que, até então, eram inimagináveis.

O homem por trás do personagem é Vincent Damon Furnier. Trata-se de um sujeito bem tranquilo, que abandonou os vícios ainda na década de 1980 e, desde então, dedica-se à família e a hobbies como jogar golfe.

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Como um cara tão tranquilo consegue incorporar, ainda nos dias de hoje, uma das personas mais controversas da história do rock? Com uma separação bem consciente de quem é Alice Cooper e quem é Vincent Furnier.

Como ele mesmo explicou, em entrevista ao site ‘The Creative Independent’, em 2017.

“Projetei Alice para ser meu rockstar favorito. Ele pode viver para sempre. Quando eu me visto de Alice para uma nova turnê, eu pergunto: ‘o que eu gostaria de ver meu rockstar favorito usando?’. É divertido. Nunca cansa. Demorou até pegar entre as pessoas, mas assim que pegou, virou Vincent Price ou Christopher Lee.”

De fato, demorou até que Alice Cooper conseguisse algum sucesso. O personagem estava ligado a uma banda, também chamada Alice Cooper, que existia desde o fim da década de 60.

O nascimento de Alice Cooper

Especificamente em 1968, o grupo, que se apresentava como Nazz, mudou o nome para Alice Cooper. Dois motivos justificaram a alteração: já existia uma banda – com Todd Rundgren – chamada Nazz e Vincent Furnier achava que tudo aquilo precisava ficar mais interessante.

Naqueles tempos, era quase ultrajante estar diante de uma banda chamada Alice Cooper, especialmente porque o vocalista interpretava o tal Alice: um cara fingindo ser uma mulher, assassina, com direito a roupas, maquiagens e presença de palco fazendo referência a isso. Seria o mesmo tipo de gente que se choca hoje em dia com drag queens? Talvez.

A construção da persona Alice Cooper passou muito pelos filmes, com duas menções especiais: o terror “O Que Terá Acontecido a Baby Jane?” (1962) e o sci-fi “Barbarella” (1968). Surgiram, daí, itens como a maquiagem manchada em torno dos olhos e as luvas pretas, bem como outros acessórios.

Mas não bastava só isso – era preciso ter músicas boas. E eles aprenderam na prática, pois os primeiros álbuns não eram tão bons.

“Teatralidade é legal, mas também é necessário entrar bons discos. Ensaiávamos 8 horas por dia, sendo 7 horas de música e uma hora de movimentos no palco e detalhes visuais. As pessoas sempre acham que é o contrário. Nos anos 70, percebemos que disputaríamos lugar com o Led Zeppelin, então, sabíamos que precisávamos ter um show tão bom quanto o deles”, relembrou Alice, ainda ao ‘The Creative Independent’.

Ter uma persona como refúgio também era interessante para o tal Vincent Furnier. “Vim daquele mundo do shock rock onde eu podia falar o que quisesse. Se alguém me questionasse por isso, a explicação era: ‘eu não falei isso, Alice falou… não sou responsável por isso, não o controlo’. Era libertador. Claro, isso mudou com o tempo, pois era fácil chocar uma plateia nos anos 70, sem internet. Tudo se passava no ‘boca a boca’. Tudo que você fazia, virava lenda urbana. As pessoas queriam ficar chocadas, pois Alice era o anti-establishment”, explicou.

O sucesso e a diferenciação da persona

Com o tempo, o nome Alice Cooper ficou cada vez mais ligado ao vocalista. A banda chegou ao fim em 1975, quase um ano após seu último show, em 8 de abril de 1974, no Rio de Janeiro, encerrando uma turnê no Brasil onde os shows eram confundidos com macumba. Com o fim do grupo, Vincent Furnier passou a usar a nomeação Alice Cooper para sua carreira solo.

Foi quando o sucesso se multiplicou. A banda já havia conquistado bastante repercussão com álbuns do porte de ‘Billion Dollar Babies’ (1973) e ‘School’s Out’ (1972), mas ‘Welcome to My Nightmare’ (1975), o primeiro de Alice Cooper solo, amplificou todo esse êxito. Entre altos e baixos, Alice teve uma carreira de glórias, inclusive com “renascimentos”, como o disco ‘Trash’ (1989), que emplacou o hit ‘Poison’.

Mesmo estando tão ligado ao personagem, Vincent Furnier diz que não confunde as coisas. “Quando estou com meus netos, se aparece um vídeo do Alice Cooper, eles falam ‘olha o Alice Cooper!’ (em vez de ‘olha você’). Eles sabem que eu interpreto Alice Cooper, mas não sou ele. Tive que trabalhar essa distinção para eles”, afirmou, em entrevista à ‘SiriusXM’ em julho deste ano.

As pessoas em torno de Alice – ou, melhor, de Vincent – confirmam que são duas “pessoas” diferentes. Em entrevista exclusiva concedida a mim em 2017, o guitarrista Ryan Roxie, que toca com o vocalista há anos, explicou como ocorre essa distinção entre o homem e o personagem.

“O Alice Cooper que você conhece fora do show é totalmente diferente daquele no palco. O Alice do palco é inconsequente, matador, uma ameaça para a sociedade. Fora do palco, é alguém com quem você quer sair para conversar, jogar golfe – algo que faço frequentemente com ele – e por aí vai. Fora do palco, Alice sequer tem um ego, é muito humilde. Já no palco, você fica com medo dele (risos). E gosto do fato de ele ser gigante nas apresentações, mas ser uma pessoa incrível fora dele”, explicou Roxie.

Trabalhar pensando em Alice Cooper

No fim das contas, o controle em torno de Alice Cooper é tão pleno que Vincent Furnier costuma trabalhar seu repertório pensando no que se encaixaria na proposta do personagem. “Frequentemente, componho uma música que não tem nada a ver com Alice. Quando acontece, mando para alguém, tipo Tom Petty. Tenho umas 300 músicas gravadas na carreira; em contrapartida, há outras 1,5 mil que compus e foram jogadas fora por esse motivo”, comentou, já ao ‘The Creative Independent’, ao falar sobre seu processo criativo.

Só que pensar como o personagem não impediu Alice de experimentar e ousar durante a carreira. Entre mais de 25 álbuns lançados, tanto em carreira solo quanto com a banda nos primórdios, ele flertou não só com o hard rock dos anos 70 e 80, como, também, com o heavy metal, o rock/metal industrial, a new wave e o art rock, só para citar algunas vertentes.

“Tudo isso te ajuda a manter-se criativo. Faz com que você siga em frente o tempo todo. Você precisa fazer coisas ruins para chegar a algo bom. Quando você termina de fazer uma boa música, você consegue sentir isso”, afirmou.

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Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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