Pearl Jam soa vívido e relevante no novo álbum ‘Gigaton’; ouça e leia resenha

O Pearl Jam lançou, nesta sexta-feira (27), seu 11° álbum de estúdio. O trabalho, intitulado “Gigaton”, chega por meio da Monkeywrench Records/Republic Records (Estados Unidos) e Universal Music Group (internacionalmente).

Primeiro trabalho de estúdio desde “Lightning Bolt” (2013), “Gigaton” tem produção de Josh Evans e do próprio Pearl Jam. A capa é do fotógrafo, cineasta e biólogo Paul Nicklen, com base na foto “Ice Waterfall”, tirada em Svalbard, na Noruega. Tanto a imagem quanto o título do disco citam uma medida usada por cientistas para medir o degelo na Antártica e Groenlândia.

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Em material de divulgação, o guitarrista Mike McCready explicou que “Gigaton” demandou uma “longa jornada”. “Foi um percurso obscuro e confuso por vezes, mas também é empolgante e experimental para a redenção musical. Colaborar com os colegas em ‘Gigaton’ me deu mais amor, consciência e conhecimento da necessidade por conexão humana nesses tempos”, disse.

A turnê que o Pearl Jam faria para divulgar “Gigaton”, iniciando em 18 de março e concluindo em 19 de abril, nos Estados Unidos, teve de ser adiada em decorrência do novo coronavírus. Um evento que reproduziria o álbum na íntegra em salas de cinema, inclusive no Brasil, foi cancelado.

Ouça “Gigaton” a seguir, via Spotify ou YouTube (playlist), conferindo a resenha / review logo abaixo:

Resenha / review: Gigaton mostra Pearl Jam vibrante, ácido e entre pauladas e baladas

Um mês antes de “Gigaton” ser lançado, vi alguns fãs na internet dizendo que o álbum já era o pior de toda a carreira do Pearl Jam. O motivo? O primeiro single, “Dance of the Clairvoyants”, que carrega sonoridade bem diferente: um pouco mais experimental, a faixa transita por gêneros como new wave, alternativo e até um pouco do funk.

A internet acelerou tanto o ritmo das pessoas que um álbum já é criticado antes mesmo de ser lançado – e por causa de apenas uma música. Espero que essa avaliação precipitada não impeça esses fãs de curtirem “Gigaton”, que, ao contrário dessa primeira impressão, é um bom trabalho.

A mensagem que o disco carregaria já está presente logo na capa: o Pearl Jam está empenhado em criticar as mudanças climáticas causadas pela ação humana. Um alvo determinado e até citado nominalmente em uma das músicas é Donald Trump, presidente dos Estados Unidos que, nos últimos anos, tomou algumas medidas em desacordo com o conceito de preservação ambiental.

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O Pearl Jam é movido a essa acidez. A banda trouxe seus melhores trabalhos em meio a dilemas e debates sobre questões que vão além da música – que, como todo tipo de manifestação artística, pode se tornar um ato político. Em “Gigaton”, não é diferente, pois além dos conflitos vivenciados na atualidade, a banda precisou superar a inesperada perda de Chris Cornell, vocalista do Soundgarden, que, conforme eles próprios já revelaram, atrasou a produção.

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Curiosamente, as duas primeiras faixas não se empenham tanto no conceito que capa e título de “Gigaton” propõem, embora demonstrem que há sangue pulsando nas veias do Pearl Jam. A boa abertura “Who Ever Said” alterna entre versos fortes, refrães grudentos e momentos mais climáticos, com quebra de ritmo na segunda metade. A agitada “Superblood Wolfmoon”, divulgada antecipadamente como segundo single do disco, é movida pela rebeldia dos tempos de “Ten” (1991), mas com uma veia alternativa. Matt Cameron se destaca em ambas as canções.

A já mencionada “Dance of the Clairvoyants” se aprofunda nas críticas que movem o álbum, com versos do calibre de “No one man can be greater than the Sun” (“Nenhum homem pode ser maior que o Sol”) e “Expecting perfection leaves a lot to ignore” (“Esperar a perfeição faz com que muitas coisas sejam ignoradas”). A pegada new wave, também citada anteriormente, pode gerar estranheza, mas a faixa ganha sentido dentro do disco.

Na sequência, “Quick Escape” está mais alinhada à sonoridade do Pearl Jam nos últimos álbuns. Os riffs são mais intrincados, mas temos, aqui, outro refrão chamativo. A composição busca refletir sobre os danos causados ao meio ambiente, já que vários países e regiões são visitados pelo interlocutor em busca de “um lugar que o Trump ainda não tinha ferrado” (“a place Trump hadn’t fucked up yet”). Mike McCready brilha com solo ao fim, bem acompanhado pelo baixo de Jeff Ament.

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Primeira lenta do disco, “Alright” é mais reflexiva. Alterna por passagens com e sem percussão, mas é guiada por uma melodia de sintetizador e pela voz de Eddie Vedder. Poderia ser mais curta, já que soa repetitiva, mas, novamente, o refrão convence. “Seven O’Clock”, a seguir, é a faixa mais longa do álbum – e uma das melhores. Balada rítmica, com groove pulsante, traz os dois grandes predicados de Eddie Vedder: o talento ao criar letras e a voz que, praticamente, não envelhece. Seja pela tonalidade ou pela interpretação, lembra bastante “Daughter”, do clássico “Vs.” (1993).

O Pearl Jam volta a pisar no acelerador com as duas seguintes: “Never Destination”, que alia agressividade a uma simplicidade melódica quase punk rock, e “Take The Long Way”, que preserva essa mesma essência, mas experimenta um pouco mais e chama atenção pela bateria flertar com alguns elementos, ainda que tímidos, do hardcore.

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Buckle Up”, mais uma faixa lenta, é uma boa canção, apesar de ser guiada pela mesma melodia. Os vocais quase sussurrados de Eddie Vedder são o destaque. “Comes Then Goes”, também na pegada de balada, traz apenas voz, um violão e um discreto backing vocal. Outra que poderia ser mais curta – é a segunda mais longa da tracklist –, já que apresenta poucas variações e é bem minimalista, mas também soa convincente.

Com instrumentos de corda diferentes, “Retrograde” é uma das mais belas canções da tracklist e, talvez, de toda a carreira do Pearl Jam. Apesar da melodia cativante, a letra retoma a acidez de outrora ao criticar, novamente, a ação humana contra o meio ambiente. Uma ode à evolução, contra o retrógrado. O fechamento fica por conta da contemplativa “River Cross”, que embarca nos experimentos e chega a flertar com a world music em seu instrumental.

Sei que, até hoje, existem fãs do Pearl Jam – ou, melhor, admiradores mais distantes – que esperam um álbum como “Ten”. Mais uma vez, não é o que a banda apresenta. Ainda bem. A curva de evolução desse grupo ao longo da carreira é algo raro dentro do rock, justamente, por não abrir mão da autenticidade e fugir do óbvio. O inesperado, inclusive, ocasiona alguns tropeços no meio do caminho, mas os grandes acertos ofuscam os pequenos erros.

O saldo desse novo disco é positivo e um elemento é determinante para isso: as músicas mais lentas, que predominam a tracklist e, em alguns casos, são as melhores. Trata-se de um trabalho mais reflexivo, diferente do rebelde “Lightning Bolt” e de outros momentos em que o Pearl Jam só queria plugar os instrumentos e tocar.

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Ainda é difícil apontar onde “Gigaton” se posiciona na discografia, mas o álbum mostra que o Pearl Jam está vivo e ainda tem (muito) o que dizer, seja por letras, riffs ou passagens melódicas que podem ser intensas ou levíssimas. Fugindo de análises mais pretensiosas, esse trabalho evidencia que a produção criativa do Pearl Jam segue necessária para o mundo.

“Gigaton” está representado na playlist de lançamentos, atualizada semanalmente. Siga e dê o play:

Confira, abaixo, a tracklist de “Gigaton”:

1. Who Ever Said
2. Superblood Wolfmoon
3. Dance Of The Clairvoyants
4. Quick Escape
5. Alright
6. Seven O’Clock
7. Never Destination
8. Take The Long Way
9. Buckle Up
10. Come Then Goes
11. Retrograde
12. River Cross

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Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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