“Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, oitavo trabalho de estúdio dos Beatles, está, sem dúvidas, entre os álbuns mais importantes da história. É citado assim por especialistas, críticos musicais e os próprios músicos – da época ou posteriores -, que se influenciaram pelo que foi feito.
O impacto causado por “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” é enorme. E não só pelo produto musical em si, mas por todas as inovações que o cercaram, envolvendo produção, composição e até promoção – incluindo a parte gráfica.
Para mim, o que se destaca em todo esse bolo é a produção. Com o que foi oferecido na época, “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” teve, simplesmente, o melhor trabalho possível na área sonora. Para isso, tanto o produtor George Martin – o chamado “quinto beatle” – quanto o engenheiro de som Geoff Emerick tiveram importância fundamental.
Os “feitos” dos Beatles por aqui
Houve ineditismo em boa parte dos procedimentos de “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”. Martin e Emerick moldaram o som por meio do processamento de sinal, de forma analógica, para modificar a transmissão. Isso incluiu aplicação de compressão dinâmica, reverberação e de limitação de sinal.
Outras técnicas utilizadas foram conexão direta (por meio de unidade DI), ambiophonics (para realçar o som estéreo) e controle de diapasão (de afinação, com aumento ou redução de tonalidade). Além disso, ainda há o automatic double tracking (ADT), uma técnica cujo sistema tem gravadores de fita, que criam duplicações sonoras simultâneas.
ADT, um caso a parte
O ADT é um caso a parte. Já se sabia que o uso de fitas multi-faixa, para gravação de vocais principais duplos, produzia som aprimorado. Só que antes do ADT, era necessário gravar as trilhas vocais duas vezes, de forma praticamente idêntica, o que é bem complicado.
Para isso, a técnica do ADT foi criada por engenheiros de som do Abbey Road Studios, ainda para as gravações de “Revolver”. O uso se aprimorou em “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, dado o seu tom experimental.
Casos específicos em “Sgt Pepper’s Lonely Hearts Club Band”
Vale, ainda, destacar o uso de damping para a bateria de Ringo Starr, em especial, na música que dá nome ao disco, “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”. A trilha foi aprimorada não só com o damping, mas, também, com o posicionamento dos microfones, de forma estratégica, próximos ao instrumento.
O efeito gerado, para aquela época, era único. Basicamente, atingiu-se o objetivo do som estéreo: provocar uma sensação “tridimensional”, como se a banda estivesse tocando ao vivo dentro de seus fones de ouvido.
A orquestrada “A Day In The Life” também merece menção. Nela, George Martin sincronizou um gravador de quatro faixas, tocando as camadas de apoio dos Beatles com outro, gravando a orquestra. A textura sonora gerada por esse procedimento tem um resultado raro, até mesmo com as opções digitalizadas dos dias de hoje.
Ainda que não seja uma grande técnica, deve-se citar, ainda, que não há pausa entre as músicas de “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”. Os intervalos de faixa a faixa foram retirados e, no lugar, dois crossfades foram utilizados para entrelaçar as canções.
A ideia era que o disco fosse uma representação de um show: ininterrupto, sem intervalos. E isso também colaborou com a proposta conceitual de “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, que tem uma história guiando por trás.
O investimento dos Beatles em “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”
Tudo isso custou tempo – e dinheiro – para os Beatles e os profissionais da Abbey Road Studios. Estima-se que cerca de 700 horas de trabalho foram gastas em “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”. Para efeito de analogia, são cerca de 29 dias ininterruptos de serviços prestados.
Evidentemente, o processo demorou bem mais do que isso para que o álbum ficasse pronto, já que ninguém trabalhou 24 horas por dia, sem parar. Da primeira sessão de gravação à última de finalização, foram gastos mais de quatro meses (entre 6 de dezembro de 1966 e 21 de abril de 1967).
O resultado pesou nos bolsos da gravadora: o processo todo custou 25 mil libras, bem diferente das 400 libas cobradas por “Please Please Me”, primeiro disco de estúdio dos Beatles.
Entretanto, não há dúvidas de que o dinheiro foi bem investido. “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” deu início à era das superproduções no rock, que foi de encontro à arte em estado mais puro.
– Beatles: 50 anos de “Sgt. Pepper’s”, o disco-guia da música contemporânea
* Escrevi esse texto originalmente para o Whiplash.Net Rock e Heavy Metal.