O thrash metal é um gênero peculiar. Boa parte de suas grandes bandas tiveram mudanças consideráveis em suas sonoridades ao longo dos anos. Metallica, Megadeth, Anthrax, Slayer, Testament, Annihilator… todos esses grupos se apresentam diferentes ou mudaram algo em algum momento de suas discografias. Ainda assim, somente os grandes expoentes costumam ser alvos de crítica.
É o caso do Sepultura, que não é tão grande como um Slayer em termos de popularidade a nível mundial, mas, no Brasil, é a referência. Trata-se da banda de metal mais conhecida do país. Há 20 anos, passou por uma mudança de formação que até hoje gera polêmica – a saída de Max Cavalera para a entrada de Derrick Green.
Poucos se lembram que o Sepultura já era criticado, mesmo que por uma minoria nada barulhenta, a partir de “Chaos A.D.” (1993). Diziam que a banda havia se “vendido” e estava se “adequando” aos padrões da época, ao acrescentar elementos do groove metal em sua sonoridade. Basta procurar por textos de veículos especializados da época – no Brasil, claro, pois o grupo era aclamado no exterior. Tais críticas ganharam força após a saída de Max Cavalera, pois um novo vocalista abre brechas para comentários mais fortes. Mas isso não é novidade na trajetória dos caras.
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É fato que, nos últimos 20 anos, o Sepultura não lançou só discos marcantes. Há alguns trabalhos mais fracos a partir de “Against”. Contudo, é na base do “não ouvi e não gostei” que muitas críticas aos discos lançados pelo Sepultura com Derrick Grenen nos vocais se concretizam.
“Machine Messiah” é mais uma oportunidade para que os detratores prestem atenção no que o Sepultura é capaz de fazer. E, é claro, também é um presente musical dos bons para aqueles que admiram as formações mais recentes.
Em comparação a seu antecessor, “The Mediator Between Head and Hands Must Be the Heart”, “Machine Messiah” tem uma pegada musical mais orientada ao groove do que ao death metal, que foi a maior surpresa do disco lançado em 2013. Além disso, há ares de sofisticação, seja pelas letras, pelos vocais menos gritados de Derrick Green ou até por tímidos momentos guiados por violinos.
“Machine Messiah” não representa, de forma alguma, qualquer dissociação com o trabalho que o Sepultura tem apresentado, especialmente, na última década. É uma continuação natural de discos que já apresentavam boa parte de tais características. Entretanto, o ar levemente experimental e a própria batuta do bom produtor sueco Jens Bogren fizeram com que o grupo soasse renovado.
A faixa título, que abre a tracklist, já adianta um pouco como será o disco. Em seus quase seis minutos de duração, a música passa por momentos arrastados, trechos cantados em vozes clean e partes que destacam as guitarras de Andreas Kisser. Canção incrível, diga-se de passagem. O quase hardcore “I Am The Enemy”, na sequência, é a antítese: batida rápida, vocais berrados e riffs pesados. Eloy Casagrande, monstruoso, se destaca aqui.
“Phantom Self” começa em uma pegada quase nordestina, mas logo descamba para um som pesado e repleto de groove. Há passagens com violinos em alguns momentos. Um pouco mais arrastada, “Alethea” é toda guiada pelos movimentos da bateria. Há poucos momentos de voz na faixa.
Anunciada como um resgate à música nordestina, a instrumental “Iceberg Dances” é boa, mas poderia impressionar mais, especialmente no quesito inventividade. A passagem com órgão hammond é o momento mais inesperado. “Sworn Oath”, com seu pano de fundo orquestrado, é um dos grandes destaques do disco. A sofisticação dessa faixa é algo fora de série.
“Resistant Parasites”, na sequência, mistura um pouco da pegada sofisticada desse disco com a ideia de metal extremo presente no antecessor, “The Mediator…”. Os vocais de Derrick Green transpiram desespero. “Silent Violence”, um thrash à Sepultura, coloca o pé no acelerador com êxito, com uma quebra de ritmo e boas passagens de guitarra em seu miolo.
“Vandals Nest” preserva a velocidade rítmica, mas com trechos em que Green canta de forma limpa. “Cyber God” fecha a tracklist original na mesma pegada da faixa que dá nome ao álbum: vocais clean e gritados em alternância aliados a um instrumental trabalhado, bem arranjado e também com mudanças “climáticas”. A pesada “Chosen Skin” e o inusitado cover para “Ultraseven No Uta”, faixa de abertura do tokusatsu japonês Ultraseven, são as bônus.
O Sepultura, mais uma vez, surpreendeu. “Machine Messiah” é um disco de alto patamar, sem fillers e coeso ao que se propõe. O conceito é bem trabalhado e, musicalmente, vai muito além do lugar-comum. A fome de superação de Andreas Kisser, a vontade de Derrick Green em se reinventar e o sangue novo injetado por Eloy Casagrande deram, a este álbum, a qualidade que ele tem.
“Machine Messiah” é, para mim, um dos melhores trabalhos do Sepultura. Não só dos últimos 20 anos, mas na discografia da banda como um todo.
Nota 8,5
Derrick Green (vocal)
Andreas Kisser (guitarra)
Paulo Jr. (baixo)
Eloy Casagrande (bateria)
01. Machine Messiah
02. I Am The Enemy
03. Phantom Self
04. Alethea
05. Iceberg Dances
06. Sworn Oath
07. Resistant Parasites
08. Silent Violence
09. Vandals Nest
10. Cyber God