Já se passavam das 22h30 quando parecia que o show do Guns N’ Roses, iniciado pontualmente duas horas e meia antes, teria sua primeira pausa. Alarme falso: foram apenas alguns segundos com luzes apagadas quando se posicionava o piano de cauda no palco.
“November Rain” foi a 27ª das 30 músicas executadas na noite de sábado (25), no Allianz Parque, em São Paulo. Três horas e dez minutos de show sem descanso para o público que esgotou os ingressos do estádio. A reação, porém, foi morna enquanto Axl Rose — correndo o palco todo, mas de comunicação escassa — e sua turma não tocavam suas canções mais conhecidas.

Diferente do que aconteceu na abertura. Por pouco mais de 45 minutos, os Raimundos enfileiraram hits dos anos 1990 e aqueceram o público no Allianz Parque, onde se apresentaram pela primeira vez. Pelo menos assim disse um emocionado Digão, o único remanescente da fase de sucesso da banda, acompanhado de Marquim (guitarra), Caio Cunha (bateria) e Jean Moura (baixo).
Os problemas no microfone de Digão nas primeiras músicas serviram como estímulo para aumentar o coro das pessoas que já enchiam a pista do estádio. As letras de “Esporrei na Manivela”, “Me Lambe” e, após breve citação a Slayer, “Puteiro em João Pessoa” eram cantadas como se nada tivesse mudado no mundo nos últimos trinta anos.
“Bê a Bá” foi incluída no repertório a pedido do ex-empresário José Muniz Neto — dono da promotora do show da noite — e dedicada ao baixista Canisso, falecido em 2023. “Mulher de Fases” e “Eu Quero Ver o Oco” fecharam o show acompanhadas em uníssono pelo público.
Repertório — Raimundos:
- Os calo
- Esporrei na manivela
- Reggae do Manêro
- O pão da minha prima
- Me lambe
- I Saw You Saying (That You Say That You Saw)
- Be a bá
- Puteiro em João Pessoa
- A mais pedida
- Mulher de fases
- Eu quero ver o oco
Guns N’ Roses
Faltavam vinte minutos para 20h quando os telões deixaram de anunciar os próximos shows produzidos pela Mercury Concerts e passaram a exibir uma cruz que, alternada a uma caveira estilizada, foram os temas principais dos gráficos ao fundo do palco do Guns N’ Roses na atual turnê.
Foi-se o tempo dos lendários atrasos de Axl Rose. Pontualmente às 20h, lá estavam os membros clássicos Slash e Duff McKagan ao lado do vocalista executando “Welcome to the Jungle”. Celulares ao alto e coros em volume alto tomaram conta do pouco espaço para se mexer na pista, lotada de um público cuja média de idade era jogada para baixo pela boa presença de filhos adolescentes acompanhando os pais.
A empolgação inicial foi minguando, ainda que a primeira metade do show tenha se dedicado às canções mais roqueiras do repertório. Apesar de correr pelo palco como se estivesse nos anos 90, Rose se comunicou pouco com o público. Receita que normalmente não funciona nos shows em estádio, onde a tendência de dispersão é mais alta.

Também não ajudou que a banda não demonstrasse tanto vigor ou cuidado ao executar de forma descontraída faixas animadas como “It’s So Easy” e “Mr. Brownstone”, do lendário “Appetite for Destruction” (1987), ou “Bad Obsession” e “Pretty Tied Up”, respectivamente de cada um dos dois megaplatinados “Use Your Illusion” (1991).
Na linha de frente do palco, se apenas o guitarrista Richard Fortus, aos 58 anos, não era sexagenário, todos ainda aparentavam estar em boa forma. Exceto pela correria desenfreada do vocalista, porém, os demais pareciam controlar suas energias para aguentar as mais de três horas de show, numa turnê pela América Latina que já se estende por quase um mês.

Poucos momentos despertaram o público na primeira hora. O cover para “Live and Let Die”, do Wings do beatle Paul McCartney, foi um deles. Outro ocorreu quando Axl falou em tocar uma música para Ozzy Osbourne. E acabaram vindo duas do Black Sabbath: “Sabbath Bloody Sabbath” e “Never Say Die”. A reação, porém, só pareceu digna do tributo quando a imagem do saudoso Príncipe da Escuridão apareceu no telão.
Se nem Black Sabbath nem o hit “Slither”, do Velvet Revolver de McKagan e Slash, despertavam o público da mera contemplação, não seria diferente para músicas mais novas dos quatro singles recentes, gravados já com os icônicos baixista e guitarrista de volta ao Guns N’ Roses. “Chinese Democracy”, faixa-título do aguardado-além-da-conta disco de 2008, também passou despercebida.
A partir de “Estranged”, o épico de “Use Your Illusion II”, a situação começou a mudar. Não só pela reação do público — cantando efusivamente os primeiros versos e quase encobrindo Rose —, mas também no ritmo da apresentação. Os solos passaram a ficar mais longos. Se não haveria aquelas tradicionais pausas para bis, era necessário dar um descanso para o vocalista.

Não é como se Axl Rose estivesse com a voz tinindo. Aos 63 anos, não se esperava que aqueles seus icônicos registros altos esganiçados dos anos 1990 se mantivessem com toda a potência. O vocalista conseguiu boa atuação quando se segurava nos tons médios, mas a similaridade ao agudo meio afônico de um certo ratinho famoso já se tornou uma comparação impossível de se evitar. Ao longo da primeira hora, conforme corria sem parar e o fôlego diminuía, foi ficando pior a cada música. O tempo para recuperação enquanto os demais músicos estendiam as seções instrumentais funcionou.

Também ajudou a presença da tecladista Melissa Reese, meros 35 anos de idade, nos vocais de apoio, principalmente na hora dos tons mais altos. Duff era outro a dar suporte em vários momentos, ou quando assumiu a linha de frente no enérgico cover de “Thunder and Lightning”, do Thin Lizzy. Apesar de Fortus ter chegado a integrar a banda de origem irlandesa em uma de suas versões tributo-oficial em 2011, não houve menção a John Sykes, guitarrista falecido em dezembro do ano passado, que gravou a faixa originalmente no disco de 1983.
Para cada “Don’t Cry” e “You Could be Mine” cantada em uníssono, porém, havia uma “Double Talkin’ Jive” e “Rocket Queen” beirando ou passando os dez minutos de duração, ou a morosa versão para “Knockin’ on Heaven’s Door”, com Rose trazendo com sucesso o público para cantar. Enquanto Slash fazia seu solo de forma blueseira, a pista premium dispersava para se transformar em uma enorme sessão de selfies com o palco ao fundo — até o riff lendário de “Sweet Child O’Mine” trazer novamente os celulares com lanternas acesas para disputar o protagonismo no estádio todo.

Parecia que a noite se encaminhava para o fim, mas o show ainda teria outros cinquenta minutos. Se a reação efusiva para “Civil War” e a já citada “November Rain” era esperada, surpreenderam os coros em “This I Love”. A outra faixa de “Chinese Democracy” executada no Allianz Parque também contou com Slash soltando a mão no solo.
O oitavo(!) cover da noite, “Human Being”, do New York Dolls, veio na reta final. Apesar dos músicos empolgadíssimos no palco, só as imagens da cidade de batismo da banda original no telão chamaram a atenção do público, que já começava a ir embora do Allianz Park.
A noite se encerrou com duas músicas de “Appetite for Destruction”. “Nightrain” mostrou o baterista Isaac Carpenter, com aparência exausta apesar de seus 46 anos de idade, mas ainda mantendo o entusiasmo para ditar seu ritmo cativante.

A inevitável “Paradise City” trouxe a frenesi esperada de um clássico, já com os coros em uníssono na citação inicial do refrão. No final apoteótico, a banda gastou seus últimos resquícios de força e fôlego na busca por uma sinergia com o público, algo que faltou por boa parte das três horas e dez minutos no palco.
É louvável o Guns N’ Roses se esforçar para oferecer uma apresentação digna de lenda do rock a um público que segue enchendo estádios, mesmo em sua décima passagem pelo Brasil e sem qualquer lançamento comercialmente relevante desde 1991. A banda não recorre a backing tracks, nem mexe em suas afinações para resguardar seu vocalista. Talvez resultasse num show de maior intensidade se fosse um pouco mais curto e com menos covers no repertório.

Axl Rose, porém, parece não estar preocupado com isso. Como já avisa o extenso nome da turnê atual, “o que você espera e o que você recebe são duas coisas completamente diferentes”. A ver se haverá mudanças no futuro para um Guns N’ Roses que, diferente do público, não deu quaisquer sinais de esgotamento. A tour continua pelo Brasil indo a Curitiba (28/10), Cuiabá (31/10) e Brasília (02/11).
Guns N’ Roses — ao vivo em São Paulo
- Local: Allianz Parque
- Data: 25 de outubro de 2025
- Turnê: Because What You Want & What You Get Are Two Completely Different Things
- Produção: Mercury Concerts
Repertório:
- Welcome to the Jungle
- Bad Obsession
- Chinese Democracy
- Pretty Tied Up
- Mr. Brownstone
- It’s So Easy
- The General
- Perhaps
- Slither (cover de Velvet Revolver)
- Live and Let Die (cover de Wings)
- Hard Skool
- Wichita Lineman (Cover de Jimmy Webb)
- Sabbath Bloody Sabbath (cover de Black Sabbath)
- Never Say Die (cover de Black Sabbath)
- Estranged
- Yesterdays
- Double Talkin’ Jive
- Don’t Cry
- Thunder and Lightning (cover de Thin Lizzy)
- Absurd
- Rocket Queen
- Knockin’ on Heaven’s Door (cover de Bob Dylan)
- You Could Be Mine
(Solo de guitarra de Slash) - Sweet Child o’ Mine
- Civil War
- November Rain
- This I Love
- Human Being (cover de New York Dolls)
- Nightrain
- Paradise City

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