Streaming quase impossibilita viver de composição musical, segundo estudo

Pesquisa feita por empresa britânica de consultoria e inteligência de marketing mostra que criadores são ainda menos reconhecidos no modelo atual

Frequentemente, as plataformas de streaming recebem críticas pela remuneração concedida aos artistas. De acordo com estimativas, o Spotify, por exemplo, oferece cerca de US$ 0,004 por cada reprodução — ou seja, bem menos do que um centavo de dólar. Não é muito diferente entre outras plataformas, como Deezer, Apple Music, Amazon Music e Tidal. No caso dos compositores, a situação é desesperadora, como indica um novo estudo. 

A empresa britânica de consultoria e inteligência de marketing MIDIA Research idealizou uma pesquisa a respeito do assunto. Intitulada “Songwriters Take the Stage”, a análise teve parte de seus dados divulgada pela Variety. 309 compositores colaboraram com a publicação.  

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Como relatado, dentre os profissionais entrevistados, apenas 10% ganham mais de US$ 30 mil anualmente (aproximadamente R$ 70 mil na cotação atual). Por outro lado, mais da metade (54%) embolsa entre US$ 0 e US$ 1 mil (mais ou menos R$ 5,6 mil) no mesmo período. Diante do cenário, cerca de 67% dos compositores destacaram a “falta de renda significativa de streaming” como o principal desafio.

Basicamente, o valor recebido por uma música nos streamings é dividido em várias partes. Artista, gravadora e distribuidora ficam com 56% da quantia total. Outros 30% vão para a plataforma. Então, apenas 14% são direcionados aos compositores, editoras e companhias de direitos autorais — como a American Society of Composers, Authors and Publishers (Ascap) ou Broadcast Music Inc (BMI). 

Desses 14%, o compositor fica com 68%. Porém, o dinheiro deverá ser repartido entre todos aqueles que assinaram a faixa. Como apontado, é comum que na atualidade canções de sucesso contem com “entre 3 e 12 criadores”. Assim, o valor final para cada um será mínimo. Em justificativa, o Spotify alega que “não controla como as gravadoras, editoras e outros intermediários distribuem o dinheiro que arrecadam”. 

Sem alternativas para compositores

Diferentemente dos artistas, que também obtêm renda por fontes como turnês e merchandising, os compositores não têm muitas alternativas. Por isso, dos 309 pesquisados, apenas 11 (0,04%) vivem de fato da composição. A grande maioria trabalha ainda como produtores, performers, compositores de cinema/TV ou jingles. 

Outro agravante é o fato de que os compositores não têm um sindicato poderoso para ampará-los. Até existem grupos como o Songwriters of North America (Sona), o Nashville Songwriters Association International (NSAI) e o 100 Percenters. Porém, de acordo com a Variety, tais instituições exercem menos influência do que associações como Recording Industry Association of America (RIAA), responsável por ajudar as gravadoras, e National Music Publishers Association (NMPA), voltada às editoras. 

O caso do Spotify

O anúncio de que o Spotify aumentaria o custo de sua assinatura premium de US$ 9,99 para US$ 10,99, incluindo 15 horas de audiobooks por mês nos Estados Unidos soou como uma vitória para compositores e editores. Preços de assinatura mais altos normalmente equivalem a um aumento nos royalties mecânicos. Mas não desta vez.

Conforme registro da Billboard publicado em maio, o serviço de streaming agora afirma que se qualifica para pagar uma taxa de “pacote” com desconto aos compositores por streams premium, já que precisará pagar o licenciamento de livros e músicas pelo mesmo preço – o que é só um dólar mais alto do que quando a música era a única oferta premium.

Além disso, o aplicativo também reclassificará seus planos de assinatura dupla e familiar como pacotes. Para determinar quão grande seria essa perda no valor dos royalties para o negócio da música, a revista americana calculou que os compositores e editores ganharão cerca de US$ 150 milhões a menos em royalties mecânicos durante os primeiros 12 meses da modalidade em vigor, em comparação com o que teriam ganho se essas três assinaturas nunca tivessem sido agrupadas.

O valor de royalties perdido para compositores e editoras pode se tornar ainda maior se o Spotify aumentar o custo do premium para US$ 11,99, o que uma fonte próxima ao assunto considera uma possibilidade. Também é possível que essa perda possa ser diminuída pela quantidade de usuários que mudam sua assinatura de premium, duo e família para o nível somente de música, que pagará da mesma forma, embora seja improvável um impacto significativo na estimativa de perdas no primeiro ano.

Outra fonte próxima ao assunto concorda com a estimativa da Billboard, também calculando de forma independente que o valor dos royalties perdidos totalizará US$ 150 milhões em royalties mecânicos dos EUA para premium, duo e família. Uma alternativa calculou algo entre US$ 140-150 milhões. Outra terceira fonte diz que sua estimativa pessoal totalizou cerca de US$ 120-130 milhões, no mínimo.

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O que diz a empresa

O Spotify não fez comentários específicos a respeito do novo estudo. Porém, no último mês de março, divulgou o relatório anual Loud & Clear 2024, com informações referentes ao ano anterior que visam conferir transparência financeira à plataforma de streaming – bastante criticada por seus pagamentos a artistas e podcasters, especialmente após a remunerar apenas aqueles que ultrapassam mil execuções.

Por mais um ano, o Spotify estabeleceu o recorde de maior pagamento anual à indústria da música de um único varejista: mais de US$ 9 bilhões. O valor equivale a quase R$ 45 bi na cotação atual e em transação direta.

O número quase triplicou nos últimos seis anos e representa uma grande parte dos mais de US$ 48 bilhões que a empresa pagou desde a sua fundação. O dinheiro vai para detentores de direitos autorais, que incluem gravadoras, editoras, distribuidores independentes, organizações de direitos de execução e sociedades de gestão coletiva.

Além disso, a companhia declara ter pago aproximadamente US$ 4 bilhões às editoras – que representam compositores – nos últimos dois anos. De acordo com o Global Value of Music Copyright, editoras, compositores e organizações de gestão coletiva estão obtendo mais do que o dobro da receita (US$ 5,5 bilhões em 2022) na era do streaming do que já tiveram na era do CD/vendas (US$ 2,5 bilhões em 2001).

Também é destacado que o número de artistas que geram pelo menos US$ 1 milhão, US$ 100 mil e US$ 10 mil quase triplicou desde 2017. A quantidade de artistas que geram receita em todos os limites compartilhados na plataforma – de US$ 1 mil a US$ 10 milhões por ano – quase triplicou desde 2017. Esses valores representam a receita gerada apenas pelo Spotify. Ao levar em conta os ganhos de outros serviços e fontes de receita registradas, esses artistas provavelmente geraram 4x essa receita a partir de fontes de música registradas em geral, além de receitas adicionais de ingressos de shows e produtos.

Em 2023, artistas independentes geraram cerca de US$ 4,5 bilhões no Spotify. Foi o primeiro ano em que os independentes responderam por cerca de metade do que toda a indústria gerou no Spotify, que totalizou mais de US$ 9 bilhões.

Isso representa um aumento de 4 vezes para os indies desde 2017. É o valor mais alto que os independentes já geraram de um único varejista em um ano.

Confira, abaixo, mais informações destacadas pelo comunicado do Spotify à imprensa.

  • Muitos dos artistas que geraram pelo menos US$ 1 milhão no Spotify em 2023 não são artistas mainstream e não precisaram de um hit para ter um ano de sucesso. 80% deles não tiveram nenhuma música alcançando o Top 50 do charts Daily Global Songs do Spotify.
  • 225 mil artistas emergentes e profissionais no Spotify em 2023 dependem mais do streaming como parte de seu sustento. Mais de 10 milhões dos que fizeram upload tiveram pelo menos uma faixa. Cerca de 8 milhões tiveram menos de 10 faixas ao longo do tempo. Mais de 5 milhões tiveram menos de 100 streams no total em seu catálogo completo. A empresa afirma: “Mais artistas estão tendo sucesso e, como resultado, muitos mais estão interessados em se tornar artistas. Claro, mais de 10 milhões dos que fazem uploads têm pelo menos uma faixa no Spotify, mas quando se trata de criar oportunidades financeiras, estamos focados naqueles mais dependentes do streaming como parte de seu sustento: esses 225.000 artistas emergentes e profissionais que estão construindo carreiras”.
  • Quase metade dos artistas que geraram mais de US$ 10 mil no Spotify em 2017, agora estão gerando mais de US$ 50 mil e provavelmente US$ 200 mil em todas as fontes de receita registradas.
  • Em 2023, 50 mil artistas geraram pelo menos US$ 16,5 mil no Spotify e provavelmente US$ 65 mil de músicas gravadas em geral. “A esmagadora maioria dos artistas no Spotify não teria música na prateleira na era do CD. Se você listasse todos os artistas no Spotify, em ordem de quanto dinheiro eles geraram, mesmo o 50.000º colocado gerou no mínimo US$ 16,5 mil somente no Spotify”, complementa a empresa.

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Maria Eloisa Barbosa
Maria Eloisa Barbosahttps://igormiranda.com.br/
Maria Eloisa Barbosa é jornalista, 22 anos, formada pela Faculdade Cásper Líbero. Colabora com o site Keeping Track e trabalha como assistente de conteúdo na Rádio Alpha Fm, em São Paulo.

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