Guilherme Arantes cita Gal Costa ao explicar por que “é fácil estar morto” na música

Para o artista, tanto ele quanto a saudosa cantora sofreram preconceito quando atingiram uma idade mais avançada, o que seria comum na indústria

No mês passado, Guilherme Arantes refletiu sobre o papel atual da televisão na música. Em texto compartilhado no Facebook, o cantor opinou que as falas nas telinhas “são sempre tóxicas, trazem aborrecimentos e perdas pessoais” e que o intuito das performances, normalmente “hits mais comportadinhos e digestivos”, é não trazer “questionamento novo algum”. 

Por fim, escreveu que “é um tempo muito difícil de se estar vivo, muito fácil para se estar morto”. Diante de tal ponto de vista, a revista Veja SP perguntou ao artista o significado da frase de encerramento. 

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Para exemplificar, Arantes citou Gal Costa, falecida em novembro de 2022, aos 77 anos. Em sua opinião, a saudosa cantora acabou sendo vítima do etarismo — preconceito por causa da idade —, o que seria de praxe na indústria da música. A imagem dos artistas mais novos, na juventude, ainda chama mais atenção e recebe mais prestígio, como explicou.

“Vamos pegar o final da carreira da Gal (Costa). Fazendo shows, lutando para permanecer relevante e sendo abandonada pelo público em geral, devido a um etarismo e a não conseguir mais desempenhar o papel daquela figura deslumbrante. Então ela, quando falece, acaba virando personagem de tributos com mulheres jovens tentando imitá-la, enchendo as casas de show, com altos ingressos. Por isso eu digo que é muito fácil estar morto. A sociedade quer petrificar um personagem e transformá-lo em uma commodity.” 

O próprio artista, que tem 70 anos, acredita sofrer com o etarismo. Em suas palavras:

“Já fui abordado por pessoas querendo fazer uma peça sobre a minha vida, com um menino que usa aquele cabelo, que faz aquela cara, que toca ‘Meu Mundo e Nada Mais’ daquele jeito. É normal, acho que todos sofrem, o etarismo é um fato mundial, é um mundo muito egoico e imagético. Eu acho isso mórbido. No meu caso, consegui uma boa substituição do esplendor físico pelo pensamento e pelo carisma da fala. Nos shows, substituo a eventual depreciação de imagem, de estar gordo e mais velho, fazendo com que o público nem repare que um dia fui bonito, conquistando as pessoas com a minha história e meu conteúdo.”

Guilherme Arantes e Gal Costa

Em diversas ocasiões, Guilherme Arantes demonstrou admiração pelo trabalho de Gal Costa. Em novembro de 2022, publicou a seguinte mensagem no Facebook a respeito das características marcantes da cantora:

“Uma das maiores marcas de Gal é a fluência do seu canto. A facilidade de exercer seu dom como se a voz passasse através do seu sorriso lindo, líquida e livre como um fluxo de beleza e graça. Aliás, seu nome definidor veio desde o princípio nos ensinar a predestinação daquela menina. Para mim, Gal foi tranquilamente a maior paixão da adolescência porque explodia em sua transgressão suave e brejeira, em plena contracultura, como a forma mais brasileira de responder maravilhosamente a um mundo fervilhante em convulsão ética e estética.

Seu timbre entrou sempre para a História como uma forma mais-que-perfeita de flor sonora. Uma flor raríssima em suas simplicidades e singularidades, em seu design magistralmente econômico em adereços e ‘embellishments’, magicamente certeiro no alvo das notas, na facilidade da alegria de seus ritmos brejeiros, um conjunto de qualidades simultâneas a jorrar de uma figura de uma beleza irretocável.”

Guilherme Arantes recentemente

Em 2021, Guilherme Arantes lançou o seu álbum de estúdio mais recente, “A Desordem dos Templários”. O trabalho nasceu por acaso, a partir de um planejamento que não envolvia música: o cantor pretendia passar quatro meses na Espanha estudando compositores barrocos e visitando locais turísticos.

Veio a pandemia, um problema na coluna cervical e uma “depressão de carreira”, nas palavras do próprio. Foi aí que nasceu o disco, também gravado na Espanha.

Em material de divulgação, o músico declarou ter explorado elementos como o lundu, a valsa, a modinha, a bossa nova, a toada ternária mineira e o baião no projeto.

Sobre Gal Costa

Nascida em 26 de setembro de 1945, em Salvador, Bahia, Maria da Graça Costa Penna Burgos iniciou sua carreira musical na década de 1960. Estreou junto de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria Bethânia, Tom Zé e outros no o espetáculo “Nós, Por Exemplo…” Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1965, onde fez sua primeira gravação, no álbum homônimo de Maria Bethânia.

Seu primeiro disco próprio saiu em 1967: “Domingo”, em parceria com Caetano Veloso. De lá, saiu seu primeiro hit, “Coração Vagabundo”. Em 1968, participou do trabalho “Tropicália ou Panis et Circencis”, um dos mais representativos do movimento tropicalista. A partir daí, prosseguiu com uma carreira de sucesso, tornando-se uma das referências da MPB, além de flertar com diversos gêneros, incluindo o rock.

Ao todo, Gal Costa lançou mais de 40 álbuns de estúdio. O último, “Nenhuma Dor”, saiu ano passado. Conforme aponta a Enciclopédia Itaú Cultural:

“Gal Costa é considerada uma das principais referências vocais femininas de sua geração e influência para cantoras posteriores. Com postura irreverente e desafiadora, sua trajetória é marcada por reinvenções, rupturas e a particular junção do grito do rock ao canto popular.”

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Maria Eloisa Barbosa
Maria Eloisa Barbosahttps://igormiranda.com.br/
Maria Eloisa Barbosa é jornalista, 24 anos, formada pela Faculdade Cásper Líbero. Colabora com o site Keeping Track e trabalha como assistente de conteúdo na Rádio Alpha Fm, em São Paulo.

1 COMENTÁRIO

  1. Triste ver tantos cantores magníficos deixado de lado no Brasil. Tudo oque ele disse da Gal é pura verdade, o pior é ver esses cantores jovens imitando grandes vozes e ainda ganhar com isso.. Mas o pior são os lixos que fazem sucesso no Brasil, triste de ver

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