Como o álbum “Rio” fez o Duran Duran conquistar o mundo

Busca pelo exótico e olhar diferenciado para videoclipes guiou um dos trabalhos musicais mais importantes da década de 1980

Talvez nenhum disco dos anos 1980 simbolize a década tão bem quanto “Rio”. O quinteto inglês Duran Duran já havia conseguido certa notoriedade com sua estreia homônima, mas o segundo álbum do grupo acabou sendo um sucesso tão esmagador que definiu a estética pop na década, seja pelas canções em si, pela capa estilo art déco ou pelos videoclipes, revolucionários para a época.

Mas como que cinco rapazes de Birmingham chegaram na ideia que gerou o disco “Rio”?

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Vendo o mundo pela primeira vez

O primeiro álbum do Duran Duran, homônimo, obteve repercussão mundial graças ao hit “Girls on Film”, cujo videoclipe atraiu um certo grau de notoriedade ao grupo. Contendo mulheres de topless praticando luta na lama, briga de travesseiros e outros fetiches sexuais, o clipe calhou de ser gravado duas semanas antes do lançamento de um divisor de águas no pop internacional: a MTV.

Entretanto, o clipe não foi feito com a emissora em mente, como um dos diretores do clipe, Kevin Godley, explicou para Roy Shuker em seu livro “Understanding Pop Music”:

“A equipe do Duran Duran nos falou explicitamente para fazer uma peça bem sensacionalista e erótica para boates, onde seria mostrada sem censura simplesmente para as pessoas notarem e falarem a respeito.”

Uma versão bastante editada foi mostrada na MTV e ajudou o single a chegar no 5º lugar das paradas inglesas e o disco de estreia chegar à 3ª posição de seu respectivo chart. Com isso, o grupo saiu pelo mundo para promover o álbum, tocando nos Estados Unidos, Alemanha e França.

Entretanto, ao retornarem para Birmingham, mesmo para um grupo que nunca havia saído do Reino Unido, uma imagem ainda mais exótica se formou na imaginação coletiva do grupo, como o baixista John Taylor descreveu para Annie Zaleski no livro “Duran Duran’s Rio”, da série “33 ⅓”:

“Foi extraordinário. Mas quando retornamos para Birmingham, a ideia de exótico — e viagem exótica — era Rio.”

Em seu livro “In The Pleasure Groove: Love, Death And Duran Duran”, John Taylor elaborou ainda mais sobre o tema:

“Para mim, ‘Rio’ era sinônimo do que era verdadeiramente estrangeiro, o exótico, uma cornucópia de prazeres terrenos uma festa que nunca iria parar.”

Esse desejo de explorar o exótico vinha também como reação a todas as influências adquiridas desde o primeiro disco. Polirritmos, funk, synthpop e efeitos elaborados de processamento de som estavam ainda engatinhando no pop, mas o grupo estava pronto para entrar na briga.

Simon Le Bon, vocalista do grupo, descreveu o ânimo do grupo para a Classic Pop Magazine:

“Nós já tínhamos muito material pronto e sabíamos que assim que começássemos a trabalhar nas canções, algo em nossa química simplesmente faria surgir mais e mais música.”

Dessas sessões, produzidas por Colin Thurston, renderam singles clássicos como “Save a Prayer”, “Hungry Like the Wolf” e a faixa-título. Entretanto, o grupo sabia que naquele novo mundo pós-MTV, era preciso aliar grandes músicas com vídeos que prendiam a atenção do público.

Russell Mulcahy entra em cena

Russell Mulcahy não inventou o videoclipe moderno, mas ele foi o primeiro grande diretor deles.

Quando a MTV teve sua estreia nos Estados Unidos, o clipe exibido foi “Video Killed The Radio Star”, do grupo inglês The Buggles. Dirigido por quem? Russell Mulcahy.

Ele foi um dos principais arquitetos estéticos do movimento apelidado de New Romantic, do qual o Duran Duran inicialmente fez parte — ele dirigiu o clipe de estreia do grupo, “Planet Earth” — mas agora o quinteto não se sentia pertencente a nenhuma cena, pois desejavam criar algo só deles.

Entre datas de turnê, os músicos foram para lugares exóticos e paradisíacos como Sri Lanka e Antígua, onde gravaram clipes para os três singles clássicos já citados, assim como os menos conhecidos “Lonely in Your Nightmare” e “Night Boat”. 

Até então, videoclipes eram um veículo para uma performance visual do artista, mas isso mudou com os clipes dessa leva. Os valores de produção eram consideravelmente maiores que qualquer outro até então feito. Fotografia estilizada, edição picotada, câmera lenta. Era completamente diferente de tudo que estava disponível na MTV.

E vídeos não foram a única inovação do Duran Duran em “Rio”.

Feitos e refeitos pra pista

Apesar do sucesso inicial no Reino Unido, “Rio” não conseguiu tração nos Estados Unidos e no Canadá, devido em parte à gravadora não saber exatamente como vender o grupo. Então, como parte do esforço de se separar da cena New Romantic, o grupo resolveu investir em algo que eles já haviam se mostrado inovadores no pop britânico: o remix.

Para a Classic Pop Magazine, o baterista Roger Taylor explica como a ideia de versões estendidas para boates eram feitas pelo grupo:

“Sempre fizemos Night Versions das canções para boates, mas naquela época tínhamos que gravá-las ao vivo. Não dava pra picotá-las no computador e fazer loops que nem hoje em dia. Nós tocamos elas ao vivo e como alguns desses mixes tinham mais de 10 minutos de duração, eram bem difíceis de fazer. Se alguém cometia um erro, tínhamos que voltar para o começo e fazer tudo de novo.”

O grupo trabalhou com o produtor David Kershenbaum no que veio a ser o EP “Carnival”, com remixes de “Rio”, “Hold Back the Rain”, “My Own Way”, “Hungry Like the Wolf”, e “New Religion”. O sucesso inicial desse EP ajudou o Duran Duran a convencer a EMI a lançar uma versão remixada e remasterizada do disco “Rio” nos EUA e no Canadá.

Kershenbaum foi trazido para fazer essa recauchutada e remixou o lado A inteiro do disco. O single de “Hungry Like the Wolf”, contendo a versão US Remix da canção, saiu em dezembro de 1982 e atingiu o 3º lugar das paradas em março de 1983.

Duran Duran, o Fab Five

O álbum “Rio” permaneceu nas paradas americanas durante 129 semanas, chegando ao 6º lugar no ranking. Devido ao sucesso, a EMI relançou a estreia do Duran Duran com o novo single “Is There Something I Should Know?”, que entrou direto no topo dos charts ingleses.

O Duran Duran ainda teve o apoio da princesa Diana, que os elegeu sua banda preferida. A febre em torno deles era tamanha que se formou em torno do grupo era semelhante a outro grupo inglês: os Beatles. Não à toa, foram apelidados de Fab Five pela imprensa britânica. 

Numa reportagem do Daily Mirror em 1983, o tecladista Nick Rhodes descreveu a mudança no sucesso do grupo:

“Nossos primeiros shows nos Estados Unidos foram loucos e cult, mas quando voltamos depois de ‘Hungry’ virar um hit, era um deus nos acuda. Era Beatlemania. Estávamos fazendo um evento de autógrafos do clipe de ‘Girls on Film’ numa loja na Times Square. Não conseguíamos sair da loja. A polícia bloqueou a rua.”

Mas embora tenham conseguido outros sucessos ao longo da década, “Rio” acabou se mostrando insuperável, como Nick Rhodes contou ao Yahoo em 2017:

“É algo que se tornou uma faca de dois gumes para nós, porque foi um disco tão poderoso, e talvez as imagens dos clipes ficaram grudadas na cabeça das pessoas. Aí quando chegou no fim da década de 1980, todo mundo quis fechar a porta na nossa cara.”

O grupo soube sempre se reinventar, continuando juntos até hoje. Em entrevista ao canal IgorMiranda.com.br, em 2021, o baterista Roger Taylor ofereceu sua opinião sobre “Rio”, todos esses anos depois:

“É raro pra mim olhar pra trás e achar que tal disco era bom. Os nossos discos eram, claro, bem do tempo deles, perfeitos para a época. Acho que faríamos um pouco diferente se fosse hoje, mas eles continuam se sustentando até hoje.”

Duran Duran – “Rio”

  • Lançado em 10 de maio de 1982 pela EMI; produção assinada por Colin Thurston.

Faixas:

  1. Rio
  2. My Own Way
  3. Lonely in Your Nightmare
  4. Hungry Like the Wolf
  5. Hold Back the Rain
  6. New Religion
  7. Last Chance on the Stairway
  8. Save a Prayer
  9. The Chauffeur

Músicos:

Simon Le Bon (vocal, vibrafone na faixa 6, ocarina na faixa 9)
Nick Rhodes (teclados, sintetizadores, marimba, efeitos sonoros, backing vocals na faixa 7)
John Taylor (baixo, backing vocals)
Andy Taylor (guitarra, backing vocals)
Roger Taylor (bateria, percussão)

Músico adicional:

Andy Hamilton (saxofone tenor na faixa 1)

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Pedro Hollanda
Pedro Hollanda
Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como Rock'n'Beats e Scream & Yell.

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