Johnny Cash é tido como um grande representante da população carcerária americana e isso não é à toa. Ao longo da carreira, o artista fez mais de 30 shows em prisões dentro e fora dos Estados Unidos, com alguns sendo gravados e se tornando álbuns ao vivo muito lembrados. E tudo isso começou na prisão de San Quentin, na Califórnia, no primeiro dia do ano de 1958.
O cantor é um pioneiro do chamado “outlaw country”, uma vertente mais “sombria” da música country americana. Tal característica se refletia também no visual, sempre composto por roupas pretas – que, segundo ele, manchavam menos durante as turnês.
Além disso, é de conhecimento público que Cash foi preso algumas vezes. Porém, nunca em San Quentin – e nunca passou mais uma noite no xadrez. Mesmo assim, criou uma identificação com o local.
Era como se Johnny fosse um representante de minorias em uma época onde o preconceito nos Estados Unidos era um pouco mais institucionalizado do que hoje. Ele sempre foi uma voz atuante a favor dos direitos dos indígenas e seus descendentes, bem como da luta por melhores condições de vida para a população carcerária.
A prisão de San Quentin
A primeira apresentação de Johnny Cash na prisão de San Quentin aconteceu como parte de um festival de sete horas, destinado a entreter os internos da prisão de segurança máxima na virada de 1957 para 1958. Outros artistas menos populares se apresentaram no evento, que teve cobertura pelo San Quentin News, jornal interno da cadeia que é produzido pelos próprios presidiários e existe até hoje.
Na época, Cash já havia lançado seu álbum de estreia, “Johnny Cash with His Hot and Blue Guitar!”. Os grandes hits do trabalho eram “I Walk the Line” e “Folsom Prison Blues”, ambos com letras que lidam com questões sobre prisão. Ele tocou na penitenciária de Folsom em outras oportunidades no futuro – e costumava dizer que as plateias de encarcerados estavam entre as mais animadas, o que o fazia curtir esse tipo de show.
Outras apresentações de Cash em San Quentin rolaram em 1959, 1960, 1963, 1969 e 1977. Com plateias próximas de 3 mil pessoas, um dos detentos teria sua vida mudada por uma dessas performances.
Merle Haggard e Johnny Cash
Não se sabe ao certo se foi em 1959 e 1960, mas sabe-se que Merle Haggard era um dos internos que assistiu a Johnny Cash em San Quentin. Ao sair da prisão, o saudoso artista que nos deixou em 2016 consagrou-se como um grande nome da música country americana – e nunca escondeu que o Man in Black mudou sua vida em uma de suas visitas.
Os dois tiveram a oportunidade de aparecer juntos em diversas ocasiões. Numa delas, em um programa de TV no ano de 1969, Haggard, falecido em 2016, falou abertamente sobre seu tempo na prisão e agradeceu ao ídolo – algo que também fez em sua autobiografia. Sinal de que a iniciativa de Cash foi mais impactante do que qualquer um poderia imaginar na época.
Os álbuns
Além dos shows em si, Johnny Cash lançou uma série de álbuns gravados em prisões ao longo da carreira. O primeiro, “At Folsom Prison” (1968), conta inclusive com a música “Greystone Chapel”, composta por um interno de Folsom sobre a capela dentro do local. Em 1969, saiu “At San Quentin”, gravado na mesma penitenciária que recebeu o artista pela primeira vez.
Em 1973, foi a vez de “På Österåker”, disco registrado um ano antes na prisão de Österåker, na Suécia. Em 2003, dias depois da morte do cantor, foi lançado seu último álbum ao vivo, “A Concert Behind Prison Walls”, que retrata uma performance na prisão estadual do Tennessee em 1974.