O Exodus, que para muitos deveria ocupar alguma vaga no chamado Big 4 do thrash metal americano (composto por Metallica, Megadeth, Slayer e Anthrax), certamente está mais “arejado” em “Persona Non Grata”, seu 11º álbum de estúdio. Todavia, a sonoridade está longe de ser menos agressiva do que o grupo apresentou ao longo de sua carreira.
Produzido durante a pandemia – o que, segundo o guitarrista Gary Holt, garantiu mais tempo para a banda trabalhar –, o disco novo soa um tanto diferente de seu antecessor, “Blood In, Blood Out” (2014), até mesmo pelas circunstâncias em que foi concebido. A presença completa de Holt, 100% dedicado ao Exodus após sua passagem pelo Slayer, fez nitidamente com que as engrenagens da banda rodassem melhor.
Com o Slayer, na vaga do falecido Jeff Hannemann, ele gravou o álbum “Repentless” (2015) e fez uma série de turnês. Em entrevista coletiva para divulgar “Persona Non Grata”, Gary apontou ter aprendido muito com o grupo sobre os detalhes do showbusiness, mas a experiência também trouxe um “tempero” diferente para certos riffs e solos do novo trabalho.
Outro destaque individual desse disco é o vocalista Steve “Zetro” Souza, que está em seu segundo álbum desde sua volta. Ele é o responsável por trazer uma bem-vinda “vibe AC/DC” à pancadaria sonora dos veteranos do thrash.
Há ainda o sempre competente Tom Hunting, que estava com câncer no estômago ainda durante as gravações, apesar do diagnóstico ter sido obtido após a conclusão do processo, em fevereiro de 2021. Mesmo doente, o baterista teve uma performance não menos que perfeita por aqui. Completam a formação os também consistentes Jack Gibson (baixo) e Lee Altus (guitarra), que oferecem boa base para que o trio principal obtenha os holofotes.
Ouça “Persona Non Grata” abaixo, via Spotify, ou clique aqui para conferir em outras plataformas digitais. Uma resenha está disponível na sequência.
As músicas de “Persona Non Grata”
A faixa-título “Persona Non Grata” abre o trabalho de forma impactante, ultrapassando os 7 minutos e meio de duração. Embora não tenha mudanças de tempo muito complexas (o que geralmente é esperado para uma faixa tão longa), a música é um bom “cartão de visitas” do que vem pela frente. Os backing vocals, comandados Holt e Hunting, colaboram muito com a performance de Zetro, o algo que segue em todo o disco.
O bom nível do começo se mantém em “R.E.M.F.”, que tem mais a cara do Exodus clássico, com base em um riff intenso de Holt. “Sleeping Into Madness”, composição de Lee Altus e de Zetro, tem um refrão que deve funcionar bem ao vivo, além de bons solos de guitarras gêmeas. A essa altura, fica claro que “Persona Non Grata” é um álbum que mantém a regularidade em sua qualidade.
“Elitist” cadencia o ritmo e apresenta outro refrão forte. Zetro parece brilharr ainda mais quando o ritmo diminui um pouco, o que fica ainda mais evidente na sequência, com “Prescribing Horror”, uma das mais interessantes do disco. Lenta e com uma introdução sombria, é impossível não lembrar de alguns momentos mais soturnos do Slayer, como “Dead Skin Mask”, para citar um só exemplo.
A pancadaria volta na sequência, com as três músicas que foram divulgadas como singles anteriormente. A primeiro é “The Beatings Will Continue (Until Morale Improves)”, que traz novamente o DNA do Exodus em sua estrutura mais simples. “The Years of Death and Dying” é outro momento interessante, com a letra de Tom Hunting citando artistas já falecidos, com destaque para uma homenagem a Eddie Van Halen em um dos versos – seria o tapping no refrão outra referência a ele?
A terceira da sequência tem letra que aborda o problema das fake news e é também uma das mais pesadas do disco. “Clickbait” deve ser um grande momento ao vivo, além de trazer grande performance de Tom Hunting, o que fica ainda mais impressionante quando sabemos que ele já não estava saudável na época.
O disco se encaminha para seu final com a instrumental “Cosa del Pantano”, onde Gary Holt exibe seus talentos em uma pegada southern rock acústica. Serve como introdução para “Lunatic-Liar-Lord”, a mais longa do trabalho (quase 8 minutos), variações de tempo mais intensas e ótimos momentos no geral, com destaque à longa sequência de solos, que contam com a participação do ex-guitarrista Rick Hunolt.
“The Fires of Division” e “Antiseed” fecham o trabalho em alto nível, com boas performances no todo. A primeira se destaca com outro bom refrão, onde Zetro segue uma linha vocal diferente do habitual, enquanto a segunda aposta nos riffs bem trabalhados, especialmente na introdução.
Exodus de volta aos trilhos
Ao fim da audição, a sensação é de que “Persona Non Grata” foi produzido com capricho, provável fruto do tempo de sobra que a pandemia deu à banda. Não reinventa a roda, mas mostra o Exodus voltando aos trilhos depois do irregular “Blood In, Blood Out”. A regularidade, por sinal, é o ponto mais forte do disco: nenhuma música é muito pior ou tão melhor do que as outras.
Steve “Zetro” Souza faz muito bem ao Exodus. Sua voz parece se relacionar melhor com o som da banda e permite explorar novos elementos sem perder identidade. O vocalista também colabora com boas letras e parece montar um “trio” de composição eficiente com Gary Holt e Tom Hunting.
Provavelmente o grande êxito do novo álbum é o retorno “full time” de Holt, agora que o Slayer encerrou as atividades. O guitarrista é a alma da banda e o fato de poder se dedicar ao Exodus em tempo integral faz toda a diferença. Os poucos momentos que “fogem do padrão” vêm dele – e são sempre bem-vindos.
“Persona Non Grata” tem cheiro de recomeço para o Exodus, seja pela volta de Gary, pela recuperação de Hunting do câncer ou pela pandemia em si. Não traz uma banda exatamente no auge, mas um passo mais próximo de retornar a ele. Fica a esperança de que o bom desempenho por aqui não seja apenas um “clickbait”.
Exodus – “Persona Non Grata”
- Persona Non Grata
- R.E.M.F.
- Slipping Into Madness
- Elitist
- Prescribing Horror
- The Beatings Will Continue (Until Morale Improves)
- The Years of Death and Dying
- Clickbait
- Cosa Del Pantano
- Lunatic-Liar-Lord
- The Fires of Division
- Antiseed
* Texto por André Luiz Fernandes, com edição de Igor Miranda.