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A prematura morte de Andre Matos e o fim de ciclos no metal brasileiro

Andre Matos nos deixou. O lendário vocalista do Shaman, além de ex-integrante do Angra e Viper, faleceu neste sábado (8), aos 47 anos. Pessoas próximas afirmam ao UOL que a causa foi um ataque cardíaco.

Não só um vocalista extremamente talentoso, Andre Matos era pianista e regente, além de compositor graduado. O paulistano era muito competente no que fazia – e criterioso, a ponto de abandonar alguns projetos sem cerimônias quando certos pontos não o agradavam.

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Seu trabalho com o Angra, em especial, serviu como uma fantástica porta de entrada para mim, não só ao heavy metal, como, também, a vertentes mais pesadas da música brasileira. Quando comecei a ouvir nomes como Iron Maiden, Metallica e Guns N’ Roses, no auge da minha pré-adolescência, imaginei, por um tempo, que seria impossível encontrar bandas daquela qualidade no Brasil. O Angra me apresentou outro mundo, em que pude ter noção de que era possível ter aquele tipo de som produzido em meu país.

Andre começou a estudar música ainda na infância e entrou para o Viper aos 13 anos. A banda levou alguns anos para lançar seu primeiro disco, “Soldiers of Sunrise”, em 1987. O trabalho pouco reflete a competência erudita de Matos, porém, serviu como uma boa porta de entrada para o heavy metal, com seu speed/power bem visceral.

“Theatre of Fate” (1987), segundo do Viper, apresentou um pouco mais de Andre Matos, que deixou a banda em 1990 e, no ano seguinte, se juntou ao Angra. Ali, Andre ficou realmente à vontade, pois suas influências eruditas puderam aparecer de forma mais evidente.

O êxito

“Angels Cry” (1993), álbum de estreia do Angra, é um clássico do heavy metal brasileiro e do power metal mundial. O trabalho ainda segue bastante na veia do power europeu, mas já apresenta alguns elementos da música brasileira que se desdobrariam no também icônico “Holy Land” (1996).

O terceiro do Angra, “Fireworks” (1998), também foi o último disco da banda com Andre Matos, que saiu em 1999, após divergências internas com o empresário Antônio Pirani. Junto de Andre, deixaram a formação o baixista Luis Mariutti e o baterista Ricardo Confessori.

Shaman

O trio uniu forças para montar outra banda icônica, o Shaman, cuja formação se completou com o guitarrista Hugo Mariutti, irmão de Luis. Foram lançados dois discos, cada um explorando uma faceta diferente: “Ritual” (2002) retoma a influência da música brasileira que se ausentou em “Fireworks” e ainda reforça outros elementos da world music, enquanto o incompreendido “Reason” (2005) é um registro mais melódico e melancólico, com produção excepcional.

Na mesma época, o cantor trabalhou com o Avantasia, megaprojeto de power metal comandado por Tobias Sammet. Ele incorporou o personagem Elderane The Elf nos dois primeiros álbuns, “The Metal Opera” (2001) e “The Metal Opera Part II” (2002). É possível ouvir seus vocais nas músicas “Inside”, “Sign Of The Cross” e “The Tower”, do primeiro disco, além de “The Seven Angels”, “No Return” e “Chalice Of Agony”, do segundo.

Carreira solo e nostalgia

Novamente, Andre Matos não ficou por muito tempo: saiu em 2006, junto dos irmãos Mariutti, e apostou em sua carreira solo. Três álbuns foram lançados: “Time to Be Free” (2007), “Mentalize” (2009) e “The Turn of the Lights” (2012), com Matos no comando de tudo. Em 2011, ele também se envolveu com o malfadado projeto Symfonia, com o guitarrista Timo Tolkki (Stratovarius), que soa pedante por apostar em uma fórmula já gasta do power metal sinfônico.

Nos últimos anos, Andre Matos resolveu retomar algumas de suas raízes ao retornar com o Viper, em 2012, com uma turnê de reunião que contou até com um show abrindo para o Kiss, em São Paulo. Mais recentemente, em 2018, retomou o Shaman com sua formação clássica em outra tour bem-sucedida.

E o Angra?

Muitos perguntavam se Andre Matos, algum dia, subiria ao palco novamente com o Angra. “Houve sempre pedidos e propostas para voltar para o Viper, Angra e Shaman. Sempre fui muito avesso a isso, sempre olhei para frente, não queria…”, disse, ao Heavy Talk, em uma de suas melhores entrevistas.

Após a reunião do Viper, Andre Matos diz que começou a entender o porquê. “Tem um tipo de energia no palco que só rola quando tem a galera que fez, de fato, a música. […] Para mim, é uma questão pessoal, para que reviver levando esse fardo?”, comentou.

Uma condição foi estabelecida para um eventual retorno do Angra, nem que fosse apenas para um show em especial. “Se acontecer – e olha que é difícil dizer -, tem que ser com a formação original, senão, não vejo sentido. E isso evocava um fantasma do passado, mas, um belo dia, recebi uma visita desse ‘fantasma’ e ele veio na humildade, não foi oportunismo, para limpar a barra. Acho que se arrependeu muito. Por isso eu digo, galera mais jovem: sempre tem possibilidade de diálogo. Tentem conversar antes de fazer m*rda”, afirmou.

Fim de ciclos

A morte de Andre Matos encerra movimentos cíclicos vivenciados pelo metal brasileiro há um bom tempo. Evidentemente, conclui uma carreira brilhante que consolidou alguns dos trabalhos mais marcantes da música pesada nacional. No entanto, vai além disso.

Além de impossibilitar uma reunião tão sonhada, que era a do Angra com sua formação original, o falecimento do cantor também coloca um ponto final no Shaman, que vivenciava momentos de glória com sua reunião – e que poderia até render músicas inéditas. Quem sabe?

Um ciclo do próprio metal nacional, como um todo, se encerra com a morte de Andre Matos. Talvez, algumas reuniões possam acontecer de forma menos tumultuada, já que dá para dizer, com certa tranquilidade, que o heavy metal brasileiro sofreu a maior perda de sua história, até o momento, neste fatídico sábado, 8 de junho de 2019.

Após tantas brigas e farpas que rolaram nas últimas décadas entre músicos tão notáveis do nosso cenário, a morte prematura de Andre Matos também serve para que muitos reflitam sobre suas carreiras e até suas trajetórias pessoais. Como o próprio Andre Matos disse ao Heavy Talk, sempre existe a possibilidade do diálogo. Uma boa conversa pode impedir que ressentimentos sejam levados até o fim da vida.

Que Andre Matos possa descansar em paz. Sua falta será sentida.

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Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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