Rotting Christ subverte estigmas do black metal durante show caloroso em Brasília

Estreante na cidade, banda grega elucida por que é uma das mais acessíveis no ramo e como atrai até quem não morre de amores pelo gênero

Nada de corpse paint, riffs gélidos em consonância com uma bateria reta e na velocidade da luz, tampouco aquela postura, meticulosamente calculada, de poucos amigos. Se um desavisado cai de paraquedas no show atual do Rotting Christ, dificilmente dirá que se trata de um expoente clássico do black metal.

Em vez disso, a apresentação da banda dos irmãos Tolis (Sakis, vocal e guitarra, e Themis, bateria) é repleta de carisma com cara limpa, interação constante com o público e um tipo de combinação quente entre melodia e ritmo, por vezes pulsante e cadenciado, que é marca registrada da vertente grega do estilo.

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Foto: Rodrigo Piruka

Prova disso foi o show caloroso em Brasília na noite de sábado (2), em que Sakis e Themis, acompanhados de Kostis Foukarakis (guitarra) e Kostas Heliotis (baixo), subverteram vários estigmas do black metal. Mesmo na estrada há 35 anos, foi a primeira vez que a banda de Atenas, na Grécia, tocou na cidade, e ficou evidente o forte apelo do quarteto para além de seu próprio gênero.

Foto: Rodrigo Piruka

Abertura condizente

O público não chegou a lotar as dependências do já recorrente Toinha, mas compareceu em bom número. A abertura ficou a cargo do Paradise in Flames, que fez um show correto e bem-recebido pela galera que já havia entrado.

O grupo de Belo Horizonte aposta em um black metal com forte presença de teclados e, em certas passagens, até três vocalistas distintos: A. Damien (vocal e guitarra), O. Mortis (vocal) e Guilherme de Alvarenga (teclado/backing vocals).

Ao todo, tocaram 11 músicas no set de 40 minutos — números consideráveis em se tratando de uma atração de abertura. “The Way to the Pentagram” e “Last Breath” foram as mais aplaudidas. Destaque para o vocal feminino de O. Mortis, embora em alguns momentos tanto recurso técnico e dramaticidade até passem um pouco do ponto.

A lenda helênica

O Rotting Christ entrou em ação às 21h50, com um palco sem backdrop ou qualquer tipo de adereço. Nem mesmo o logo da banda ou a sigla Χ Ξ Σ — 666, no alfabeto grego — foram exibidos em Brasília. Não que tenham feito falta.

Foto: Rodrigo Piruka

Já o repertório foi idêntico ao do show de São Paulo, que abriu a turnê pelo Brasil na última quinta-feira (29). Logo de cara, a dobradinha “666” e “P’unchaw Kachun – Tuta Kachun”, do álbum “Kata Ton Daimona Eaytoy” (2013), confirmou que esse seria o trabalho mais privilegiado pelo banda, com cinco de suas 10 faixas sendo executadas.

Agindo não só como vocalista e guitarrista, mas como frontman dedicado, Sakis incitou o público a todo instante, com gestos, palavras em português ou contagens de “1, 2, 3!”. O baixista Kostas Heliotis também fez caras e bocas e de tudo um pouco para cativar os fãs. Deu certo, pois quase sempre a resposta vinda da pista se mostrou positiva.

Foto: Rodrigo Piruka

Do imprevisto ao ápice

Após a execução de “Pix Lax Dax”, ótima música nova que estará no disco “Pro Xristou” — a ser lançado em 24 de maio —, houve o único contratempo do show. A banda já havia dado início a “King of a Stellar War”, quando o baterista Themis Tolis se enfureceu com o que pareceu ser um roadie e não entrou como deveria. Muito irritado com algum problema em seu kit, gesticulou com raiva e puxou a cortina cobrando algum tipo de ajuda. Em instantes, porém, a situação foi contornada, e retomaram a canção que abre o clássico “Triarchy of the Lost Lovers” (1996).

Foto: Rodrigo Piruka

Esse miolo do setlist foi um dos dois ápices da apresentação. Músicas como “Archon” e a contundente “Non Serviam” abriram as primeiras rodas na pista e agradaram em cheio os apreciadores do material mais antigo da banda, que não vive presa ao passado, mas sabe da força de seu legado. Inclusive na hora de inserir “Societas Satanas”, cover do conterrâneo Thou Art Lord, que conta com Sakis e Magus Wampyr Daoloth, velho tecladista dos primórdios (1991-1995) do Rotting Christ.

O segundo pico da noite veio com a acachapante “The Sign of Evil Existence”, com seus meros dois minutos de pura violência, num dos raros momentos em que o show beira o black metal cru e opressor típico da Noruega, e “Fgmenth, Thy Gift”, talvez a música que melhor define o aspecto maligno presente na obra do Rotting Christ. Ambas são oriundas do debut “Thy Mighty Contract” (1993).

(Não tão) Maligna Existência

Terminado o show e passados alguns minutos de descanso no camarim, todos os quatro integrantes retornaram e atenderam pacientemente os fãs que queriam fotos, autógrafos ou só trocar ideia. Uma espécie de “meet & greet” espontâneo.

Foto: Rodrigo Piruka

De certa forma, tudo isso comprova que o Rotting Christ é um dos nomes mais acessíveis do black metal mundial não somente no âmbito sonoro, atraindo para si até quem não morre de amores pelo gênero, mas também em termos de comportamento, fidelizando uma audiência cativa por onde transita.

*A turnê no Brasil ainda passa por Belo Horizonte neste domingo (3). Clique aqui para ingressos. Mais fotos no fim da página.

Foto: Rodrigo Piruka

Rotting Christ – ao vivo em Brasília

  • Local: Toinha
  • Data: 02 de março de 2024
  • Turnê: 35 Years of Evil Existence

Repertório — Rotting Christ:

  1. 666
  2. P’unchaw Kachun – Tuta Kachun
  3. Demonon Vrosis
  4. Kata Ton Daimona Eaytoy
  5. Apage Satana
  6. In the Name of God
  7. Pix Lax Dax
  8. King of a Stellar War
  9. Archon
  10. Non Serviam
  11. Societas Satanas (cover de Thou Art Lord)
  12. In Yumen – Xibalba
  13. Grandis Spiritus Diavolos
  14. The Raven
  15. Noctis Era

Bis:

  1. The Sign of Evil Existence
  2. Fgmenth, Thy Gift

Repertório — Paradise in Flames:

  1. Intro
  2. Concerto n.6
  3. Unseen God
  4. Have Never Seen a World Without Wars
  5. Dancer of the Mist
  6. Old Ritual to an Ancient Curse
  7. Bringer of Disease
  8. The Way to the Pentagram
  9. I Feel the Plague
  10. Last Breath
Foto: Rodrigo Piruka
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Foto: Rodrigo Piruka
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Guilherme Gonçalves
Guilherme Gonçalves
Guilherme Gonçalves é jornalista formado pela Universidade Federal de Goiás (UFG). É repórter do Globo Esporte e atua no jornalismo esportivo desde 2008. Colecionador de discos e melômano, também escreve sobre música e já colaborou para veículos como Collectors Room e Rock Brigade. Revisa livros das editoras Belas Letras e Estética Torta e edita o Morbus Zine, dedicado ao death metal e grindcore.

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