Mark Knopfler veio pela última vez ao Brasil em abril de 2001, com direito a uma série de três shows no Credicard Hall (hoje Vibra São Paulo). Como o músico nunca mais retornou, a saída de quem se sente meio “órfão” desde então é partir para alternativas como o Dire Straits Legacy.
Dados os devidos descontos, quem foi ao Espaço Unimed no último domingo (7) para assisti-los não se arrependeu. Mas foi show de covers? Tributo? Banda oficial de ex-membros? De tudo um pouco.
E foi de espírito leve e sem cobranças que partimos ao antigo Espaço das Américas num agradável entardecer dominical para acompanharmos o que faria o tecladista Alan Clark, sem dúvida o músico mais renomado do projeto, acompanhado de Marco Caviglia (voz e guitarra), Jack Sonni e Phil Palmer (guitarras), Max Gazzè (baixo), Primiano Di Biase (teclados), Mel Collins (saxofone, flauta e clarinete), Danny Cummings (percussão) e Cristiano Micalizzi (bateria).
*Fotos de Gabriel Gonçalves / @dgfotografia.show. Role para o lado para ver todas. Caso as imagens apareçam pequenas, atualize a página.
Um Mark Knopfler italiano
Marcado para as 19h30, o show começou com 18 minutos de atraso sob a justificativa de que parte do público pudesse se acomodar nos assentos numerados. Na prática, terminando às 21h54 (sim, passou de duas horas!), não houve transtornos ou atropelos para ninguém ir embora.
Com intro ao som de “Day One”, tema de “Intestellar”, filme de 2014 estrelado por Matthew McConaughey e Anne Hathaway, fotos no telão de fundo foram dispostas em painéis, quase como cartas de baralho, anunciaram o conjunto. Uma dobradinha de “Making Movies” (1980) efetivamente abriu os trabalhos: “Expresso Love” e “Skateaway”. Leve como um elogio, mas se você cerrasse os olhos e apenas escutasse o italiano Caviglia cantando sem sotaque, era possível crer se tratar de Mark Knopfler – futuramente, nos vários agradecimentos, dava para notar um quê latino.
Com leves pitadas de reggae – daí as luzes verdes e amarelas, faltando apenas os tons avermelhados para a referência completa à Jamaica –, “Ride Across the River”, ainda que do álbum “Brothers in Arms” (1985) e com Mel Collins tocando flauta, não exatamente empolgou, diferentemente de “Tunnel of Love”, bastante aplaudida.
Movimento arriscado
Depois das mencionadas, talvez sem se dar conta, o Dire Straits Legacy se meteu numa cilada: a menos que você fosse um profundo conhecedor da discografia dos ingleses, faltavam os grandes hits para dar uma agitada nos fãs na primeira metade do show.
Ainda neste bloco, fizeram “Romeo and Juliet”, com excepcional momento de destaque a Collins ao clarinete, aplaudido de pé. Super intimista, foi perfeita para os casais – e havia muitos deles –, mas as próximas escolhas não ajudaram no quesito animação: “Telegraph Road” e “Private Investigations”. E a questão não passava pela qualidade técnica ou do som, porém, a incidência de idas ao banheiro aumentava. Se por um lado os ases foram guardados para depois, criando a expectativa de um final empolgante, por outro, faltava apelo ao fã mediano.
Isso quer dizer que estava ruim? Musicalmente, sabendo apreciar, não. Porém, em meio às longas composições, por que não pinçar quaisquer duas mais conhecidas do seminal “Brothers In Arms” (1985) como, por exemplo, a quarta e a oitava do repertório? Enfim, o cenário só passou a melhorar passando de uma hora no relógio, com “Your Latest Trick”.
O DJ vira o disco
Agora, quer o ponto efetivo da mudança? “Walk of Life”, um tanto pela música, mas principalmente por um convite de Marco: por ser um show de rock, as pessoas deveriam se levantar e ir à frente. Aí, virou aquela “bagunça respeitosamente organizada”, com quem quisesse podendo chegar à primeira fila para se espremer de pé. Quem pagou caro por tais lugares deve ter ficado pistola, mas, de fato, a festa começara como se um DJ houvesse virado o disco!
Teria sido fácil apostar em “Calling Elvis”, porém, fiéis à decisão de fugir das obviedades, a dançante “The Bug” foi a única do derradeiro álbum “On Every Street” (1991). E finalmente chegando ao disco de estreia homônimo de 1978, se saíram com “Setting Me Up”, evidenciando uma pegada country, e a inigualável “Sultans of Swing”. É preciso descrever seu efeito no “bailão” em que se transformou a “pista”? Para ser sucinto, houve gritos, gente se emocionando para valer, mas não precisavam ter deixado Marco encarregado do solo… em todo caso, a finalização em rearranjo melódico ficou sensacional!
Final apoteótico
Houve até tempo e espaço para a extremamente contagiante “Two Young Lovers”, faixa do EP “ExtendedancEPlay” (1983), precedendo a última do set regular e maior razão pela qual todos terem saído do conforto de casa, sejamos sinceros: bastou o “I want my… I want my MTV” começar a soar no microfone de Alan Clark para o nível de expectativa e a quantidade de assobios subirem de vez! Sim, “Money for Nothing” (and chicks for free)! Perfeita!
Meio na dúvida se o repertório se encerrara, ninguém arredou pé e a recompensa veio em “Brothers in Arms”. E se Marco, visualmente um Dallas Green sem tatuagens e um tanto mais velho, deixara um pouco a desejar no solo de “Sultans”, ele compensou na performance do que certamente foi o ponto de maior seriedade da noite em função de sua letra sóbria.
Para quem reparou no nome da turnê, o “For You” na pele do bumbo, logo acima de um “DSL Dire Straits Legacy”, com um “World Tour” abaixo, a ressignificação na homenagem a um amigo do grupo chamado “Ricky” ficou incompleta, uma vez que mais detalhes referentes à identidade não foram fornecidos pelo vocalista.
A saideira foi “So Far Away”, com Parmiano na sanfona e depois vindo à frente com uma bandeira do Brasil. Os caras só não fecharam o lado A inteiro do álbum “Brothers in Arms”, algo de valor para os mais “experientes” que cresceram ouvindo o vinil, porque faltou “Why Worry” – até porque, arredondando para baixo, a maior parte dos presentes eram pré-adolecentes à época do estouro do álbum. Basta fazer as contas, mas o mais legal foi ver filhos acompanhando os pais!
Uma curiosidade a quem se acostumou a assistir a bandas de metal, especialmente em festivais, com o tempo limitado: houve uma sensível contraposição e nenhuma composição se emendou à seguinte, tornando bastante evidente quando uma terminava e outra se iniciava. E foi interessante constatar que algumas se estenderam em relação às versões de estúdio, especialmente “Romeo and Juliet” e “Sultans of Swing” – já para o caso de “Telegraph Road”, grande o suficiente em “Love Over Gold” (1982), seria ousadia demais tentar aumentá-la!
O rolê, de fato, começou um tanto esquisito e aparentemente sem vibração – previamente sabendo o fluxo do repertório, com tantas músicas obscuras seguidas de tantos hits de uma só vez, a percepção do espetáculo talvez teria sido outra. Contudo, seu final foi apoteótico. Ao som de “Time Out of Mind” (Steely Dan) ecoando pelo recinto, calmamente as pessoas tomavam seus rumos. Não faltavam sorrisos nos rostos ou comentários como: “showzão”.
Por fim, alheias ao que acabara de ocorrer, foi engraçado ver adolescentes acampadas e formando fila para verem Jackson Wang dentro de oito dias! Cada um com seu legado – e o do Dire Straits permanece vivíssimo.
*O Dire Straits Legacy segue em turnê pelo Brasil. Clique aqui para conferir datas e locais.
Dire Straits Legacy – ao vivo em São Paulo
- Local: Espaço Unimed
- Data: 7 de abril de 2023
Repertório:
Intro: Day One [Hans Zimmer]
- Expresso Love
- Skateaway [Sem Mel Collins]
- Ride Across The River
- Tunnel Of Love [Sem Mel Collins]
- Romeo And Juliet [Sem Danny Cummings / Jack Sonni]
- Telegraph Road [Sem Mel Collins / Jack Sonni]
- Private Investigations [Sem Jack Sonni]
- Your Latest Trick [Sem Jack Sonni]
- Walk Of Life
- The Bug
- Setting Me Up
- Sultans Of Swing [Sem Mel Collins / Danny Cummings]
- Two Young Lovers
- Money For Nothing
Bis:
- Brothers In Arms [Sem Jack Sonni]
- So Far Away
Outro: Time Out Of Mind [Steely Dan]
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Tocaram no interior de São Paulo e infelizmente a mídia anunciou como Dire Straits e não Dire Straits Legacy, uma banda cover. Mas acredito que a banda não agiu de má fé, e sim, os meios de comunicação.