No dia 8 de maio de 1970, a carreira dos Beatles ganhava um ponto final em definitivo com o lançamento do álbum ‘Let It Be’, último da discografia do quarteto. Semanas antes, Paul McCartney já havia anunciado a banda havia acabado – o primeiro trabalho solo dele, ‘McCartney’, saiu em 17 de abril daquele ano.
Embora McCartney tenha sido o encarregado por dar o recado, não foi ele quem deu fim aos Beatles. Foi John Lennon, com sua saída do grupo no fim de 1969. “Quem acabou com os Beatles foi John. Não acho que ninguém tentou apontar o dedo para ninguém, mas foi dessa forma. Foi feita uma reunião em que John disse: ‘ei, pessoal, estou saindo da banda’”, disse Macca, em 2018, durante entrevista a Howard Stern.
O clima ruim nos bastidores e o material oscilante fez de ‘Let It Be’ um dos álbuns mais controversos da carreira dos Beatles. Os caras que eram exaltados por praticamente todo mundo, inclusive os críticos musicais mais rígidos, lançaram um disco mediano. Como assim? Pois é…
As tretas foram tamanhas que, logo no início das gravações, George Harrison anunciou que estava saindo da banda. Ele acabou voltando, mas impôs algumas condições que tiveram de ser aceitas. As gravações tiveram sequência, mas o material acabou engavetado. No meio disso tudo, o Fab Four resolveu gravar ‘Abbey Road’, que acabou sendo lançado ainda em 1969. Depois, retomaram ‘Let It Be’, ainda com o título provisório ‘Get Back’, e concluíram já sem Lennon e com o fim decretado.
Apesar de ligeiramente irregular, ‘Let It Be’ é um disco curioso e que traz músicas realmente boas. A faixa título é um clássico atemporal, enquanto ‘Get Back’ dava o tom do que poderíamos ter ouvido se os Beatles continuassem: um som mais orientado ao que conhecemos hoje como classic rock, de instrumental mais maduro, ainda que não tão inovador. ‘Across the Universe’ e ‘The Long and Winding Road’ são belas canções. E por aí vai.
A seguir, listo 10 curiosidades sobre ‘Let It Be’, um dos álbuns mais intrigantes dos Beatles.
1) Último, mas não o último dos Beatles
Como citei anteriormente, ‘Let It Be’ foi gravado antes mesmo de ‘Abbey Road’, mas este foi lançado antes.
Os ensaios para ‘Let It Be’ começaram, em janeiro de 1969, no Twickenham Film Studios. A ideia era lançar um documentário que retratasse todo o processo de composição do álbum, além de mostrar como seria a volta dos Beatles para os palcos – com direito a um show-surpresa, conhecido como Rooftop Concert, realizado no topo do prédio da Apple Corps, empresa da banda, em 30 de janeiro de 1969.
A ideia original veio do produtor e maestro George Martin, que recomendou “gravar um álbum de material inédito, ensaiar para tocar ao vivo e apresentar em um show antes do disco ser lançado – gravando tudo isso”. A ideia era transformar os registros audiovisuais em um programa de TV, chamado ‘Beatles at Work’.
Não deu certo. Tudo foi filmado, mas não rendeu um programa, nem uma volta definitiva dos Beatles aos palcos. Isso será explicado no próximo item.
Em abril de 1969, os Beatles lançaram ‘Get Back’ como single, depois que o engenheiro de som Glyn Johns trabalhou em versões de um álbum que acabaram rejeitadas pelos músicos. O disco foi engavetado e a partir daí, o Fab Four passou a focar em outro disco, ‘Abbey Road’, lançado em setembro.
Já entre o fim de 1969 e início de 1970, os Beatles – sem John Lennon – retomaram o álbum que se tornaria ‘Let It Be’. ‘I Me Mine’, composição de George Harrison que nem estava prevista para o disco, foi gravada já no novo ano e nem tem a participação de Lennon.
As filmagens sobre as gravações do álbum renderam um documentário, lançado em 1970, que chegou a ganhar um Oscar por Melhor Trilha Sonora Original.
2) Tretas e saídas
A ideia era que ‘Let It Be’ incentivasse uma volta dos Beatles aos palcos. Ou, ao menos, era o que Paul McCartney desejava. Os outros três discordavam – especialmente George Harrison, que não gostava da rotina da Beatlemania, quando o grupo ainda fazia shows. Vale lembrar que o Fab Four decidiu não se apresentar mais ao vivo, focando apenas em álbuns, em 1966.
A proposta de voltar a fazer shows também não era admirada pelos colegas porque eles não estavam se dando bem. Desde as gravações do lendário ‘White Album’, em 1968, as brigas eram frequentes – Ringo Starr, diga-se de passagem, também saiu da banda naquele período.
- Leia também: A ocasião em que Ringo Starr saiu dos Beatles
Durante as gravações de ‘Let It Be’’ as tretas chegaram ao auge, especialmente entre George Harrison e John Lennon. Insatisfeito com tudo, Harrison chegou a sair da banda por uma semana, sendo convencido a voltar após algumas exigências serem aceitas – como migrar do gélido e cavernoso estúdio Twickenham para o recém-construído da Apple Corps e trazer o talentoso pianista Billy Preston para participar das sessões de gravação.
‘Let It Be’ teve suas malfadadas sessões realizadas e foi engavetado para ‘Abbey Road’ ser concebido. Quando o disco em questão foi lançado, em setembro de 1969, John Lennon anunciou aos colegas que estava de saída dos Beatles. E nada de tentar convencê-lo a mudar de ideia, como fizeram com Harrison.
Lennon concordou em não divulgar essa informação para ninguém e os demais trabalharam para lançar ‘Let It Be’ do jeito que estava mesmo, só com um tapa adicional na produção. E que tapa! Isso será explicado mais adiante.
3) Um quinto Beatle
Algumas pessoas ganharam o título de “quinto Beatle” e, talvez, George Martin seja o maior merecedor, já que moldou o som dos Beatles como ninguém. Porém, na prática, o único músico a ser creditado em um lançamento dos Beatles fora do grupo foi Billy Preston, no single de ‘Get Back’, que anuncia “The Beatles with Billy Preston”. Por isso, ele também é chamado de “quinto Beatle”.
– Leia também: Billy Preston, o ‘quinto Beatle’ e o ‘sexto Stone’
A presença dele nas sessões de gravação de ‘Let It Be’ foi exigida por George Harrison como uma das condições para voltar à banda. No fim das contas, deu tão certo que Preston tocou em uma série de músicas do álbum: ‘Dig a Pony’, ‘I’ve Got a Feeling’, ‘One After 909’, ‘The Long and Winding Road’, ‘Dig It’ e a faixa título, além da já citada ‘Get Back’, que traz até um solo de órgão tocado por ele.
Preston já era um velho conhecido dos Beatles, pois, em 1962, fazia parte da banda de Little Richard, para quem os Beatles abriram em um show na cidade natal da banda, Liverpool, na Inglaterra. Eles retomaram o contato em 1969, quando Harrison deixou o grupo. Numa noite qualquer, o guitarrista foi a um show de Ray Charles em Londres e Billy estava tocando órgão. Foi aí que rolou o convite – e a condição para o retorno.
Todos mencionam que a musicalidade e a personalidade de Billy Preston ajudaram a atenuar as brigas. Não à toa, o músico ganhou tanto espaço em ‘Let It Be’ e chegou a contribuir com ‘Abbey Road’, tocando em ‘I Want You (She’s So Heavy)’ e ‘Something’. Ele também participa do lendário Rooftop Concert e, após o fim dos Beatles, seguiu tocando com George Harrison, além de colaborações com Eric Clapton, Rolling Stones e outros e uma carreira solo prolífica.
Em dado momento das sessões de ‘Let It Be’, John Lennon chegou a recomendar a entrada de Billy Preston para os Beatles. Paul McCartney discordou, mas não por desgostar de Preston – ele dizia que já era difícil demais chegar a um acordo entre quatro pessoas, imagine entre cinco.
4) O show dos Beatles no Rooftop
O lendário Rooftop Concert aconteceu em 30 de janeiro de 1969 – curiosamente, mais de um ano antes de ‘Let It Be’ ser lançado. A apresentação durou 42 minutos e causou euforia por quem passava na Savile Row, em Londres, onde o prédio da Apple Corps estava situado.
Era para o show ter durado mais, mas sabe por que não rolou? Vizinhos chamaram a polícia, pois o som estava incomodando. Situações que não imaginamos acontecendo nos dias de hoje…
Foram tocadas as seguintes músicas, nesta ordem:
‘Get Back’ (em dois takes)
‘Don’t Let Me Down’
‘I’ve Got a Feeling’
‘One After 909’
‘Dig a Pony’
‘I’ve Got a Feeling’ (segundo take)
‘Don’t Let Me Down’ (segundo take)
‘Get Back’ (terceiro take)
Três dessas performances acabaram saindo, daquele mesmo jeito, no álbum ‘Let It Be’. São elas: o primeiro take de ‘I’ve Got a Feeling’ e as gravações de ‘One After 909’ e ‘Dig a Pony’.
5) ‘Get Back’, o álbum?
Em abril de 1969, o single de ‘Get Back’ foi lançado, mas o material gravado até então não chegou a evoluir para um álbum. Curiosamente, o disco também seria intitulado ‘Get Back’, e não ‘Let It Be’. Teria uma capa inspirada no álbum ‘Please Please Me’, com os músicos já mais velhos.
Na época, os Beatles estavam trabalhando mais diretamente com o engenheiro de som Glyn Johns, que mixou versões do disco para ver se os músicos aprovavam. Rolaram alguns “nãos”.
Quando as gravações foram concluídas, John Lennon e Paul McCartney haviam dado liberdade total para Glyn Johns construir o álbum que quisesse com aqueles materiais. Enquanto isso, os Beatles focariam em ‘Abbey Road’.
A primeira versão com ares definitivos foi finalizada em 28 de maio. As gravações do Rooftop Concert não foram utilizadas, com exceção de ‘One After 909’. Glyn Johns preferiu utilizar registros de estúdio, especialmente dos primeiros dias, a exemplo de músicas como ‘I’ve Got a Feeling’ e ‘Dig a Pony’ – na época, intitulada ‘All I Want Is You’. Também foram incluídas uma jam chamada ‘Rocker’, um breve cover de ‘Save the Last Dance for Me’ (Drifters) e a faixa ‘Don’t Let Me Down’, que, no fim das contas, só saiu como B-side do single de ‘Get Back’.
Não rolou. ‘Let It Be’ foi engavetado de novo.
Em dezembro de 1969, os Beatles pediram a Glyn Johns que outra versão fosse feita, com uma ordem: as músicas deveriam bater com as que estavam no documentário. Entre as principais diferenças dessa segunda versão, está uma remixagem de ‘Across the Universe’, originalmente gravada em 1968, e ‘I Me Mine’, gravada de última hora e, nesta versão, apenas com George Harrison e Ringo Starr.
Não rolou de novo. ‘Let It Be’ só foi lançado em uma terceira versão, que contou com o trabalho de Phil Spector.
6) Phil Spector, o vilão?
No início de 1970, Phil Spector foi chamado para fazer trabalhos de pós-produção. O material já estava gravado – ele só iria dar um “tapa”, deixando mais produzido, trabalhando em algumas mixagens e overdubs.
Spector já era um dos produtores musicais mais requisitados do mundo naquele momento. Após trabalhar com diversas ‘girl groups’ nos anos 1960, ele desenvolveu uma técnica chamada “wall of sound”, que consistia em criar uma estética densa e cheia de reverb, inserindo várias gravações do mesmo instrumento que formariam, de fato, uma “parede de som”. A ideia era oferecer uma sonoridade boa para jukeboxes e aparelhos de rádio AM, tão populares naquele período.
Curiosamente, os Beatles já sabiam do estilo “denso” da produção de Phil Spector. Mesmo assim, o chamaram para concluir o álbum, que já havia sido produzido por George Martin e, indiretamente, Glyn Johns.
O trabalho de Spector acabou não agradando, apesar de apenas três músicas terem ganhado a “wall of sound”: ‘Across the Universe’, ‘I Me Mine’ e a mais afetada, ‘The Long and Winding Road’, uma balada só com piano e voz que acabou ganhando muitos instrumentos eruditos de corda e corais femininos. Ele também foi o responsável por tirar ‘Don’t Let Me Down’ da tracklist – o que acabou se tornando um erro, já que muitos fãs adoram a música – e incluiu a já mencionada ‘Across the Universe’, que foi gravada em 1968.
‘For You Blue’ e ‘Let It Be’ também ganharam overdubs, ainda que fora do estilo “wall of sound”. Ao todo, apenas as seguintes músicas foram lançadas sem interferências na gravação original: ‘I’ve Got a Feeling’, ‘One After 909’, ‘Dig a Pony’, ‘Two of Us’, ‘Dig It’, ‘Get Back’ e a vinheta ‘Maggie May’. As três primeiras, como citado anteriormente, vieram do Rooftop Concert. Já as quatro últimas são das sessões em estúdio.
Paul McCartney, em especial, foi o mais crítico ao resultado obtido por Phil Spector. Porém, John Lennon o defendeu, dizendo à Rolling Stone, em 1971: “Ele recebeu as piores gravações possíveis, com uma sensação muito ruim, e tirou algo dali. Ele fez um grande trabalho”.
Vale lembrar que, muitos anos depois, foi lançada uma versão do álbum sem as alterações de Phil Spector, intitulada ‘Let It Be… Naked’.
7) John Lennon não curtia a música ‘Let It Be’
A faixa que dá título ao álbum ‘Let It Be’ merece um item a parte, já que se tornou, talvez, a música mais famosa do disco – e uma das mais populares dos Beatles. Curiosamente, John Lennon não era grande fã da música, para dizer o mínimo.
Apesar de ter autoria creditada a John Lennon e Paul McCartney, a concepção da música é praticamente toda deste último. Aliás, é importante lembrar que a parceria Lennon/McCartney, às vezes, ficava só no papel, já que os músicos compuseram diversas músicas sozinhos.
A inspiração de McCartney para ‘Let It Be’ era o próprio momento turbulento pelo qual os Beatles viviam no fim da década de 1960. A banda estava na iminência de se separar, mas Paul acreditava ser o único integrante disposto a trabalhar para que todos permanecessem juntos. Foi aí que sua mãe, Mary, que faleceu em 1956, apareceu em um sonho de Macca com o recado: “deixa rolar” (“let it be”, em tradução grosseira para o português).
O problema é que, apesar de ter concordado em gravar ‘Let It Be’, John Lennon não era grande fã da música. Em entrevista à revista ‘Playboy’, transcrita no livro ‘All We Are Saying’ (lançado no Brasil como ‘A Última Entrevista do Casal John Lennon e Yoko Ono’), escrito por David Sheff, Lennon fez críticas à música em meio a perguntas feitas por um entrevistador insistente.
“Isso é o Paul. O que você pode dizer? Nada a ver com os Beatles. Poderia ter sido gravada pelo Wings. Não sei no que ele estava pensando quando fez ‘Let It Be’. Talvez tenha ouvido uma música gospel. Não, acho que foi inspirada por ‘Bridge Over Troubled Water’ (Simon & Garfunkel). Essa é a minha sensação, embora eu não tenha nada além para dizer. Sei que ele queria fazer uma ‘Bridge Over Troubled Water’”, afirmou Lennon, que, embora tenha sido bastante sincero, não parecia ter a intenção de atacar o colega.
8) Vendas de ‘Let It Be’
Por ser um álbum disfuncional e lançado quando os Beatles já haviam acabado – ou seja, sem nenhuma estratégia específica de divulgação –, ‘Let It Be’ não teve vendas tão boas quanto as de seus icônicos antecessores.
Ainda assim, deu um banho em muita banda cultuada em termos comerciais. O álbum chegou ao primeiro lugar das paradas de Estados Unidos, Reino Unido, Canadá e Austrália, entre outros. Os singles de ‘Get Back’, ‘Let It Be’ e ‘The Long and Winding Road’ agradaram, conquistando pelo menos disco de platina nos EUA, além da faixa título obter disco de prata em terras britânicas.
As certificações consolidadas do trabalho mostram, porém, que a repercussão era, e ainda é, diferente. Entre os álbuns de estúdio lançados na segunda fase dos Beatles, mais madura e que muitos consideram ter sido iniciada em ‘Rubber Soul’ (1965), foi o que menos vendeu nos Estados Unidos, com “apenas” 4x platina pelas 4 milhões de cópias vendidas no país – para efeito de comparação, os três antecessores conquistaram disco de diamante, pelas mais de 10 milhões de unidades comercializadas.
No Reino Unido e Austrália, ‘Let It Be’ conquistou disco de platina, enquanto que no Canadá, a certificação foi de platina tripla. Morno, mas ainda satisfatório diante das condições apresentadas.
9) Crítica
Os fãs e geeks musicais da época, certamente, perceberam algo sobre ‘Let It Be’: os críticos especializados estavam, pela primeira vez em muito tempo, fazendo avaliações negativas de um trabalho dos Beatles. Até por isso, tornou-se um álbum tão controverso com o passar dos anos.
O jornalista John Mendelsohn, da Rolling Stone, detonou principalmente a produção polida de Phil Spector. “Musicalmente, os garotos passaram no teste, mas em termos de julgamento para evitar a superprodução do mais notório de todos os superprodutores, não”, disse, em trecho de sua crítica.
Alan Smith, da NME, afirmou: “Se essa for a última trilha sonora dos Beatles, será um epitáfio barato, uma lápide de papelão, um final triste e desarrumado de uma fusão musical que se renovou e deixou o rosto do pop atraente de novo”.
Derek Jewell, do Sunday Times, fez uma avaliação menos negativa. Para ele, o álbum é como “um testamento e um último desejo, do encarte funerário na cor preta à música em si, que resume muito do que os Beatles foram – inigualavelmente brilhantes em seu auge, descuidados e autoindulgentes nos momentos de baixa”.
10) Sucessor de ‘Let It Be’
Antes de John Lennon sair dos Beatles, em setembro de 1969, havia um planejamento para um novo álbum dos Beatles – e, ao que tudo indica, ‘Abbey Road’ influenciaria mais esse trabalho do que ‘Let It Be’. Essa informação foi revelada apenas em 2019, por um expert da banda chamado Mark Lewisohn, que encontrou uma gravação de áudio de uma reunião entre os músicos.
John Lennon, Paul McCartney e George Harrison se juntaram na Apple Corps ainda em 1969. Ringo Starr não foi à reunião, pois estava tratando de um problema no intestino em um hospital. Foi por causa do baterista, inclusive, que a conversa foi registrada – “Ringo, você não pode estar aqui, mas estamos fazendo isso para você ouvir o que estamos debatendo”, diz Lennon, logo no começo da gravação.
A conversa entre os três músicos girou em torno do planejamento de um novo álbum. Eles ainda pensavam em lançar um single no Natal de 1969 – uma estratégia comercial típica dos tempos de Beatlemania.
John sugere que os demais músicos tragam suas composições e chega a indicar uma fórmula para dar mais espaço a George Harrison e Ringo Starr. A ideia era que o disco contasse com quatro músicas para McCartney, Lennon e Harrison, igualmente. Starr poderia trazer duas canções se quisesse.
John chega a fazer menção ao “mito da parceria Lennon/McCartney”, dando a entender que as canções seriam creditadas individualmente naquele momento. As composições eram sempre atribuídas à dupla, mesmo que apenas um deles fosse o responsável pela concepção.
Ainda na gravação, Paul McCartney diz que, “até este álbum” (provavelmente em menção a ‘Abbey Road’), ele não achava que as músicas de George Harrison eram tão boas. O guitarrista responde: “É uma questão de gosto. Até agora, as pessoas estão curtindo minhas músicas”. E olha que estamos falando de Harrison, o cara que apresentou ‘While My Guitar Gently Weeps’, ‘Something’, ‘Here Comes the Sun’ e tantas outras canções.
O pesquisador Mark Lewisohn comentou: “Os livros sempre diziam que eles sabiam que ‘Abbey Road’ seria o último álbum e que eles queriam encerrar no ápice artístico. Porém, não: eles discutiram um próximo álbum. E você pensa que John queria o fim da banda, mas quando você ouve a fita, descobre que não”.
Raramente vejo artigos sobre os Beatles com tantos acertos, escrito com tanto cuidado. Sim, penso que algumas coisas talvez não tenham sido exatamente assim, mas não temos como saber nada ao certo, mesmo porque as histórias, em se tratando de Beatles, mudam a toda hora. Mas está respeitoso para com eles e bastante informativo focando mais no que foi feito e menos nas desavenças daquele Times of Trouble como cantou Paul. Só por isso o autor já merece meu respeito e aplauso. E agradecimento. Sei que fala um pouco dos problemas, mas não há como não mencionar pois é parte da História. Apenas não dá ênfase.
Eu confesso não considerara Let it Be como um album dos Beatles. Eu adoro o álbum. Mas não é deles. Para mim é um álbum de Phil Spector com músicas dos Beatles. Mas é a visão do grande ( e totalmente insano) Phil Spector. Nao é a visão Beatle e por isso não tem o mesmo sabor. Mesmo assim é muito saboroso com músicas que se tornaram clássicas.
Apesar de entender a digamos que revolta de Paul ( afinal seria um disco de volta às raízes como foi sugerido por George Harrison que, por sua vez, inspirou-se no experiência semelhante de Bob Dylan) eu sei que lá dentro ele até gostou do arranjo para The Long and Winding Road. Sei porque ele usa arranjo bem parecido nos seus shows! Também gosto muito do seu arranjo para Across the Universe. Gente, ficou lindo demais. O problema maior para mim é outro: a inclusão de falas de John Lennon entre uma faixa e outra. O que parecia bacaninha fazendo com que a gente se sentisse lá dentro do estúdio ouvindo suas conversas era, na verdade, ataques sem sentido contra Paul. E contra Linda. E isso tudo porque viviam os tempos tenebrosos mencionados em Let it Be. Sempre bom lembrar que eles sairam dessa em 1974. Paul e John voltaram a ser amigos e até cantaram Stand by Me num estúdios em Los Angeles. Após seu falecimento os outros tres fizeram uma beleza de Antologia com presença da voz de John. Em total harmonia. É sempre bom falar porque gostam de perpetuar as brigas como se tudo tivesse acabado ali. Não foi assim.
Sim, John criticou a música Let it Be, mas isso não significa que não gostasse da música. Pode até ser. Mas John mudava de ideia a todo momento. Pode bem ser que não gostou da letra porque, evidentemente, era sobre o que estavam vivendo. “There is still a chance that they will see…” é direto para seus companheiros. Esperança de que eles acordem. A carapuça assentou e ele tinha de dizer alguma coisa contra. So que Bridge Over trouble water saiu bem depois de Let it be.
Quanto a fita…Sou ouvimos falar sobre ela. Nunca ninguém ouviu seu teor. Será que realmente existe? Pode ser. Mas para saber seria importante ouvir. Saber o tom com que tudo foi dito. Paul estaria sendo verdadeiro ou fazendo uma brincadeira sobre as músicas de George? Vai depender do tom da conversa. Digo isso porque contradiz o que ele já disse outras vezes: que ele gostava das músicas de George. De qualquer forma ele está reconhecendo sua incrível melhora nas composições e concordando, ao que parece, com mais espaço nos albums para suas músicas.
Eu, pessoalmente, não vejo John mostrando interesse algum em outro dísco. Vejo uma proposta de terminar com a banda. Ao proclamar o final total da parceria Lennon/McCartney estava proclamando o final dos Beatles. Saiu com aquela proposta sabendo que não seria aceita e nem poderia ser aceita. The Beatles sem Lennon/McCartney não seria the Beatles. Sim, bem sei que algumas músicas ( na verdade poucas músicas) não era parceria. Mas de um modo geral, mesmo que grande parte fosse de apenas um, sempre havia participação do outro. E até de todos. Os Beatles formavam um time.
Pegamos por exemplo Come Together. Muitos falam que é de John. E isso aconteceu já em 69, tempo que mais compuseram separados. Pois John levou a música para Paul como sempre fizeram desde os anos 50. Foi Paul que viu ser plágio de uma música de Chuck Berry. Foi Paul que resoilveu dar um jeito mudando o ritmo e acrescentando uma melodia de baixo que não sou fez com que soasse um pouco diferente como também praticamente marcou a música! Come Together sem aquele baixo não é Come Together. Qual o significado disso? Lennon/McCartney não só estava viva como também era fundamental visto que os dois garotos se complementavam. Propor The Beatles sem a parceria é decretar seu fim. Penso que John sabia que Paul não aceitaria. Poucos dias depois dessa suposta fita John chegou dizendo que estava de saida. Da banda. Não dos nossos corações.
Finalizando, apenas digo que grande parte do escrito aqui trata-se apenas do meu pensar, do meu modo de ver e sentir. E que esse modo de ver vai variar muito de fâ para fã. A história me pareceu muito bem contada pelo Igor, inclusive que realmente Paul apenas informou o final da banda, mas não foi o responsável pela separação. Daí que agradeço a ele novamente. Eu apenas não resisti. Porque Beatlemaníaca que se preza não pode ficar sem comentar e dar seu parecer. Coisa de Beatlemaníaco. Prova que muito amor por esses garotos. Estou a fim de obter o novo Let it Be.
Virginia, muito obrigado por seu comentário. Não só pelo elogio (sempre tenho muito cuidado ao fazer esse tipo de artigo e fico feliz demais quando isso é reconhecido), mas também pela série de informações acrescentadas ao texto. Deixo a seção de comentários sempre aberta porque sei que muitos leitores podem colaborar com mais informações sobre essas bandas que tanto adoramos. E quando recebo uma manifestação como a sua, fico extremamente satisfeito.
Excelente artigo! Mas, eu fiquei um pouco confuso com a parte em que é citado que Harrisson tinha problemas com John, porque pelo que me parece a treta do Harrison era com o Paul e não com o John. E ainda nesse sentido, o Let It Be foi concluído sem o Paul e não sem o John, justamente porque quem odiava esse álbum era o Paul, na verdade o “ódio” era pelo Alan Klein e talvez pelo Spector. Tanto é que quando os outros três pediram ao Paul para atrasar o lançamento de seu álbum solo por causa do lançamento de Let It Be, ele negou e lançou assim mesmo criando mais uma treta entre eles.